Governo insiste em avançar com concessão da Ferrogrão sem consultar indígenas
Wednesday, 22 de November de 2017A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) publicou ontem (21) novas datas para audiências públicas da estrada de ferro EF-170, a Ferrogrão. A decisão vai contra recente Recomendação do Ministério Público Federal (MPF) que pede o cancelamento das audiências pois a Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) aos indígenas e povos tradicionais afetados pelo empreendimento não foi feita.
Para o MPF, o avanço no processo de concessão da ferrovia sem a consulta prévia é ilegal. A Recomendação explicita que a realização da CLPI é “condição prévia e inafastável para qualquer ato administrativo tendente a tratar da implantação da ferrovia, incluindo-se aí a realização de novas audiências públicas". O pedido faz coro à exigência dos Kayapó, que publicaram uma carta exigindo a realização da consulta.
Dezoito organizações, entre elas o ISA, também manifestaram repúdio ao processo de concessão da Ferrogrão sem a devida consulta aos povos interessados. Em carta, reiteram que a falta de uma participação adequada dos indígenas e comunidades tradicionais “dificulta o real dimensionamento dos custos socioambientais e das necessárias salvaguardas que devem acompanhar o desenvolvimento do projeto”. Leia aqui
A ANTT já havia marcado audiências públicas para discutir os termos do edital de concessão e após receber recomendação do MPF apenas aumentou o número das sessões para contemplar as regiões de impacto direto da ferrovia - Sinop, no Mato Grosso, Itaituba e Novo Progresso, no Pará.
Na convocação das audiências, a ANTT não menciona qualquer processo de consulta na pauta das reuniões. Questionada pela reportagem se iria realizar a CLPI, a Agência limitou-se a listar os horários e locais das audiências públicas, sem fazer nenhuma menção a qualquer previsão de realização de consultas aos povos interessados no marco da Convenção 169 da OIT.
“Não cabe confundir o direito de consulta dos índios com audiências públicas de caráter informativo para a população em geral, trata-se de instituições jurídicas de natureza totalmente diferente”, alerta Biviany Rojas, advogada do ISA.
O MPF reitera que as audiências não substituem a CLPI, que deve ser realizada nos termos dos protocolos de consulta das comunidades afetadas e procedimentos próprios e específicos. Em Nota Pública assinada por 7 Procuradores do Pará e Mato Grosso, publicada hoje (22), o MPF se recusa em participar das audiências e adverte sobre a possibilidade de propor Ação Civil Pública em caso de descumprimento ao direito de consulta dos povos indígenas e comunidades tradicionais impactados.
O projeto da Ferrogrão conecta a região produtora de grãos do Mato Grosso com portos de exportação na região Norte, no município de Miritituba (PA). Tanto a construção quanto o funcionamento da ferrovia impactarão a dinâmica socioambiental das áreas protegidas existentes no seu trajeto. A implantação do empreendimento deve acirrar conflitos já instalados na região há anos, muito em função da implantação da BR-163, aumentando o desmatamento e ocupação agropecuária.
Ao menos 19 povos indígenas serão impactados, além de ribeirinhos, agroextrativistas e outras comunidades tradicionais que vivem ao longo do traçado da ferrovia.
A Ferrogrão está entre as obras que acompanhamos diariamente no De Olho no Xingu. Veja aqui a ficha do empreendimento e clique para acessar o mapa.