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A última edição da revista Science publica estudo que demonstra que o último verão europeu foi o mais quente da história. Esta informação confirma a tendência de aquecimento global – na década passada, registraram-se algumas das mais altas médias de temperatura na Terra, desde que se realizam medições sistemáticas. Estudo recente do Pentágono confirma a posição da comunidade científica quanto à efetividade do efeito estufa – contra a posição do governo Bush – e aponta a mudança climática como principal fator de conflitos mundiais para este século.
Em 1992, quando os chefes de estado subscreveram, no Rio de Janeiro, a Convenção da ONU sobre Mudança Climática, a questão ainda tinha algo de futurista. O curto período histórico subseqüente mostrou que as alterações no clima são fenômenos do presente: já afetam as condições de vida de milhões de pessoas, através da maior freqüência e intensidade de secas, enchentes e outras catástrofes naturais, especialmente nas regiões mais pobres do mundo. Ecossistemas serão destruídos, milhares de espécies não terão tempo para se adaptarem.
O aumento do nível dos oceanos inviabilizará a vida humana em países insulares, produzindo um novo tipo de refugiados. Para não pensarmos, apenas, na situação limítrofe dos povos que vivem nas ilhas do Pacífico, imaginemos a situação do litoral brasileiro caso, em 2100, o Atlântico houver subido meio metro: praias, mangues e partes baixas de cidades litorâneas submersas, fontes de água doce salinizadas, marés penetrando centenas de quilômetros pela foz do Amazonas.
Mas não é só: os efeitos da mudança climática no Brasil devem afetar a produção agrícola no centro-sul, ampliar a extensão do semi-árido para o Planalto Central, reduzir a umidade da floresta amazônica – que estará sujeita à savanização, comprometer a eficácia – já afetada – do sistema elétrico, tornar insuportavelmente mais quente a temperatura de cidades como Manaus. Não haverá regiões – ou populações – poupadas.
Os Estados Unidos e a Rússia estão boicotando a entrada em vigor do Protocolo de Quioto, que, na verdade, propõe reduções ridículas – frente à gravidade do problema – na emissão de gases de efeito estufa. Enquanto a discussão diplomática se arrasta, o mundo se arrasa. As redes internacionais de ongs ambientalistas já propõem uma agenda “pós-Quioto”: um pacote de medidas que pudesse conter o aumento da temperatura em apenas dois graus centígrados – o que já seria uma enormidade em termos de impactos globais.
Enquanto isso, a discussão do tema no Brasil está limitada ao oportunismo infantil, de identificar oportunidades de negócios no nascente mercado do carbono, como se eles pudessem compensar a tragédia mais do que anunciada. E o governo sequer se dispõe a discutir no plano internacional a questão do desmatamento, responsável por dois terços das emissões de carbono no país, sob o pretexto de preservar a suposta soberania nacional.
Porém, não pode haver ameaça maior ao país que o agravamento da situação climática, a multiplicação dos seus impactos e a proliferação de conflitos prevista pelo Pentágono. Assim, o que mais interessa é enfrentar decisivamente o nosso passivo climático – o desmatamento, principalmente – e cobrar de forma mais enfática os demais grandes emissores atuais de gases estufa para que também façam a sua parte.