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O ISA publica hoje (9/8) o segundo relato enviado de Belém pela coordenadora adjunta do Programa de Política e Direito Socioambiental do ISA, Nurit Bensusan, que participa do 16º Congresso da Sociedade Internacional de Etnobiologia - Belém+30. Leia!
8/8 - quarta-feira
“Quando será que haverá um consenso e isso ficará estabelecido de uma vez?” Essa é a pergunta que minha colega de Congresso [16º Congresso da Sociedade Internacional de Etnobiologia, que se realiza em Belém - Belém+30] me faz enquanto escutamos uma apresentação sobre a Amazônia Cultural, feita por um arqueólogo. A ideia de que a Amazônia não é uma floresta puramente natural, que nela está amalgamado um componente cultural, vem crescendo e se estabelecendo. A base dessa ideia é o estudo da distribuição das plantas, a interação entre as plantas e as pessoas ao longo da história na floresta, estudos arqueológicos e linguísticos. A pergunta procede, mas a resposta é obrigatoriamente vaga...
Existe uma resistência em admitir, na nossa sociedade – e também na nossa ciência – que os povos indígenas e seu conhecimento desempenharam – e seguem desempenhando – um relevante papel no que é a paisagem da Amazônia. É mais confortável pensar que a floresta é magnífica e exuberante, por si só, e povos indígenas e comunidades locais vivem ali, como atores num cenário teatral. É cômodo pensar que esses povos são “primitivos” que não possuem um conhecimento sofisticado e que podem nos trazer respostas para muitos impasses de nossa “civilização”.
A resposta à pergunta da minha colega se torna, pois, difícil. Se, por um lado os dados se acumulam para mostrar que a Amazônia é, de fato, uma floresta cultural e possivelmente isso é o consenso aqui no Congresso da ISE; por outro lado, em diversos outros fóruns, inclusive científicos, esse “consenso” se tornaria facilmente um conflito. É, por isso, que o fato do Congresso da ISE estar lotado não apazigua nem a alma, nem o coração. Lá fora, no mundo surreal, o conhecimento indígena e tradicional segue menosprezado...
Não há dúvidas, porém, que consenso e conflito são coisas que caminham juntas aqui no Belém + 30. Um exemplo é o lançamento dos resultados do monitoramento dos impactos da hidrelétrica de Belo Monte sobre a pesca e sobre seus modos de vida que os Jurunas da Volta Grande do Xingu fizeram aqui (Assista ao vídeo). Mostraram que a proposta da Norte Energia, o tal hidrograma de consenso, que é a redução radical da vazão de água do Rio Xingu, na Volta Grande, onde eles vivem, não representa “consenso” para ninguém e, na verdade, só pode causar conflito.
Consenso e conflito dançam uma dança sem fim também quando o assunto é a proteção dos conhecimentos tradicionais relacionados com a biodiversidade (só um nome chique para natureza...). Como conservar o conhecimento de povos indígenas e comunidades tradicionais, sabendo que nossa sociedade não tem espaço, nem tolerância, para nenhuma diversidade, nem de pensamento, nem de formas de fazer e, sobretudo, de formas de viver. Nesse cenário, a vida se torna difícil para quem vive e quer viver de forma diversa da majoritária.
Além disso, o conhecimento de povos indígenas e de comunidades locais sempre se transformou ao longo do tempo, incorporando as inovações, experimentando uma amálgama com os saberes dos outros. Parece um jeito de fazer consensos, mas na verdade é uma máquina de conflitos em um mundo onde há uma necessidade de marcar uma diferença, até mesmo cultural, para delimitar uma identidade étnica que confere direitos...
A quinta-feira promete mais ilusões de consensos e mais certezas de conflitos...
Temos aqui uma feira gastronômica. Não é difícil transformar uma feira qualquer de comida no Pará em um evento de gastronomia: a dupla tucupi & jambu faz o serviço facilmente. Não há dúvidas que qualquer coisa no mundo fica ótima à sombra dessa dupla.
“O melhor não é o pior!” Assim o pessoal que promove a farinha de babaçu caracteriza seu produto. Como convencer que é possível e desejável substituir, em terras de babaçuais, a farinha de trigo pela farinha de babaçu? Mostrando que o que muita gente da região considera o pior, ou seja os produtos locais que não aparecem na novela, é, de fato, o melhor: sem agrotóxico e sem destruição de povos, comunidades e territórios. Para saber mais sobre essa história, clique aqui.