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O Cristo mora no parque

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Márcio Santilli

Artigo de Márcio Santilli publicado originalmente no Caderno O Globo Amanhã, do jornal O Globo, do dia 23/7/2013, com o título O Parque que abriga o Cristo está abandonado.

Realiza-se no Rio de Janeiro a Jornada Mundial da Juventude, que reúne pessoas de várias partes do Brasil e do mundo para compartilhar a fé e emoção católicas. Receberão a benção de Francisco, que nos visita pela primeira vez como pontífice, num momento em que a juventude brasileira toma as ruas para resgatar a esperança do povo. Juntam-se em hora e lugar especiais.

A beleza ensolarada do Rio vai do céu ao mar, envolvendo em seu azul a cidade e a Floresta da Tijuca, moldura verde e viva que escala o horizonte e ressalta o Cristo Redentor, num abraço permanente à natureza e à cidade. Nesses dias, milhares de jovens misturam-se a outros turistas para visitar o mais famoso cartão postal brasileiro, que fica no Parque Nacional da Tijuca.

A Mata Atlântica exuberante que envolve o monumento e outras montanhas não é nativa, como parece, mas foi replantada, a partir de 1845, por ordem de Dom Pedro II. Com três séculos de colonização, o entorno do Rio e os contrafortes da serra haviam sido desmatados para dar lugar a fazendas de café, afetando o clima e o abastecimento de água da cidade. A decisão do imperador recuperou os mananciais e a paisagem, mostrando a generosidade com que a natureza responde às ações restauradoras.

O Parque Nacional da Tijuca foi criado em 1961, trazendo proteção legal para a maior parte da Floresta da Tijuca. É o mais visitado do país, com 2,5 milhões de visitantes ou quase metade do total de visitantes dos 69 parques nacionais, em 2012. Esses parques conservam parte importantíssima da biodiversidade brasileira e mundial, mas apenas 26 estão formalmente abertos à visitação e quase todos se ressentem da falta de infraestrutura e pessoal.

O País está desperdiçando uma oportunidade de ouro de gerar riqueza e emprego, por meio do turismo nessas áreas, a partir dos grandes eventos internacionais que já está sediando, como a Jornada da Juventude. Segundo dados da imprensa, o Projeto Parques da Copa, do governo federal, continua no papel e corre o risco de tornar-se mais uma promessa não cumprida de “legado” que esses eventos deixariam ao País.

Na verdade, os parques, assim como as reservas extrativistas, os quilombos e as terras indígenas, não são prioridades do governo atual e estão sob forte ameaça do agronegócio, das empreiteiras e dos seus representantes no Congresso, que querem fragilizar os direitos das minorias e a proteção do meio ambiente garantidos pela Constituição.

A floresta restaurada em torno do Cristo é uma bela metáfora do momento vivido pela Igreja Católica de aposta na recuperação ética e simbólica da sua missão. Não é outro o desafio da humanidade para reagir à ameaça das mudanças climáticas e restaurar a integridade da “criação” em toda Terra.

“Francisco” é o nome da simplicidade, da renúncia e da harmonia com a natureza. Vem a nós na hora e no lugar do risco e da esperança. O Cristo que mora num parque restaurado e, como tantos outros, permanentemente ameaçado é o retrato concreto da sua missão e da sua mensagem.

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