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Vivemos um tempo de retrocesso no tratamento da agenda socioambiental no País. Talvez existam causas estruturais mais profundas que o expliquem, associadas à reprimarização progressiva da economia, cada vez mais dependente da exportação bruta de minérios, carnes, cereais e outras comodities com baixo valor agregado e conformada a um papel secundário no novo desenho da divisão internacional do trabalho.
Talvez o retrocesso derive do sombrio cenário mundial “pós Copenhague” (depois da realização da 15ª Conferência do Clima, em 2009), marcado pelo afrouxamento das negociações e das providências para enfrentar e mitigar as mudanças climáticas, e por uma recorrente crise econômica que vai carreando volumes impressionantes de dinheiro público para os ralos mais escuros do mercado. O que vemos aqui poderia ser apenas o reflexo de um processo global de desconstrução das agendas civilizatórias.
E a nossa tendência natural é criticar fortemente o governo e as forças políticas mais visíveis no palco do poder. Ou os movimentos mais orgânicos, como a bancada ruralista, que vicejam num Congresso corrompido e num contexto em que os partidos se diluem em políticas de alianças que se fundamentam em fisiologismo recíproco puro. Produto da distorcida composição da Câmara, composta por figuras obscuras, com significativa presença de fichas sujas, a bancada ruralista acaba sendo até mais representativa que os próprios partidos.
Com isso, vai passando batido o canhestro posicionamento dos partidos que, a despeito da sua importância política, acabam ficando pouco visíveis nesse cenário confuso, como tem sido o caso do PSDB. Só para lembrar: apenas um dos seus deputados federais se opôs à destruição do Código Florestal brasileiro. Com o intuito oportunista de, eventualmente, se beneficiar do desgaste do governo diante da aprovação de uma lei repudiada por mais de 80% da população, o PSDB se prestou ao papel de sublegenda ruralista. Ou seja: para piorar o governo, ficou pior do que o governo...
Ainda para lembrar, foi no governo Fernando Henrique Cardoso (presidente de honra do PSDB), após a ocorrência do pico histórico de desmatamento na Amazônia em 1995, que se iniciou um processo de endurecimento da legislação florestal e dos instrumentos de controle que permitiram, dez anos depois, o início da reversão das taxas de desmatamento. Com a posterior destruição do Código Florestal e o retrocesso mais geral que se observa, o desmatamento na Amazônia volta, agora, a crescer.
Foi também no governo FHC, apesar de idas e vindas, que tivemos avanços importantes na política indigenista, com a demarcação de terras, o início da construção de um sub-sistema de atenção à saúde indígena e os primeiros programas associando a questão ambiental à gestão das Terras Indígenas. Um processo que já vinha do governo anterior, de Fernando Collor de Mello, e que prosseguiu no governo seguinte, embora esteja agora estagnado, ou andando para trás.
É constrangedor ver, agora, a assinatura do líder do PSDB na Câmara, deputado Carlos Sampaio (SP), num requerimento para votação em urgência do projeto de lei complementar (PLP 227) que pretende, de forma ardilosa, revogar os direitos constitucionais dos índios. Mais uma vez, o partido recorre ao oportunismo e endossa uma proposta reacionária para faturar em cima das dificuldades políticas do governo. Esse projeto, simplesmente, viabiliza a legalização de latifúndios, assentamentos rurais, cidades, estradas e de todo tipo de projetos de exploração de recursos naturais em terras indígenas, transformando em exceção a regra constitucional de posse permanente das terras e de usufruto desses recursos pelos índios.
Não é de se estranhar que, com a ocorrência recente de grandes manifestações de protesto por todo o país, o PSDB não esteja se fortalecendo nem esteja sendo reconhecido como opção política palpável. Via de regra, os governos que controla reproduzem as mesmas práticas de fisiologismo, empreiterismo e corrupção que se observam no governo federal comandado pelo PT e em governos de partidos ainda mais atrasados. E o oportunismo reacionário da sua bancada federal o afasta ainda mais dos anseios das ruas.
Uma variável importante no cenário político será a capacidade que os quadros mais esclarecidos do partido terão, ou não, para agir a tempo de evitar que as suas bancadas causem prejuízo ainda maior aos direitos de minorias e a outros avanços civilizatórios. A continuar nesse rumo, o PSDB acabará se descredenciando para fazer alianças com outras forças de oposição, caso dispute um eventual segundo turno nas eleições presidenciais de 2014.