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A edição desta segunda-feira (26) do jornal O Globo traz artigo do advogado do ISA Maurício Guetta sobre o julgamento no STF de ações de inconstitucionalidade contra a Lei nº 12 651/2012, que revogou o Código Florestal de 1965 e retirou a proteção de vastas áreas destinadas à preservação da vegetação nativa
Causou forte repercussão a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre as ações de inconstitucionalidade contra a Lei 12.651/2012, que revogou o Código Florestal de 1965 e retirou a proteção de vastas áreas destinadas à preservação da vegetação nativa. Apesar de ter corrigido questões pontuais, a Corte manteve a maioria dos dispositivos questionados. Trata-se das ações sobre meio ambiente mais complexas da história do STF, dado o seu elevado conteúdo técnico-científico. Em casos tais, juízes têm incorporado conclusões da comunidade científica para decidir.
Sobre o tema, o relator, ministro Luiz Fux, explicitou que “há causas que nós julgamos aqui em relação às quais nós não temos capacidade institucional (...) e por outro lado também a deferência ao legislativo, sempre que possível no Estado democrático, também nos protege de uma suposta, digamos assim, afirmação de que o Supremo invade áreas em relação às quais ele não tem competência”.
Talvez isso explique a incongruência entre os fundamentos dos votos dos ministros, em geral progressistas sobre a preservação ambiental, e a decisão final da Corte, de manter artigos da lei que reduzem os níveis de proteção do meio ambiente. A maioria dos ministros validou o princípio da vedação de retrocesso em direitos socioambientais ao mesmo tempo em que deixou de reconhecer graves retrocessos impostos pela nova lei por não vislumbrar ameaça ao equilíbrio ecológico; reconheceu a necessidade de restaurar processos ecológicos essenciais, tal como garante a Constituição, mas deixou de declarar a inconstitucionalidade de artigos que dispensam a recuperação de áreas protegidas ilegalmente desmatadas; explicitou que os altos índices de desmatamento no Brasil comprometem a biodiversidade e a qualidade de vida das presentes e futuras gerações e, apesar disso, manteve dispositivos que incentivam o desmatamento, como a anistia.
Em 2012, após a aprovação da lei, voltaram os altos índices de desmatamento no Brasil, invertendo o decrescimento verificado desde 2004. Ao final, quem descumpriu a lei terá vantagens sobre quem a cumpriu, inclusive em relação ao tamanho da área disponível para produção e à valorização econômica do imóvel.
Considerando as ações judiciais sobre meio ambiente pendentes de apreciação no STF, bem como o atual cenário de retrocessos legislativos — que pode gerar novas ações de inconstitucionalidade —, a incapacidade de assimilar questões técnico-científicas, sempre presentes em matéria ambiental, gera desconfiança sobre a capacidade da Corte de garantir a efetividade do direito de toda a sociedade ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, podendo significar a consolidação de retrocessos socioambientais vedados pela Constituição.