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Em artigo, o sócio fundador do ISA Márcio Santilli critica o descaso do governo em relação aos direitos indígenas e cobra uma ação coerente do ministro da Justiça para resolver os conflitos fundiários no Mato Grosso do Sul
O Mato Grosso do Sul é o estado que concentra o maior número de assassinatos de índios a cada ano e também lidera as ocorrências de suicídio. A população indígena no estado, só inferior à do Amazonas, soma 70 mil pessoas, sendo 50 mil Guarani Kaiowa e Guarani Ñandeva. Apesar disso, as terras reconhecidas aos índios no Mato Grosso do Sul têm extensão em área, por número de ocupantes, bem menor que a do módulo rural definido para o estado para fins de reforma agrária e, em grande parte, não estão na posse efetiva dos índios por força de decisões judiciais ou invasões.
A concentração fundiária no estado chega a proporções absurdas, mas as demarcações estão paralisadas por reiterada omissão do governo federal, que também não define uma posição sobre o reconhecimento do direito de indenização aos proprietários rurais titulados pela própria União em áreas posteriormente reconhecidas como indígenas.
Na semana passada, mais um índio Guarani Kaiowa foi assassinado por uma milícia ruralista, incitada por sindicatos patronais e políticos irresponsáveis, que decidiu reagir à ocupação de fazendas por grupos indígenas que não aguentam mais sobreviver à beira de estradas à espera de providências governamentais (saiba mais). A cada assassinato, tropas federais são enviadas ao estado e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, reedita a sua verborragia vazia. Há cinco anos na função, não deu solução a nenhum conflito no estado. E agora retorna, tentando levar o Ministério Público Federal na sua bagagem para minimizar a sua falta de credibilidade.
Enquanto isso, os representantes políticos dos ruralistas esmeram-se em formular propostas para estuprar os direitos constitucionais dos índios no Congresso. Sem consultá-los, claro. Procuram multiplicar obstáculos as demarcações, não se importando com as consequências do represamento de conflitos que já estão explodindo e que poderão levar a um banho de sangue sem precedentes na história recente do estado.
O ministro da Justiça precisa entender, com urgência, que a sua retórica vazia só contribui para o agravamento da situação e que é preciso definir rapidamente os instrumentos jurídicos e financeiros para indenizar os portadores de títulos legítimos sobrepostos a Terras Indígenas, e pô-los para funcionar. Os ruralistas deveriam se abster de tentar transformar o legítimo direito desses proprietários em uma indústria de indenizações indevidas e em uma pauta bomba do ponto de vista fiscal, ao exigirem pagamento em dinheiro mesmo sabendo que nunca houve dinheiro para este fim.
O tempo está acabando. O sangue já está correndo. No pântano político em que o país se meteu, com ausência de governo e excesso de quadrilhas parlamentares agressivas e desqualificadas, os índios estão pagando um preço enorme, além daquele que também pagam como os demais brasileiros. Parece que só lhes restará recorrer aos tribunais internacionais de direitos humanos para proteger os seus direitos e as suas vidas do violento assédio que lhes está sendo imposto.