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Projetos paralisados e extinção da participação da sociedade civil ameaçam o Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável do Xingu (PDRSX)
Seis meses após o governo extinguir o comitê gestor que cuidava das ações do Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável do Xingu (PDRSX), programa financiado com recursos da usina hidrelétrica (UHE) Belo Monte, o futuro na região ainda é incerto. Criado em 2010, o PDRSX tinha como objetivo investir no desenvolvimento sustentável da região afetada pela construção do empreendimento.
O comitê gestor era um espaço intersetorial que reunia esferas públicas (federal, estadual e municipal) e atores privados. Ao ser extinto, o atual governo colocou em xeque um trabalho de oito anos, em que a sociedade civil, incluindo indígenas e ribeirinhos, tinha voz na tomada de decisões. Sua extinção também resultou na suspensão de novos editais para apresentação de projetos até a definição, pelo governo federal, de que forma e onde os recursos serão aplicados.
“Como é que o governo pretende dar sequência a um programa que tem uma perspectiva regional sem estar escutando o conjunto dos atores que compõem aquela região?. Por que o governo simplesmente suspendeu os investimentos sem dar nenhuma satisfação ou colocar nada no seu lugar?" questiona André Villas-Boas, do ISA.
O comitê gestor do PDRSX era composto de forma paritária por 15 membros titulares dos órgãos governamentais, das esferas federal, estadual e municipal e mais 15 representantes da sociedade civil - do setor empresarial, sindicatos patronais e de trabalhadores dos setores urbano, rural e pesqueiro, comunidades indígenas e instituição de ensino e pesquisa.
Mesmo sem contrato, cuja prorrogação venceu no final de julho, o Instituto Avaliação, empresa gestora dos projetos, continua atendendo a população. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Regional, que assumiu a gestão do PDRSX no dia 15 de agosto, o processo de seleção de uma nova empresa já foi iniciado. Ainda assim, não existe uma previsão de continuidade e nem clareza sobre como o trabalho vai continuar daqui para frente.
Mais do que um plano para alocação de verbas, o PDRSX se consolidou como um importante instrumento de gestão, “um processo inovador que vinha avançando de forma positiva, no contexto de uma região que tinha um histórico bastante complexo em relação à questão dos recursos públicos”, pontua Villas-Boas.
O Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável do Xingu (PDRSX) foi criado em 2010 e está ligado à Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR), cujo objetivo era reduzir as desigualdades regionais por meio de planos estratégicos de desenvolvimento para as macrorregiões do Brasil, como o Xingu.
O recurso foi destinado ao plano por meio do edital do leilão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para a contratação da energia proveniente da UHE Belo Monte. No edital, a Norte Energia, concessionária da usina, foi obrigada a investir R$ 500 milhões de reais no PDRSX. Estima-se que metade do montante já tenha sido usado nos 362 projetos aprovados entre 2011 e 2018.
O PDRSX inaugurou uma nova estrutura de funcionamento. É a primeira vez que o governo federal criou um mecanismo para incluir a sociedade regional na eleição e execução de projetos de desenvolvimento para uma região impactada por um grande empreendimento. Por esse motivo, a extinção do comitê gestor gera revolta e coloca em risco a participação da sociedade civil no plano.
“A extinção do comitê gestor é uma facada no coração democrático do PDRSX”, comenta João Batista, representante da sociedade civil no comitê. Segundo ele, a instância se consolidou como um espaço plural interinstitucional e as reuniões eram o momento em que se tinha a oportunidade de dialogar diretamente com as esferas governamentais, promovendo maior efetividade na implementação de políticas públicas.
Desde a expedição do decreto que extinguiu conselho em maio deste ano não houve mais nenhuma reunião ordinária do PDRSX, que eram realizadas a cada mês com participação de todos os componentes da sociedade.
Um exemplo da relevância dos investimentos do PDRS na região foram aqueles alocados nas Reservas Extrativistas da região. Antes do plano existiam apenas duas escolas nas Resex da Terra do Meio. Com os projetos, foram construídas mais 19, totalizando 21 escolas funcionando na região.
Antes e depois da reforma da escola na localidade São Francisco, com recursos do PDRSX
Os ribeirinhos das Resex foram ignorados nos estudos e relatórios de impacto de Belo Monte, mesmo sendo vizinhas às Terras Indígenas que foram contempladas em um amplo plano de mitigação. Assim, os extrativistas não foram contemplados nas medidas de compensação e mitigação dos impactos decorrentes da construção da hidrelétrica. Apenas tardiamente na Licença de Operação, em 2015, foram reconhecidos como impactados apenas na atividade da pesca.
Para os ribeirinhos, o PDRSX é a única forma de acessar investimentos para melhorar a infraestrutura de transporte, comunicação, bem como a assistência de saúde e educação, além de alavancar o desenvolvimento econômico e ajudar a estruturar a cadeia de produtos da floresta, resultando numa melhora considerável da condição de vida das mais de trezentas famílias que vivem na região.
Há mais de três anos sem realizar comandos médicos nas Resexs, que são incursões com a equipe de saúde nas comunidades remotas da Terra do Meio. Com duas expedições planejadas, uma a cada ano, a ação foi paralisada com o fim do comitê gestor. “Continuamos mais um ano sem atendimento”, lamenta Naldo.
“Angústia” é uma palavra repetida diversas vezes por Francisco de Assis Porto de Oliveira, o seu Assis, presidente da Associação dos Moradores da Resex Rio Iriri (Amoreri). “Pense num homem que não consegue entender o que fazer, nem para onde ir. É uma angústia, porque não sabemos o que vai acontecer. Dizer o impacto e toda a ruína que trouxe é fácil, mas eu quero saber como o plano vai voltar a funcionar”.
Não há, até o momento, outros recursos em perspectiva que possam apoiar os extrativistas de maneira estruturada e continuada.