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Publicação registra pressão sobre os beiradeiros do Alto Rio Iriri, no Pará

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O livro “Não tem essa lei no mundo, rapaz! A Estação Ecológica da Terra do Meio e a resistência dos beiradeiros do alto rio Iriri” é o resultado da pesquisa dos cientistas sociais Daniela Alarcon e Mauricio Torres sobre a situação fundiária dos beiradeiros (ribeirinhos) que vivem junto ao Rio Iriri, o maior afluente do Xingu, na Estação Ecológica da Terra do Meio (EsecTM), no Pará. A edição do livro se dá por meio de um projeto do Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável do Xingu – PDRS Xingu, coordenado pela Resex do Riozinho do Anfrísio (Amora)em parceria com a Resex do Rio Iriri (Amoreri), ISA e outras organizações.

A frase que dá título ao livro (“Não tem esta lei no mundo, rapaz!”) foi dita por Seu Zé Boi (José Alves Gomes da Silva), beiradeiro que vive na EsecTM, em depoimento aos autores do livro. Ele demonstrava sua consternação em face de regras impostas aos beiradeiros pelo Ibama/ICMBio. No entendimento de Seu Zé Boi, corroborado pelos autores do livro, boa parte dessas regras vai na contramão das noções de direito e das práticas do grupo que tradicionalmente ocupa a área. Além de serem, muitas delas, inconstitucionais.

A Estação Ecológica da Terra do Meio foi criada em 2005, com três milhões de hectares, habitados hoje por um conjunto de famílias de beiradeiros e camponeses, que já viviam ali muitas décadas antes de sua criação. A categoria de Unidade de Conservação escolhida, de proteção integral, mais restritiva, não levou em conta a existência dessa população e deu como certo que a conservação da natureza é incompatível com as atividades tradicionais praticadas pelos beiradeiros. A partir dali, os ribeirinhos começaram a ter seus direitos desrespeitados e, hoje, sua sobrevivência está ameaçada pela violação de seus direitos civis e pelo estrangulamento de suas alternativas de geração de renda.


Histórias de pressão e temor

Os autores resgatam os estudos para a criação da EsecTM e das outras UCs da Terra do Meio (coordenados pelo ISA, a partir de demanda do Ministério do Meio Ambiente) e mostram como a proposta elaborada a partir de rigorosa pesquisa registrava a existência das famílias beiradeiras e previa que a área se tornasse uma Resex, categoria de UC focada no reconhecimento territorial de comunidades tradicionais, como os beiradeiros do Iriri, e não na sua expropriação, como pretende a Esec. Entretanto, mesmo tendo plena ciência da ocupação das dezenas de famílias beiradeiras, o Ibama optou pela UC de proteção integral.

A publicação conta as trajetórias de uma população que vive em ambiente de pressão, desinformação e temor. Estão documentadas histórias como a de Dona Zefa (Josefa Jerônimo da Silva), que viu uma equipe do Ibama revirar sua casa sem poupar sequer suas roupas íntimas, e a de Francisca Graça Gomes da Silva, que, na ausência de escola no beiradão, mudou-se com os quatro filhos para a periferia de Altamira, e perdeu-os todos, assassinados ou desaparecidos. Reproduz, ainda, relatos de beiradeiros sobre o caso de Chico, sua esposa e filhas, que viviam na margem do Rio Iriri e tiveram sua casa incendiada por ordem do então chefe da Unidade, sendo, em seguida, expulsos da área.

Os autores recuperam também algumas histórias familiares, indicando o arraigo dos beiradeiros ao território onde vivem há gerações e seu profundo conhecimento e ricas tecnologias de manejo da floresta. É o caso, por exemplo, de Dona Maria Raimunda Gomes da Silva, nascida em 1939 na margem direita do Rio Iriri, que toda a vida tirou seu sustento da floresta e têm sete filhos enterrados no beiradão. “Nunca abandonei aqui. Eu, pelo menos, não quero sair daqui, não, só se me mandarem embora. Se mandarem, eu vou chorando”, disse ela aos pesquisadores.

Termo de Compromisso aguarda para ser assinado

“Não tem esta lei no mundo, rapaz!” analisa também o processo de elaboração de um Termo de Compromisso (TC), no qual está empenhada a atual gestão da Unidade e que poderia harmonizar a relação entre o ICMBio e os beiradeiros que vivem no interior da EsecTM. O documento aponta meios para que se encerre a violência e o cerceamento institucional a que essas famílias têm sido submetidas e toma providência para que elas passem a ter acesso a direitos, como saúde e educação, hoje sistematicamente violados. Selado o pacto entre a gestão do ICMBio e os beiradeiros, o documento seguiu para Brasília, para ser assinado pela presidência do órgão; entretanto, até agora e sem qualquer justificativa, ainda não foi firmado.

Os dados da pesquisa foram coletados de 2007 a março de 2013, quando se deu a última de diversas incursões pela EsecTM, com o apoio da atual gestão da UC. No último período em campo, os pesquisadores realizaram entrevistas (semiestruturadas e livres) com beiradeiros e colonos que vivem na EsecTM e participaram de reuniões envolvendo esses grupos, representantes governamentais e outros para a construção do TC.

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