Essa é a versão antiga do site do ISA que ficou no ar até março de 2022. As informações institucionais aqui contidas podem estar desatualizadas. Acesse https://www.socioambiental.org para a versão atual.
Em editorial, o ISA responde às declarações do ministro da Justiça, Osmar Serraglio, ao jornal Folha de S.Paulo contra a demarcação de Terras Indígenas
Nomeado por Michel Temer, o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) assumiu o Ministério da Justiça comparando a “Lista de Schindler” – de pessoas salvas do nazismo pelo empresário Oskar Schindler – com a “Lista de Janot”, de políticos que serão investigados e julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por corrupção, a partir das delações premiadas de executivos da Odebrecht.
No dia seguinte, após repetir o mantra de que não pretende interferir nas investigações da Operação Lava Jato, Serraglio defendeu a anistia às doações ilegais e às doações legais de dinheiro ilícito para campanhas eleitorais, advogando em defesa dos investigados. Não é demais lembrar que Serraglio foi um dos principais aliados e defensores de Eduardo Cunha no Congresso.
Como se não bastasse, o novo ministro afirmou, hoje, que “terra não enche barriga de ninguém”, indicando que prefere dar comida a demarcar as terras dos índios. O que o bom senso supõe é que, havendo terra demarcada, os índios disporão das suas roças, da caça, da pesca e da possibilidade de desenvolverem estratégias e projetos para a geração de renda. Recebem cestas básicas do governo alguns grupos indígenas sem terra ou que dispõem de áreas degradadas ou insuficientes para a produção de subsistência. Mas o ministro é, como se diz, “sem noção”.
A Constituição é claríssima ao definir que compete ao governo federal demarcar as Terras Indígenas e fazer respeitar todos os seus bens. No entanto, Serraglio, como deputado e ativo ruralista, relatou a favor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que pretende transferir ao Congresso essa competência. E como “terra não enche barriga”, que fique para quem já está de barriga cheia.
A declaração do ministro é um grande incentivo para que grupos de interesse invadam Terras Indígenas e se apropriem dos seus recursos naturais. Ao mesmo tempo, humilha os índios, como se eles fossem incapazes de prover o seu sustento, para tergiversar sobre as suas próprias responsabilidades como ministro.
Muitos ministros medíocres, omissos ou oportunistas já passaram pelo MJ, que foi também o espaço de atuação de juristas proeminentes, alguns dos quais acumulavam a condição de militantes políticos. Porém, Michel Temer, justo quem se considera constitucionalista, parece ter abusado ao guindar à Justiça um militante da injustiça.
O respeito aos direitos das minorias e a demarcação das Terras Indígenas são obrigações constitucionais de qualquer governante e, em particular, do ministro da Justiça. Ao renunciar às suas obrigações, Serraglio inicia a gestão com um grito de guerra que trará consequências para o presidente que o nomeou e a imagem do país que ambos representam.