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Santa Isabel do Rio Negro (AM) será protagonista da conservação e valorização da agrobiodiversidade

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Instituições parceiras no processo de reconhecimento do Sistema Agrícola Tradicional do Rio Negro como patrimônio cultural brasileiro, Acimrn, Foirn, Pacta, ISA e Iphan discutiram com os gestores públicos de Santa Isabel, MCTi e Embrapa plano de ações para a salvaguarda do bem patrimonializado
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A VII Assembleia Eletiva da Associação das Comunidades Indígenas do Médio Rio Negro (Acimrn), realizada entre os dias 18 a 20 de abril, discutiu ações para agregar novos atores no processo de salvaguarda do Sistema Agrícola Tradicional do Rio Negro (SAT-Rio Negro) e sensibilizar os órgãos públicos com vistas a flexibilizar as políticas agrícolas diante das especificidades ecológicas e culturais da região.

A Acimrn foi protagonista deste processo, desde as pesquisas para subsidiar o dossiê até a articulação de parceiros para concretizar o reconhecimento do patrimônio: Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), Projeto Populações Locais, Agrobiodiversidade e Conhecimentos Tradicionais (Pacta), Instituto Socioambiental (ISA) e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

A agricultura das populações tradicionais tem papel importantíssimo na segurança alimentar tanto pelas atividades de produção em si, quanto pela manutenção da floresta e manejo da diversidade de plantas cultivadas. Contudo, o SAT-Rio Negro e os conhecimentos locais associados a ele, encontra-se em situação de vulnerabilidade. Isto decorre de vários fatores, entre eles: desvalorização dos saberes agrotécnicos locais, inserção e priorização do uso de sementes selecionadas por sua produtividade, ausência de condições de escoamento da produção para comercialização na sede municipal, desestruturação dos serviços básicos de atendimento às comunidades estimulando o êxodo, falta de terras para a agricultura tradicional no entorno da cidade e substituição dos produtos da agrobiodiversidade locais por produtos industrializados na dieta familiar.

Reconhecimento do patrimônio

Os estudos que levaram à patrimonialização do SAT- Rio Negro mostram que a agricultura tal como é praticada pelos povos indígenas do Rio Negro é sustentável, com uma alta diversidade de plantas cultivadas e espaços manejados e garantia de autonomia alimentar para as famílias. Esse sistema agrícola está associado à caça, pesca, extrativismo de fibras e vegetais – com destaque para as frutas de diversas palmeiras – e fundamentado num ciclo roça-floresta de dez a doze anos, compatível com a conservação da floresta.

Os trabalhos de pesquisa do Pacta, realizados junto a 30 famílias da cidade de Santa Isabel e em duas comunidades, permitiram levantar uma amostra dessa diversidade: 110 tipos de manivas (mandiocas) e 220 tipos de outras plantas cultivadas, o que ressalta a dimensão sociocultural do manejo.

Em novembro de 2010, o Iphan registrou o Sistema Agrícola Tradicional do Rio Negro como patrimônio cultural do Brasil no livro dos saberes e modos de fazer. Em junho de 2011 iniciou-se a discussão de um Plano de Salvaguarda para o SAT-Rio Negro.
(Veja notícias relacionadas:
Cooperação franco-brasileira promove seminário sobre sistemas agrícolas locais como patrimônio cultural;
Movimento indígena do Rio Negro recebe certificado que reconhece Sistema Agrícola e debate salvaguarda;
Dossiê do SAT- Rio Negro, disponível para download no site do Iphan, em Bens Registrados).


Políticas Públicas e ações inovadoras de salvaguarda

Fidelis Baniwa (Coordenação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas – Coipam) e Laure Emperarie (Pacta/ Institut de Recherche pour le Développement – IRD) abordaram aspectos da importância política do reconhecimento do Sistema Agrícola Tradicional do Rio Negro enquanto patrimônio. Fidelis lembrou que em um cenário político de retrocesso das políticas ambientais e de avanço produtivo industrial sobre a floresta amazônica, é agravada a marginalização das populações indígenas e o desrespeito aos seus direitos constitucionais sob a justificativa de que estas são empecilho ao desenvolvimento do país. Laure ressaltou que as ações de desenvolvimento agrário dificilmente levam em conta a expertise agrotécnica tradicional, a complexidade e os múltiplos papéis das agriculturas locais, entre os quais, a conservação de um amplo leque de recursos fitogenéticos.

O responsável do Instituto de Desenvolvimento Agrário do Estado do Amazonas (Idam) e pela Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) no município de Santa Isabel do Rio Negro, Antônio Motta, acompanhou a reunião e mostrou disposição para discutir a atuação do órgão em apoio à salvaguarda do SAT-Rio Negro.

Atualmente é requerido um cadastro do produtor rural com titulação da terra. De acordo com Motta, o Idam já estaria autorizado a emitir a Declaração de Aptidão ao Pronaf para Indígena (DAP-I) e, com isso, o técnico pretende incluir os agricultores indígenas em programas institucionais de compra de alimentos como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).

Ele ressaltou que é objetivo do Idam superar a expectativa de uma assistência paternalista de doação de equipamentos e insumos e, para tanto, está construindo ações participativas com as comunidades para atender à principal demanda local: o escoamento da produção agrícola visando o comércio regional, na escala do Rio Negro.

Ainda assim, há grande dificuldade de adequar a realidade das comunidades indígenas às exigências dos formulários de cadastramento e, acima de tudo, de garantir que a definição e a execução das políticas dialoguem com os conhecimentos e os modos de produzir dos agricultores indígenas.

Conservação da agrobiodiversidade

A discussão contou com a participação de Patricia Bustamante, representante da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), instituição que cumpre relevante papel na conservação da agrobiodiversidade. A partir da coleta e do armazenamento de espécies das plantas cultivadas e suas variedades em um banco de germoplasma, a Embrapa realiza um procedimento conhecido como conservação ex situ, por oposição à conservação on farm, ou local, tal como é praticada pelas populações agricultoras.

No entanto, a conservação em bancos se limita a uma conservação estática que isola as espécies ou variedades do meio no qual elas evoluíram respondendo tanto às modificações das condições ecológicas locais como aos processos de seleção/ melhoramento dos agricultores locais.

O Tratado Internacional sobre os Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e a Agricultura (Tirfaa), assinado pelo Brasil em 2001 e ratificado em 2008, enfatiza a importância da conservação local que, por sua dinâmica, produz uma contínua adaptação do material genético às condições ambientais e sociais.

Em vários países vêm sendo desenvolvidos projetos que apoiam, fomentam e garantem a conservação da agrobiodiversidade com participação e mesmo protagonismo das populações e dos conhecimentos locais. O Brasil, enquanto signatário deste tratado, deve se empenhar em implementar ações que contribuam ou que sejam fundamentais para a conservação da diversidade genética das plantas. A salvaguarda do SAT- Rio Negro pretende constituir um novo modelo de atuação e conservação da agrobiodiversidade no país.

O objetivo da parceria que se propõe entre MCTi, Embrapa, Iphan, Pacta e Acimrn é implementar um Observatório do Sistema Agrícola, articulando a conservação local e a conservação ex situ. Neste âmbito, espera-se garantir o envolvimento das populações locais, para dar conta das evoluções do Sistema Agrícola em todos os seus aspectos. Espera-se também contribuir para a valorização cultural e econômica dos produtos locais com vistas a estimular o turismo cultural.

Os espaços – roças, quintais e frutais – devem ser reconhecidos não só em relação à produção e ao bem estar familiar, mas também quanto ao papel fundamental na transmissão de saberes e práticas. Além de objeto de pesquisa, a reflexão sobre esse patrimônio deve ocorrer nas escolas e tornar a roça e outros espaços de cultivo e produção de saberes enquanto lugares formalmente reconhecidos de ensino.

De forma complementar à discussão da conservação, há uma articulação entre o Pacta, MCTi e Museu da Amazônia (Musa), sediado em Manaus, com apoio do Iphan, para fomentar ações de valorização do patrimônio e de registro da memória, dos usos e conhecimentos associados. A salvaguarda do patrimônio passa também pelo registro dos objetos, dos modos de confeccioná-los e de seu uso e, por isso, é objetivo desta parceria realizar uma exposição do SAT-Rio Negro em 2014, além de oficinas, seminários e eventos itinerantes que devem se iniciar ainda esse ano.

A Acimrn comemora seus 20 anos em 2014 tendo como prioridade investir em ações de valorização e difusão do Sistema Agrícola Tradicional do Rio Negro. A data é oportuna uma vez que o país sediará a Copa do Mundo, intensificando o turismo. Além do mais será o Ano Internacional da Agricultura Familiar, instituído pela ONU. Para saber mais clique aqui.

(Com contribuições de Laure Emperaire)

Instituto Socioambiental
ISA
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