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Comissão Nacional da Verdade visita Terra Indígena (TI) Yanomami

Esta notícia está associada ao Programa: 
Sobreviventes do grupo Yawaripë, que vivem na região do Ajarani, na TI Yanomami (RR), deram depoimentos à Maria Rita Kehl, da Comissão Nacional da Verdade, sobre os impactos causados pela rodovia Perimetral Norte (BR-210), projetada para cortar a Amazônia brasileira no sentido leste-oeste, do Amapá ao Amazonas.
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Encarregada pela Comissão Nacional da Verdade (CNV)de levantar violações de direitos praticadas por agentes do Estado, por ação ou omissão, contra índios e camponeses, entre 1946 e 1988, Maria Rita Kehl chegou à Terra Indígena Yanomami, no último sábado, 24 de agosto, acompanhada por um assessor, Inimá Simões, por Vicent Carelli, da Vídeo nas Aldeias, pelo presidente da Hutukara Associação Yanomami (HAY) Davi Kopenawa e assessores do ISA. Os depoimentos estão sendo registrados em vídeo, em produção consorciada da Vídeo nas Aldeias, Hutukara e o ISA.

O caso dos Yanomami e a construção da Perimetral Norte foi indicado à CNV, entre outros, que no início do ano procurou o ISA para conversar sobre violação de direitos entre indígenas. O resultado foi a realização de uma reunião mais ampla recepcionada pelo ISA, no final de março, incluindo o Centro de Trabalho Indigenista (CTI), o Armazém da Memória, o Museu do Índio e o MPF. Do esforço colaborativo entre as instituições resultou um roteiro básico para a indicação e apuração de casos emblemáticos como aqueles envolvendo os índios e a abertura de estradas na Amazônia: Waimiri-Atroari e a BR-174, Panará e a BR-163 e Yanomami e a Perimetral Norte.

Na aldeia Xikawa, localizada no limite leste da TI Yanomami, onde vive atualmente parte do grupo que mais sofreu os efeitos do contato dos Yanomami com a sociedade nacional, por conta da construção da Perimetral Norte, iniciada em 1973, os integrantes da Comissão Nacional da Verdade ouviram quatro sobreviventes. Macaxi, Antônio Velho, Santarém e João (que já eram adultos na época) relataram suas impressões sobre os primeiros contatos, já que viviam em relativo isolamento. Falaram do susto que levaram com a presença repentina de inúmeras máquinas e brancos e das mortes de parentes causadas pelas sucessivas epidemias e a consequente desestruturação de seu modo vida.


Aldeias destruídas por tratores e epidemias

Eles contaram também que em alguns lugares os tratores e caminhões passaram por cima de malocas e roças, e aldeias inteiras foram dizimadas pelas doenças dos brancos. Acreditavam que elas teriam sido disseminadas pela fumaça dos aviões que sobrevoavam seu território.

Macaxi, por exemplo, contou que depois de ver quase todos os seus parentes mortos ou doentes, decidiu pedir ajuda no Posto Ajarani, inaugurado em 1974 pela Funai, no km 50 da Perimetral, levando consigo a mulher e duas filhas. Mas não encontrou o apoio médico necessário e viu a mulher e uma das filhas morrerem. A outra filha o abandonou e foi viver entre os brancos.
Nos diferentes relatos, entre histórias de morte e abusos, um dos aspectos que mais chamou atenção foi a omissão do Estado e de seus representantes frente ao caos epidêmico que atingiu os Yanomami durante e depois da abertura da estrada.

O Ajarani é a região da TI Yanomami mais afetada pelas obras da rodovia BR-210, a Perimetral Norte. Até então os Yanomami haviam mantido um contato intermitente com a sociedade envolvente e já tinham sido vitimados por epidemia de sarampo em 1968. Com o início das obras o território foi invadido por trabalhadores, deslocados pela construtora Camargo Corrêa, responsável pela construção da estrada. Nessa época, a Funai dava apoio às obras de infraestrutura e seu papel era evitar conflito com os índios, e não proteger sua integridade física no contato com os brancos.

A Funai acompanhava os topógrafos e outras equipes da construtora encarregada da obra (Camargo Corrêa), que também lançava regularmente comida e brindes para os índios. Desse contato, resultaram epidemias de gripe e sarampo que dizimaram 80% da população da região. Depois vieram os problemas do alcoolismo, a prostituição, e a mendicância, resultando em um dramático caso de desestruturação social – com aldeias inteiras reduzidas a pequenos grupos vivendo à margem da estrada.

Invasões ilegais recorrentes na TI Yanomami

Com a promulgação da Constituição Federal em 1988, os índios tiveram reconhecidos seus direitos culturais e territoriais. E a Terra Indígena Yanomami foi demarcada em 1992. Porém isso não impediu a invasão de várias localidades da TI por garimpeiros e a permanência de fazendeiros na região. Em abril deste ano, os Yanomami ainda estavam protestando contra a ocupação ilegal de suas terras por fazendeiros.

O processo administrativo de pagamento das benfeitorias para a retirada das fazendas da TI Yanomami foi finalizado pela Funai em outubro de 2012 e as indenizações foram depositadas em abril desse ano para aqueles que tiveram as benfeitorias consideradas de boa fé. Mesmo com o dinheiro disponível, a Funai não tem previsão de retirada dos fazendeiros. (Saiba mais).

Ao final dos depoimentos, o líder Davi Kopenawa enviou uma mensagem à presidente Dilma Rousseff e ao governo brasileiro, rechaçando a atual ofensiva aos direitos constitucionais dos povos indígenas e alertando para os riscos de se repetirem eventos tão desastrosos e violentos como a construção da Perimetral Norte em nome de uma velha e equivocada concepção de progresso.

ISA