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O Brasil na contramão

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Marcio Santilli

No momento em que se intensificam as negociações internacionais sobre a mudança do clima, o Brasil retoma a velha diplomacia defensiva, se recusa a renovar compromissos com a redução do desmatamento e aumenta as suas emissões de gases do efeito estufa em 2013, após um período de sete anos em que havia conseguido reduzi-las.

O mundo espera que os governos cheguem a um acordo para iniciar um processo de redução global nas emissões desses gases, até o final de 2015, quando se realizará uma conferência da ONU, em Paris, com a presença de chefes de Estado. Até março, os países deverão apresentar perante a ONU os seus documentos oficiais reportando o que pretendem fazer para garantir que essa redução global ocorra. O(A) presidente(a) que será eleito(a) no próximo mês e empossado(a) em janeiro, terá pouco tempo para definir a posição brasileira a respeito.

Não se trata de qualquer assunto, pois a mudança do clima constitui a maior ameaça produzida pela humanidade contra ela mesma e contra a própria possibilidade de vida na Terra. A concentração crescente dos gases de efeito estufa na atmosfera está provocando o rápido aumento da temperatura na superfície do planeta, com o derretimento das geleiras nos polos e nas regiões de altitude, o aumento dos níveis dos oceanos, alterações nos regimes de chuva e tempestades catastróficas em várias regiões do mundo, anunciando muito sofrimento, prejuízos econômicos gigantes e pior qualidade de vida para as próximas gerações.

Não é mais possível adiar as providências de todos os países para diminuir a poluição provocada pelas indústrias, pela profusão de veículos automotores e pelo consumo excessivo de energias fósseis, como o carvão, o petróleo e o gás natural, que produzem cerca de 80% das emissões de gases estufa. Mas também contribui para agravar o problema o desmatamento e o uso inadequado das terras, que provocam a maior parte das emissões brasileiras e cuja redução constitui a maior e mais urgente contribuição que o país pode dar para se evitar mudanças mais drásticas do clima.

Porém, em 2013, o desmatamento aumentou 29% na Amazônia e não há indícios de que voltará a cair em 2014. Ao contrário, dados preliminares do INPE indicam até a possibilidade de um novo crescimento, coerente com a alta observada também no desmatamento em outros biomas, como o Cerrado e a Mata Atlântica. Ainda que a taxa amazônica em 2014 permaneça nos níveis de 2013, estará se caracterizando que as emissões florestais brasileiras subiram para um novo patamar. Não se trata de uma retomada dos escandalosos picos de desmatamento ocorridos entre 1995 e 2005, mas tampouco de um “aumentozinho”, como disse a presidente Dilma Rousseff em conferência da ONU ocorrida nessa semana, ou de um “ponto fora da curva”, como acreditava a ministra do meio ambiente.

Pior: apesar de dispor de uma matriz energética considerada relativamente limpa, se comparada com a dependência de carvão e de petróleo de várias das grandes economias mundiais, ela está se sujando rapidamente através do uso intensivo de termoelétricas devido aos efeitos da própria crise climática sobre os reservatórios das hidrelétricas, do aumento exponencial da frota automotora movida a petróleo, tendo como pano de fundo a falência da produção de etanol e a emergência do Pré-Sal como referência estratégica do setor energético, numa inflexão carbonífera das políticas de governo.

Significa dizer que após a contribuição notável em reduzir o desmatamento e as suas emissões de gases estufa entre 2006-12, o Brasil voltou a aumenta-las, sem que disponha de alternativas estratégicas de política energética para reverter essa situação nos próximos anos. E isto ocorre quando outros grandes emissores desses gases, como a China e os Estados Unidos, além de vários países da União Européia, vão avançando nas mudanças de suas matrizes energéticas e criando condições econômicas objetivas para reduzir as suas emissões.

Infelizmente, o Brasil vai perdendo a condição de protagonista que havia conquistado em tempos recentes no âmbito dessas negociações internacionais. Estamos entrando na sua fase decisiva pela contramão, reforçando as piores posições e funcionando como freio para as mudanças que a humanidade exige e que não podem mais esperar. Mas tomara que as eleições gerais possam gerar outro clima, de seriedade e de engajamento do governo brasileiro nos esforços que mais interessam aos nossos filhos.