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Leia o Editorial do ISA a propósito de algumas afirmações da ministra da Agricultura, Kátia Abreu, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, na edição desta segunda, 5 de janeiro de 2015
“Os índios saíram da floresta e passaram a descer nas áreas de produção”
Kátia Abreu, 5/1/2015
No seu discurso de posse, a Presidente Dilma Rousseff estabeleceu a educação como prioridade maior. Lançou o lema: “Brasil, Pátria Educadora”. Tudo bem. Sua ministra da agricultura, porém, deseduca! Recorrendo a qualquer manual sobre a história do Brasil, Kátia Abreu saberia quem e o que veio antes e depois: eles ou nós, floresta ou agronegócio. Folheando o livro “A Retirada da Laguna”, de autoria do Visconde de Taunay, que relata um episódio da Guerra do Paraguai (1864-1870) ela poderia ter uma noção do que era o território do Mato Grosso, hoje “do Sul”, há uns 140 anos.
Naquele tempo, o Brasil, aliado à Argentina e ao Uruguai, desfechou um ataque ao Paraguai. A derrota da “Pátria Guarani” na guerra definiu as fronteiras internacionais nas cabeceiras da bacia platina. Não havia, então, condições de habitabilidade, em padrões coloniais, nas florestas densas da região. O exército, através do próprio Duque de Caxias, concedeu um extenso território na fronteira aos índios Kadiwéu, por seu imprescindível apoio às tropas brasileiras e à retirada dos seus sobreviventes.
O Paraguai segue sendo a pátria de numerosa população Guarani. Uma vertente deste idioma é largamente utilizada não apenas por ela e é reconhecida como língua oficial. Na Argentina, há comunidades nas províncias de Corrientes e Entre Rios. Os Guarani-Kaiowá estão no sul do Mato Grosso do Sul desde tempos imemoriais e constituem a etnia mais numerosa, hoje, no Brasil. Permaneceram naquelas florestas, invisíveis, até que o desmatamento, decorrente da titulação e da ocupação agrícola das terras, os tornou visíveis aos olhos do país.
Os Kaiowá não “desceram” de floresta nenhuma. As florestas é que foram derrubadas pelos colonos. Logo após a institucionalização do regime republicano, o Estado promoveu a titulação das terras e a transferência de populações originárias para “reservas indígenas”. O reconhecimento das Terras Indígenas pelo Estado brasileiro é que tem sido historicamente tardio, para o que muito contribui, atualmente, a própria ministra da agricultura.
Nem por isso se deve atribuir aos colonos, ou aos atuais produtores, a culpa pelo imbróglio histórico em que foram metidos. Tendo sido titulados pelo Estado e induzidos à ocupação indevida, também têm direitos históricos, embora não originários, que precisam ser reparados.