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Em Conferência, Dilma promete criar Conselho de Política Indigenista e homologar Terras Indígenas

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Presidente frustra expectativa de tomar medidas de impacto na própria Conferência Nacional de Política Indigenista, mas, segundo ela, decretos de Conselho e Terras Indígenas serão assinados ainda nesta semana
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A presidente Dilma Rousseff participou, ontem (15/12), do segundo dia da 1ª Conferência Nacional de Política Indigenista, em Brasília. A expectativa de que ela anunciasse medidas imediatas positivas para os povos indígenas no próprio evento foi frustrada. Mas a presidente prometeu que, ainda nesta semana, assinará os decretos de criação do Conselho Nacional de Política Indigenista e de homologação de algumas Terras Indígenas (TIs). Ela não informou quais áreas serão homologadas.

O conselho é uma reivindicação de anos do movimento indígena de um espaço com participação direta dos povos indígenas que tenha poder de formulação e deliberação sobre as políticas indigenistas. Ainda não se sabe qual será o desenho final da instância definido pelo governo. Hoje, existe apenas uma Comissão Nacional de Política Indigenista, que tem participação dos índios, mas é apenas consultiva.

Entre outras promessas, a presidente disse que manterá o concurso previsto para este ano para a Fundação Nacional do Índio (Funai) e criará a Rede Brasileira de Educação Superior Intercultural Indígena.

Crédito

A presidente recebeu um crédito dos participantes da conferência. Ela foi recebida no auditório com quase dois mil indígenas, servidores públicos, representantes de movimentos sociais e organizações não governamentais sob aplausos e gritos de “Não vai ter golpe!” e “Fora Cunha!”.

Em discurso anterior ao da presidente, o líder indígena Neguinho Truká propôs um “pacto” com Dilma, referindo-se à proposta de impeachment em tramitação na Câmara. “Não vamos aceitar golpe no Estado democrático de direito. Queremos pactuar com a senhora andarmos juntos, para que a senhora entenda nosso clamor e nossas necessidades”, disse.

Truká reivindicou a continuidade das demarcações e o arquivamento da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que transfere do governo federal ao Congresso a atribuição de dar a última palavra sobre os limites de TIs, Unidades de Conservação e quilombos. Também cobrou o fim das ingerências políticas e o fortalecimento da Funai, além da consulta prévia aos povos indígenas sobre grandes empreendimentos que afetem seus territórios.

Dilma repetiu que é contra a PEC 215. “Daremos continuidade às demarcações de terras, à efetiva posse sobre áreas já demarcadas e à proteção à terras indígenas”, disse. “Eu concordo que democracia é a demarcação de terras para os povos indígenas”, completou.

O discurso e o clima de festa na conferência destoam da prática da administração da petista, que tem trabalhado contra os direitos indígenas. Ela tem o pior desempenho na demarcação de TIs entre os presidentes desde a redemocratização (veja aqui). A oficialização de TIs, Unidades de Conservação e quilombos está praticamente paralisada desde seu primeiro mandato.

O governo tem sido incapaz de garantir a segurança dos povos indígenas nas áreas de conflito, em especial no Mato Grosso do Sul, onde nos últimos meses ocorreu uma série de ataques e assassinatos de lideranças indígenas cometidos por milícias de fazendeiros. O Planalto também é impotente diante das investidas ruralistas no Congresso. No fim de outubro, uma Comissão Especial da Câmara aprovou a PEC 215 sem que a base aliada esboçasse reação (leia aqui).

Há alguns dias, veio a público uma proposta de Medida Provisória (MP) do Planalto que pretende abrir caminho à implantação de hidrelétricas nas TIs. Movimento indígena e a própria Funai manifestaram-se duramente contra a medida. Ainda hoje, poderá ser votado no Senado um projeto de lei que enfraquece o licenciamento ambiental, desprotegendo comunidades indígenas e tradicionais frente os impactos de grandes obras (saiba mais).

“Da fala dela [Dilma], não dá para confiar 100%. O discurso ficou meio vazio em algumas situações. Por exemplo, ela diz ‘eu sou contra a PEC 215’, mas ela não tem feito nada sobre isso até agora”, defende Maximiliano Menezes Tukano, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).

"A fala da presidente revela que realizou-se uma conferência na ausência de política indigenista", diz Márcio Santilli, sócio fundador do ISA.

“Quem não tem crédito na praça não pode comprar fiado. A presidenta deveria ter trazido alguma medida concreta para a conferência”, critica Adriana Ramos, coordenadora de Política e Direito do ISA.

Atividades da conferência

De manhã e no início da tarde de ontem, os participantes da conferência dividiram-se em seis eixos temáticos para debater as propostas elaboradas nas 142 etapas locais e 26 regionais: Territorialidade, Autodeterminação, Desenvolvimento Sustentável, Direitos individuais e coletivos, Diversidade Cultural e Direito à memória e à verdade. Em alguns eixos, houve críticas à metodologia adotada na Conferência. O principal ponto de polêmica foi o limite de 20% de propostas que poderiam ser aprovadas. Os indígenas consideram a quantia muito reduzida.

Oswaldo Braga de Souza e Victor Pires
ISA
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