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O ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, defendeu a aprovação de uma lei geral do licenciamento ambiental durante audiência pública promovida, nesta quinta-feira (2/6), pelo Ministério Público Federal (MPF), em Brasília, para debater propostas em curso no Congresso Nacional e no Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que enfraquecem o licenciamento (saiba mais no quadro abaixo). A audiência contou com a participação de procuradores da República, representantes do Ministério do Meio Ambiente e de organizações da sociedade civil.
“A ideia nessa lei geral seria simplificar processos sem descuidar da atenção à proteção ambiental e assegurar segurança jurídica. A proposta é que se garanta eficácia, eficiência e coerência técnica ao licenciamento ambiental”, disse o ministro.
Ministro Sarney Filho, Sandra Cureau e Deborah Duprat durante audiência pública
De acordo com o ministro, o plano é utilizar como base para a lei geral o substitutivo da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados (CMADS) ao Projeto de Lei nº 3729/2004. “Destaco que não se trata do projeto de lei original nem do substitutivo da Comissão de Agricultura, é o substitutivo da Comissão de Meio Ambiente”. Para ele, mesmo o texto da Comissão de Meio Ambiente necessita de ajustes. “Mas ele é, na minha avaliação, o mais consistente que surgiu no legislativo até agora”. E acrescentou que a construção da lei vai ser um processo democrático e que as regras irão valer para os licenciamentos federais, estaduais e municipais. O relator do substitutivo da CMADS é o deputado Ricardo Tripoli (PSDB-SP).
“A nossa leitura é que o Ministério do Meio Ambiente tem se mantido omisso nesse processo [de construção de proposta legislativa sobre o licenciamento] e que se ele não tiver uma posição forte de que lei ele quer, vai ser aprovada uma lei que nós não vamos gostar”, disse Suely Araújo, recém-empossada presidente do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). “A gente não quer que aconteça o que aconteceu na lei florestal, a gente não quer perder o timing desse processo”, afirmou Suely, fazendo referência ao processo de elaboração do Código Florestal, alvo de intensas críticas.
Senador Randolfe Rodrigues alerta para os retrocessos que trazem os projetos em tramitação no SenadoA Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 65/2012 e o Projeto de Lei do Senado (PLS) 654/2015 foram temas centrais da audiência. “Na prática, [a PEC 65] acaba com o licenciamento ambiental. A aprovação dessa PEC na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) foi obra de uma articulação regimental, de uma manobra parlamentar feita às escondidas”, disse o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Sua aprovação no Senado aconteceu no momento em que a Comissão Especial do Senado votava o impeachment de Dilma Rousseff. No mês passado, um requerimento do senador Randolfe fez com que a PEC voltasse à CCJ.
Já o PLS 654 elimina boa parte das fases imprescindíveis do licenciamento ambiental, avalia o advogado e assessor do Programa de Política e Direito socioambiental, Mauricio Guetta. “Ele amplia sobremaneira os riscos de ocorrência de novos desastres ambientais”, alertou. Guetta apontou semelhanças entre as propostas debatidas na audiência: “Se você analisar os projetos de lei todos que estão tramitando, nenhum segue a direção do fortalecimento do licenciamento, nenhum segue a direção de tentar resolver os principais problemas que têm hoje o licenciamento”. Para ele, outro ponto em comum é a falta de consulta pública para a construção das propostas.
“Acho que nós temos um vício de origem na perspectiva do licenciamento ambiental, que sempre foi concebido na perspectiva do empreendimento e não do impacto”, ressaltou Deborah Duprat, Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão. “Isso é outra coisa que precisamos rever, porque a grande preocupação do texto constitucional foi com o impacto, e não com a viabilidade do empreendimento”, afirmou.
Para Sandra Cureau, coordenadora da 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, tudo isso fragiliza o meio ambiente brasileiro, expõe o meio ambiente aos maiores desastres e às maiores tragédias. “O licenciamento, além de ser o momento em que a sociedade toma conhecimento do que vai ocorrer naquele local onde ela vive, também implica uma série de procedimentos no sentido de que aquela obra ao ser finalmente executada trará o mínimo de impactos ao meio ambiente”.
Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 65/2012
A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 65/2012 acaba com o licenciamento ambiental. Ela prevê que a mera apresentação dos Estudos de Impacto Ambiental (EIA-Rima) de um empreendimento implicará sua autorização e que, daí em diante, ele não poderá ser suspenso ou cancelado. Populações e ecossistemas afetados ficariam à mercê da boa vontade dos empresários. A proposta voltou à CCJ do Senado.
Projeto de Lei do Senado (PLS) 654/2015
De autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR), o projeto define um prazo curtíssimo, de cerca de no máximo oito meses, para o licenciamento de grandes obras consideradas estratégicas pelo governo, como grandes hidrelétricas e estradas – um “Licenciamento a Jato”. A proposta não prevê a realização de audiências públicas e elimina uma série de fases essenciais do licenciamento, inclusive o sistema trifásico (licenças prévia, de instalação e de operação). Pelo projeto, se um órgão governamental envolvido descumprir os prazos, automaticamente será considerado que ele está de acordo com o licenciamento. É o “quem cala consente”. PLS pode ser votado a qualquer momento no plenário do Senado.
Projeto de Lei (PL) 3.729/2004
Relatório preliminar sobre o Projeto de Lei nº 3729 também acaba com grande parte do sistema de licenciamento ambiental. Dispensa o licenciamento para várias atividades econômicas, como fazendas e o plantio de eucalipto. Prevê ainda um licenciamento autodeclaratório, por cadastro eletrônico, sem nenhum tipo de checagem dos órgãos ambientais. Segundo a proposta, órgãos que defendem os direitos de comunidades indígenas e tradicionais não teriam praticamente nenhum poder de intervenção no licenciamento. O parecer pode ser votado a qualquer momento no plenário da Câmara. Se aprovado, segue para o Senado.
Alteração nas resoluções do Conama 01/86 e 237/97
Hoje, a maioria dos empreendimentos com impactos socioambientais importantes precisa passar por um sistema de licenciamento com três fases: a prévia, de instalação e de operação. A proposta elaborada pela Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema) em tramitação no Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) prevê a criação de mais três novas modalidades de licenciamento, todas com o objetivo de simplificar processos: o licenciamento “unificado”; por “adesão e compromisso”; e por “registro”. A discussão do assunto no Conama foi prorrogada até o fim de julho.