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A quem interessa transparência no campo?

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Adriana Ramos, coordenadora de Política e Direito do ISA, e Andrea Azevedo, diretora de Políticas Públicas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam)

Em artigo de opinião publicado originalmente no jornal Correio Braziliense, Adriana Ramos, coordenadora de Política e Direito do ISA, e Andrea Azevedo, diretora de Políticas Publicas do Ipam, defendem a transparência do Cadastro Ambiental Rural (CAR)

No fim de novembro, o governo federal deu duas notícias impactantes. Vamos primeiro à notícia ruim: o desmatamento na Amazônia, um pesadelo moderno para os brasileiros, voltou a mostrar seus dentes. A derrubada aumentou 29% no último ano, e não há sinais de que o ritmo vai diminuir.

A notícia boa é que o Cadastro Ambiental Rural (CAR) tornou-se finalmente público, como determina o artigo 29 do Código Florestal. O CAR indica quem cumpre o Código Florestal, identifica quanta vegetação nativa existe na propriedade rural e permite que aqueles com passivo se regularizem. Ele também identifica quem desmata ilegalmente.

No fim das contas, o CAR é uma fotografia, ainda que um pouco tremida, do papel do setor rural na manutenção dos serviços ambientais fornecidos em áreas privadas, além do cumprimento da função socioambiental intrínseca à propriedade rural (preceito constitucional, não custa lembrar, em benefício da sociedade). E, para uma área tão competitiva quanto o agronegócio, tais informações podem ser a diferença entre um contrato fechado ou não.

Antes de os dados se tornarem públicos, empresas compradoras de commodities, como grandes traders de grãos e frigoríficos, não tinham instrumentos para cobrar o cumprimento do Código Florestal de seus fornecedores, correndo o risco de contaminar sua cadeia com um produto proveniente de fazendas irregulares do ponto de vista ambiental.

Agora um importante passo foi dado para que o produto brasileiro não seja mais alvo de olhares suspeitos: ao mostrar quem é joio e quem é trigo, o CAR inicia um processo de rastreabilidade mínima da cadeia de produção. Ganham os produtores, as empresas, os compradores e, no fim da linha, os consumidores.

Quando o cadastro torna-se público, o fazendeiro conecta-se com quem come o que ele planta ou cria. Pois quem compra um produto na gôndola do supermercado ou na lanchonete da esquina tem o direito de saber o que está adquirindo, se a matéria-prima do hambúrguer ou do biscoito veio de uma fazenda que desmatou ou preservou a floresta amazônica, se protege uma nascente e se vai recuperar o que foi cortado além do permitido.

Ainda não chegamos nesse ponto, mas essa é a última etapa de um processo sem volta, e que acontece em todo o mundo, de acesso à informação. O governo federal dá sua importante contribuição ao cumprir o que determina a lei e abrir o CAR em uma plataforma digital (www.car.gov.br/publico/imoveis/index), seguindo exemplos do Pará e do Mato Grosso.

Há críticas infundadas de que a transparência dos dados expõe os proprietários, e aqui cabe tranquilamente o ditado “quem não deve não teme”. O escrutínio público será a peneira entre quem ainda aposta em destruição da natureza e quem respira o século 21, sabedor que é possível e necessário produzir com conservação.

O próprio agronegócio destacou na 22ª Conferência do Clima, que aconteceu em novembro, em Marrakesh, o papel central dos produtores rurais para o cumprimento das metas climáticas nacionais, destacando o modelo brasileiro como o mais sustentável do mundo. A transparência é a melhor ferramenta para aferir tal declaração e, para que haja o reconhecimento pelos compradores e pela sociedade, nada como um Cadastro Ambiental Rural público.