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Governo Temer altera Unidades de Conservação e fragiliza proteção à floresta no Pará

Governo federal cede a pressões de políticos e produtores rurais e, segundo ambientalistas, emite sinal de que invadir áreas protegidas vale a pena
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O governo federal alterou os limites de quatro Unidades de Conservação (UCs) e criou uma nova no sudoeste do Pará, onde está uma das principais frentes de expansão do desmatamento da Amazônia.

Ambientalistas avaliam que, ao atender as pressões de políticos e produtores rurais com a medida, o governo emite um sinal para grileiros de terra de que vale a pena invadir essas áreas e apostar numa futura regularização.

Assinada pelo presidente Michel Temer, na terça (20/12), a Medida Provisória 756/2016 cria a Área de Proteção Ambiental (APA) do Jamanxim, em Novo Progresso, e altera os limites do Parque Nacional (Parna) do Rio Novo e da Floresta Nacional (Flona) do Jamanxim. (Veja os detalhes no mapa abaixo).



A APA foi criada numa área que antes pertencia à Flona do Jamanxim caracterizada por ampla ocupação ilegal, embora tenha sido anunciada com objetivo de proteger os mananciais, regular o uso dos recursos hídricos, ordenar e regularizar o processo de ocupação na região, teoricamente garantindo o uso racional dos recursos naturais. Para a criação da APA Jamanxim, com área aproximada de 542 mil hectares, a Flona do Jamanxim foi reduzida de 1,3 milhão de hectares para aproximadamente 557 mil hectares. A MP também ampliou o Parna Rio Novo em 438,7 mil hectares, incluindo terras antes pertencentes à Flona.

A criação dessas UCs foi uma das poucas medidas implementadas do Plano BR-163 Sustentável, em 2005, que previa um pacote de medidas de mitigação aos impactos do asfaltamento da rodovia.

A MP é um ato assinado pelo presidente da República e, segundo o Artigo 62 da Constituição, deve ser usada em casos de relevância e urgência.

Em outubro, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pela gestão das UCs federais, convidou organizações ambientalistas para, a princípio, discutir os conflitos socioambientais na região da Flona Jamanxim. No encontro, no entanto, tomaram conhecimento que a proposta de alteração dos limites das UCs já estava na Casa Civil, pronta para ser oficializada.

Mesmo assim, os ambientalistas insistiram que a discussão deveria ser ampliada, com foco e todo o contexto regional e levando em consideração a perspectiva de outros investimentos de infraestrutura, como para hidrelétricas previstas para a parte norte da Flona, além de portos e hidrovias. O receio dessas organizações é que o precedente de regularizar e beneficiar quem desmatou ilegalmente seja generalizado de agora em diante.

Em novembro, insatisfeito com a proposta do governo, um conjunto de organizações ambientalistas, incluindo o ISA, encaminhou uma carta ao ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, cobrando a reabertura das conversas e a discussão de um plano regional de governança ambiental que fosse além da proposta de redefinição das UCs.

Em novembro, o Ministério Público Federal (MPF) apresentou uma ação para suspender o trâmite de qualquer procedimento administrativo ou requerimento que tivesse por objetivo a recategorização, diminuição ou desafetação da Flona. “Área de Proteção Ambiental é a que mais admite a intervenção humana”, destaca na ação a procuradora da República Janaína Andrade de Sousa. "O restante do espaço será destinado aos pecuaristas que pressionam o poder público desde a criação da floresta em 2006", afirmou (saiba mais).

APA Tapajós e Parna do Jamanxim

Outra MP publicada na terça, a 758/2016 alterou os limites da APA do Tapajós e do Parna do Jamanxim, desafetando, no ultimo, duas áreas que totalizam 862 hectares e, concomitantemente, agregando a ele outra área de 51 mil hectares. A área desafetada será destinada aos leitos e às faixas de domínio da ferrovia “Ferrogrão” e da BR-163. De acordo com a MP, depois de instalada a ferrovia, áreas que não forem efetivamente utilizadas serão reintegradas ao Parna do Jamanxim. (Veja os detalhes no mapa abaixo).



Confira o resumo das alterações das Medidas Provisórias

Medida Provisória nº758 de 2016

Parque Nacional do Jamanxim - Ampliado de 859.700 hectares para 909.970 hectares. Incorporou 51.135 hectares da APA do Tapajós e teve 862 hectares de seu interior desafetados, destinados ao leito e faixas de domínio da EF 170 e da BR 163.

Área de Proteção Ambiental do Tapajós - Reduzida de 2.039.580 hectares para 1.988.445 hectares, cedendo 51.135 hectares para o Parna do Jamanxim.

Medida Provisória nº756 de 2016

Floresta Nacional do Jamanxim - Reduzida de 1.301.120 hectares para 557.580 hectares, cedendo áreas para o Parna do Rio Novo e APA do Jamanxim.

Parque Nacional do Rio Novo - Ampliado de 537.757 hectares para 976.525 hectares, incorporando 438.768 hectares da Flona do Jamanxim.

Área de Proteção Ambiental do Jamanxim - Criada pela MP com 542.309 hectares sob terras antes pertencentes à Flona do Jamanxim.

Segundo o governo, a intenção é acabar com um conflito com a sociedade local que se alastra durante anos. Alguns produtores rurais locais nunca aceitaram a criação da Flona. A invasão da área vêm se intensificando desde 2012, apesar de ser combatida pelos órgãos ambientais. Em 2015, um policial militar foi assassinado durante uma operação de fiscalização na Flona.

O governo afirma que está regularizando as posses de pequenos produtores rurais, mas, segundo o próprio ICMBio, o ocupante médio da Flona Jamanxim reclama uma área de mais de 1,7 mil hectares, o que equivale à mais de 18 vezes o tamanho médio da propriedade normalmente atribuída à agricultura familiar. A maior parte dos 257 ocupantes da Flona chegaram na região na época da criação da área.

Outra crítica de ambientalistas e pesquisadores é de que o governo diminui o status de proteção de uma enorme área da Amazônia num momento crítico de aumento dos índices de desmatamento, para beneficiar a um pequeno grupo de fazendeiros invasores de terras públicas. A MP é publicada no momento da maior alta do desmatamento na Amazônia desde 2009.

Se a intenção da MP 756 não está suficientemente clara, a leitura do artigo 8º esclarece qual é o público alvo da mesma: “As áreas rurais ocupadas e incidentes na Área de Proteção Ambiental do Jamanxim poderão ser regularizadas em conformidade com a Lei nº 11.952, de 25 de junho de 2009, respeitada a fração mínima de parcelamento e o limite de quinze módulos fiscais e não superior a 1.500ha (mil e quinhentos hectares).”

Além disso, a figura da APA tem se mostrado um péssimo instrumento de proteção na Amazônia. A vizinha APA Triunfo do Xingu, por exemplo, é a unidade de conservação mais desmatada do Brasil, acumulando mais de 42 mil hectares desmatados entre 2015 e 2016.

A figura da APA acaba estimulando o desmatamento, pois especuladores e grileiros de terras apostam que, ocupando e desmatando a terra, asseguram sua posse, pois nenhuma outra UC deverá ser criada na área.

“O ICMBio alegou como justificativa para as alterações de limites o fato de a Flona Jamanxim estar muito desmatada. Ora, se esse desmatamento aconteceu depois da criação da unidade, a alteração é dar um recado aos desmatadores de que basta invadir UCs e desmatar que o governo irá alterar seus limites para que fiquem com a terra", afirma Maurício Torres pesquisador da USP que atua no sudoeste do Pará há vários anos atuante na região. Segundo ele, recategorizar a Flona é agir em benefício da grilagem e do crime ambiental.

Em outro caso de alteração de limites na mesma região, na da Terra Indígena Baú, conforme Torres, "na porção reduzida, o desmatamento disparou, num ritmo ainda maior do que na área que já estava fora da TI. O Estado faz o contrário de sua obrigação, ao invés de destinar terras, retrocede na sua destinação. Aquela área e essa, que deixa de ser Flona, passam a não ter destinação alguma, passam a ser terras para serem griladas, assim configuradas por pressão de grileiros. Como o desmatamento é comprovadamente um instrumento de grilagem, não há surpresa no que virá.”

Veja mais sobre as Ucs envolvidas.

ISA
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