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O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) anulou hoje (6/12) a Licença de Instalação (LI) da mineradora canadense Belo Sun. Por unanimidade, os três desembargadores da 6ª Turma mantiveram a suspensão da Licença de Instalação da mineradora Belo Sun até o cumprimento da legislação indigenista. Ela obriga a elaboração de estudos de impacto ambiental e a realização do processo de Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) aos índios impactados da forma descrita no protocolo de consulta de cada povo antes da instalação da mina na Volta Grande do Xingu (PA).
Os Juruna, diretamente impactados pelo empreendimento, construíram e publicaram seu próprio protocolo de consulta em agosto deste ano.
A decisão também exige que a mineradora refaça os estudos do componente indígena sobre os possíveis impactos aos povos Juruna e Arara da Volta Grande, cujas terras estão a 9,5 km e 13,7 km de distância da mina, respectivamente. A localização do projeto de mineração coincide com o trecho de vazão reduzida da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Aproximadamente 80% da vazão natural do rio foi desviada na região, o que aumenta a gravidade de qualquer acidente ou vazamento da barragem de rejeitos minerários.
Em abril de 2016, a Belo Sun apresentou um estudo considerado insuficiente pela Fundação Nacional do Índio (Funai), que ordenou que a empresa refizesse os estudos de avaliação de impactos socioambientais do empreendimento nas Terras Indígenas (TIs) da região. A empresa alega não ser obrigada a respeitar o termo de referência estabelecido pela Funai já que, segundo ela, a TI mais próxima da mina está a 11 quilômetros de distância, o que supera os 10 km estabelecidos na Portaria n°60/2015 como limite para a presunção de impactos de atividades minerárias sobre TIs ou Unidades de Conservação.
Essa argumentação não foi acolhida pelos desembargadores. Eles alertaram para o risco redobrado ao qual estão expostos os povos da Volta Grande em decorrência da redução de vazão do Rio Xingu - o que diminui significativamente a resiliência da região diante de um eventual acidente com a barragem de rejeitos prevista no projeto de Belo Sun. A área prevista para a implantação do projeto de mineração coincide com a Área Diretamente Afetada (ADA) pela Hidrelétrica de Belo Monte.
“É absolutamente irresponsável a atitude do órgão licenciador, de impor ao licenciamento o ritmo do mercado em benefício do empreendedor, vitimando de maneira quiçá irreversível povos indígenas na Volta Grande do Xingu, que terão de arcar com um risco que, por lei, deve ser evitado”, diz o texto da ação assinada pelos procuradores Thais Santi, Ubiratan Cazetta e Felício Pontes Jr, em defesa da consulta prévia.
A norma identifica as áreas de presunção automática de impactos de empreendimentos potencialmente poluidores como grandes mineradoras. “Isso não dispensa a obrigação de avaliação de contextos e de eventuais impactos além das distâncias preestabelecidas. No caso da Volta Grande do Xingu, a distância de 10 ou 12 km é totalmente irrelevante se considerada a magnitude do impacto da instalação de Belo Monte para efeitos de avaliar qualquer outro empreendimento”, explica Biviany Rojas, advogada do ISA.
Em manifestação pública, a empresa garantiu que vai recorrer da decisão e alega que as TIs estão a uma distância superior aos 10 km estipulados pela Portaria. “O projeto da mineradora encontra-se a montante das TIs na beira do Xingu, qualquer vazamento de rejeitos deve contaminar imediatamente as águas superficiais e subterrâneas que sustentam os povos indígenas e ribeirinhos da região, o risco é insustentável”, alerta Rojas. A LI, concedida pelo governo do Pará em fevereiro deste ano, fica suspensa até que a decisão do TRF-1 seja cumprida.
O TRF-1 confirma as decisões anteriores que suspenderam a LI neste ano. Em abril, o mesmo TRF-1 acatou pedido do MPF que acusa a inexistência de estudos dos reais impactos da mineradora sobre os indígenas. Em fevereiro, semanas depois da emissão da LI, a Vara Agrária e Juizado Especial Ambiental de Altamira acatou liminar da Defensoria Pública do Estado (DPE) que denunciou a compra ilegal de terras públicas pela Belo Sun e a violação dos direitos humanos das populações ribeirinhas. Saiba mais.
A mineradora e a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) do Pará recorreram diversas vezes contra a obrigação de realizar os estudos e também contra a consulta prévia, mas perderam todos os recursos. Contra a decisão de hoje, só cabe recurso ao Supremo Tribunal Federal (STF).
A empresa promete ser a maior mineradora de ouro a céu aberto do Brasil e retiraria, se fosse implementada, cerca de 60 toneladas de ouro em 12 anos. Ao final da exploração, deixaria duas pilhas gigantes de rejeito de material estéril quimicamente ativo que terão, somadas, área de 346 hectares e 504 milhões de toneladas de rochas, sem plano para sua remoção.
No final de novembro um grupo de pesquisadores foi impedido de apresentar os resultados de uma pesquisa sobre os potenciais impactos de Belo Sun em evento realizado na Universidade Federal do Pará (UFPA), em Belém. A atividade acadêmica foi interrompida pelo prefeito de Senador José Porfírio, Dirceu Biancardi (PSDB), acompanhado de um grupo de cerca de 40 pessoas. O prefeito do município em que a mineradora pretende se instalar, se posicionou em defesa da empresa e, segundo relatos dos presentes, incitou a violência contra os que se posicionavam contra o empreendimento.
Impossibilitados de discutir os resultados das pesquisas, os participantes foram impedidos de deixar a UFPA. No mesmo dia, estudantes e professores protocolaram uma denúncia de intimidação e ameaças no Ministério Público Federal. Saiba mais.
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