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Confira editorial do ISA que alerta para riscos e prejuízos de uma eventual saída do Brasil do tratado internacional de mudanças climáticas
Jair Bolsonaro, candidato à Presidência pelo PSL, declarou à imprensa que, se for eleito, pretende retirar o Brasil do “Acordo de Paris”, que reúne, no âmbito da ONU, os compromissos voluntariamente assumidos por centenas de países para enfrentar as mudanças climáticas. Aparentemente, sua declaração converge com a posição tomada pelo presidente dos EUA, Donald Trump, que também rejeitou o tratado, assinado por seu antecessor, Barack Obama.
O IPCC, colegiado de cientistas que assessora a ONU, divulgou, em 8/10, seu novo relatório, que resume os resultados de pesquisas recentes realizadas no mundo todo sobre as mudanças no clima. O documento mostra uma situação alarmante, de aceleração muito rápida do degelo das calotas polares, aumento do nível dos oceanos, dos desastres climáticos, dos impactos na saúde humana, dos prejuízos econômicos, do número de refugiados climáticos, entre outros. O estudo também confirma que os países em desenvolvimento, como o Brasil, são os mais afetados pelas mudanças climáticas, embora também os países desenvolvidos estejam sujeitos a crescentes vulnerabilidades.
São muito diferentes as situações do Brasil e dos EUA. Os norte-americanos são os maiores emissores históricos de gases do efeito estufa desde a Revolução Industrial e só recentemente foram superados pela China. O Brasil, assim como os demais países em desenvolvimento, não se inclui entre os maiores emissores históricos. Chegou a ser o quinto maior emissor quando o desmatamento na Amazônia atingiu o seu pico, em 2005, mas melhorou a sua posição quando ele foi significativamente reduzido, entre 2006 e 2012, resultado de políticas públicas como o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm). Após 2012, diante do desinvestimento estatal no combate à criminalidade ambiental, os níveis de desmatamento voltaram a subir, distanciando o Brasil do cumprimento de suas primeiras metas climáticas, estabelecidas em 2009 e cujo prazo é 2020.
A maior parte das nossas emissões decorre do desmatamento, diferentemente dos países desenvolvidos, cujas emissões derivam da queima de combustíveis fósseis. O custo relativo de reduzir o desmatamento é infinitamente menor do que o de mudar a matriz energética.
Donald Trump faz bravata com o Acordo de Paris e com a ciência do clima para postergar investimentos na mudança da matriz energética, imaginando supostas vantagens comerciais, por exemplo, em relação à indústria do petróleo. Para nós e os demais países, ficariam as restrições comerciais e as consequências climáticas. Mas também é preciso considerar que todos os principais estados que movem a economia norte-americana dispõem de legislação própria para reduzir emissões e incentivar as tecnologias limpas.
Foi-se o tempo em que as políticas climáticas estiveram mais preocupadas com os custos da redução de emissões, que frequentemente justificaram posições refratárias dos EUA nas negociações internacionais sobre clima. O foco, hoje, é o desenvolvimento tecnológico e a garantia dos direitos de propriedade intelectual sobre as novas tecnologias. O Brasil já está atrasado nessa corrida e a sua eventual exclusão do Acordo de Paris empurraria o país para o isolamento, com grandes prejuízos para o seu desenvolvimento econômico.
A situação do clima também se agrava no Brasil. A seca deixou de ser um problema nordestino, há vários focos de desertificação se expandindo pelo território e crises hídricas afetam São Paulo, Brasília e Nordeste, entre outros. A redução do volume de água transportado pelos ventos da Amazônia para as principais regiões metropolitanas e agrícolas pode afetar seriamente a economia e as condições de vida no país. A ciência brasileira tem alertado que, se atingidos entre 20% e 25% de desmatamento na Amazônia - o percentual acumulado atualmente é de 19% - a floresta perderá seu equilíbrio e parte significativa dela passará por processo irreversível de savanização, com a perda de seus imprescindíveis serviços ambientais.
A questão climática é concreta, grave e urgente, e não deve ser tratada como se fosse ideológica ou partidária, por qualquer candidato ou dirigente que esteja consciente das suas responsabilidades.