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Quanta destruição uma só pessoa consegue causar na Amazônia?

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Antonio Oviedo

Novo ritmo de desmatamento e queimadas imposto pelo governo Bolsonaro jogará 4,7 gigatoneladas de carbono na atmosfera por ano, o equivalente à emissão dos Estados Unidos.

O efeito dos incêndios florestais nas emissões de carbono é um dos ciclos de retroalimentação climáticos mais temidos. A floresta deixa de armazenar carbono para virar fonte. Mais incêndios significam mais aquecimento que, por sua vez, significa mais incêndios. Na Amazônia, um período de incêndios florestais como estamos observando em 2019 pode eliminar por completo os ganhos de emissão conquistados em períodos anteriores de implementação efetiva de políticas ambientais como, por exemplo, as duas primeiras fases do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), entre 2004 e 2012, que reduziram o desmatamento na Amazônia em 83%. Temporadas de incêndios florestais como essa soam como se o Brasil estivesse zombando da abordagem do desenvolvimento sustentável, onde a redução de emissões se insere. E a situação da política ambiental no país promete ficar pior.

A Amazônia legal, que já sofreu em 2010 uma “seca centenária”, registrou em 2017 e 2018, 199 mil e 90 mil, respectivamente, focos de incêndios conforme os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). E até agosto de 2019, já foram registrados outros 53 mil focos de incêndios.

Hoje, a floresta amazônica fica com um quarto de todo o carbono absorvido por ano pelas florestas do planeta. Em 2018, o presidente Bolsonaro prometeu abrir a floresta amazônica para um modelo de pilhagem dos recursos naturais, ou seja, para o desmatamento. Quanto estrago uma só pessoa consegue causar para a Amazônia? Um estudo de cientistas brasileiros (ISA e UFMG) estimou que entre 2019 a 2022 esse desmatamento liberaria o equivalente a 19 gigatoneladas de carbono (média de 4,7 gigatoneladas ao ano). No ano passado, os Estados Unidos emitiram cerca de cinco gigatoneladas. Isso significa que a política do governo Bolsonaro, sozinho, acrescenta anualmente um Estados Unidos, com todos os seus aviões, automóveis e usinas a carvão. A China emitiu em 2018 nove gigatoneladas de carbono. Isso significa que a política ambiental de Bolsonaro acrescenta uma meia China ao problema do aquecimento global.

O governo Bolsonaro imprime um discurso com citações levianas, ilações, acusações sem fatos, que não responde por sua responsabilidade sobre a implementação de uma política ambiental no país. Os incêndios florestais são um reflexo desse discurso e estímulo ao desmatamento e ocupação irracional do território. Tudo isso aliado com o relaxamento completo da fiscalização ambiental. O presidente Bolsonaro e seu Ministro Ricardo Salles atacam os países que demonstram interesse em colaborar para a proteção da Amazônia, reclamando o direito deste governo de desmatar a Amazônia. Uma eterna tentativa de encontrar um culpado que eles, mas que ao final resulta em investimentos de remediação do governo federal na ordem de 38,5 milhões de reais para apagar os incêndios que eles próprios acenderam o primeiro palito de fósforo.

Um outro estudo recente, também de pesquisadores brasileiros, mostrou que as terras indígenas da Amazônia perderam somente 1,2% da sua cobertura florestal. As populações indígenas usam o fogo como prática de manejo dos seus roçados, mas o sistema de uso tradicional e abandono das áreas promove a regeneração e manutenção da floresta. Por outro lado, as áreas do entorno desses territórios, ao sofrerem com o desmatamento e os incêndios florestais apresentam uma capacidade de regeneração muito menor, aumentando essa perda para 20% do entorno entre 2 a 10km das terras indígenas. Ao invés de atacar as terras indígenas, o governo federal deveria aprender com os povos indígenas sobre como aproveitar dos recursos da Amazônia por centenas de anos, e não por quatro ou mais.

É urgente ensinar ao Bolsonaro que a manutenção da floresta amazônica pode fornecer trilhões de reais anuais, indefinidamente. Somente nas áreas protegidas, os valores para fins de regulação das chuvas podem alcançar R$ 4,6 bilhões anuais. A provisão de materiais e alimentos, somente considerando as unidades de conservação de uso sustentável, podem alcançar R$ 1,9 bilhões anuais. Com base nesses valores, os rendimentos relacionados com a redução do desmatamento e as emissões de carbono para todas as áreas protegidas pode atingir R$ 2,9 trilhões anuais.

O resultado da destruição da Amazônia que estamos assistindo é pior, muito pior do que você imagina. O ritmo acelerado do desmatamento atribuído a ausência de uma política ambiental do governo Bolsonaro não é um mito. O presidente não é um mito, mas uma expressão real de uma agenda da destruição.

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