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A Luta Yanomami, de Claudia Andujar, chega a Paris

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Retrospectiva com mais de 300 fotos da brasileira vai até maio e segue depois para Suíça, Itália e Espanha; apoiam o ISA, o Instituto Moreira Salles e a Hutukara Associação Yanomami
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“Claudia, por que você tira tantas fotografias dos Yanomami? Você vai imprimir em papel e depois guardar?”, narra o líder Yanomami Davi Kopenawa em uma das cenas de “Gyuri”, documentário sobre a trajetória da fotógrafa naturalizada brasileira Claudia Andujar, de 88 anos. “E ela me explicou: ‘não, Davi. Sou fotógrafa, vou tirar essas fotos e colocá-las em um livro. Para mostrar para as pessoas que não conhecem os índios. Se elas se interessarem pela sua imagem, pelo seu povo, elas vão te respeitar um pouquinho.”



Desde o primeiro contato com os Yanomami, em 1971, Claudia sabia que as imagens dos indígenas precisavam ganhar o mundo. Quase 50 anos depois, ela e Davi desembarcam na Fundação Cartier, em Paris, para a abertura da maior exposição até hoje dedicada ao trabalho e ativismo da brasileira. “Claudia Andujar, La Lutte Yanomami” (A Luta Yanomami) estreia nesta quinta-feira (30/01) e vai até 10 de maio. Depois, segue para Suíça (maio), Itália (outubro) e Espanha (fevereiro de 2021).

Com base em anos de pesquisa no arquivo de Claudia, a exposição reúne mais de 300 fotografias, uma instalação audiovisual e uma série de desenhos Yanomami. Em 2018, o público de São Paulo pôde visitar em primeira mão o resultado da curadoria de Thyago Nogueira para o Instituto Moreira Salles (IMS), apoiada também pelo Instituto Socioambiental (ISA) e a Hutukara Associação Yanomami. Ano passado, foi a vez do IMS do Rio de Janeiro sediar a retrospectiva.

Além de Davi e Claudia, dois nomes diretamente ligados à causa Yanomami — o missionário italiano Carlo Zacquini e o etnólogo francês Bruce Albert — também participam da cerimônia de inauguração em Paris, que acontece nesta quarta-feira (29/01). Os quatro, junto ao fundador do ISA, Beto Ricardo, criaram em 1978 a Comissão Pró-Yanomami, determinante para a demarcação da Terra Indígena Yanomami pelo governo brasileiro, em 25 de maio de 1992. Bruce e Davi escreveram o best-sellerA Queda do Céu”, um testemunho da cosmovisão Yanomami e um alerta contra a destruição da Amazônia.



Essa não é a primeira vez que a Fundação Cartier recebe Claudia e os Yanomami. Em 2004, a exposição “Yanomami, Espírito da Floresta” mostrou o resultado de um projeto que integrou índios brasileiros e artistas europeus e brasileiros. Agora, os parisienses têm a oportunidade de se aprofundar nos registros mais emblemáticos da fotógrafa, em sua maioria feitos durante o período em que esteve em Roraima, nos anos 1970. Sendo a maioria tirada em preto e branco, com variadas técnicas e muitas vezes na sombra das malocas e da floresta, as fotos jogaram luz nos impactos sofridos pelos indígenas por conta da invasão de seu território pelo homem branco, com a abertura de estradas e garimpos, disseminação de doenças e toda sorte de violência.

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Claudia pôs a luta dos Yanomami e a aldeia Catrimani no mapa quando emplacou na Revista Realidade uma capa marcante, com uma mulher dando rosto à reportagem especial sobre as ameaças contra o povo. As doenças e o garimpo avançavam com a chegada da Rodovia Perimetral Norte, um projeto da ditadura cívico-militar brasileira. A viagem lhe marcou tanto que Claudia decidiu viver com os Yanomami. Ali nascia seu compromisso permanente com a causa. E a documentação desse período fascinante.

A relação entre Claudia e Davi Kopenawa também sempre foi próxima. O xamã encontrou na napë — “branca” em seu idioma — não uma inimiga (outra tradução possível para a palavra), mas uma grande aliada. Claudia levou a existência dos Yanomami para públicos diversos e, ao lado de outros apoiadores dos indígenas, ajudou a reverberar as demandas deles para a sociedade global e entre governantes e tomadores de decisão.



A maior conquista foi a demarcação da TI Yanomami. A imensidão de floresta tropical preservada se estende por 96.650 km², território em extensão maior que o de Portugal. Estimados em 25 mil pessoas, divididas em 322 aldeias, os Yanomami habitam uma região de serras ao norte da Floresta Amazônica, na fronteira do Brasil com a Venezuela.

“Só sei que, no Brasil de hoje, por algum critério misterioso, o fato dos Yanomami viverem há milhares de anos naquelas matas não gera direito algum de nelas permanecer”, disse em depoimento ao livro “Yanomami, 1978” Darcy Ribeiro, antropólogo e amigo de Claudia. Foi ele quem sugeriu a ela uma reportagem sobre os Karajá, na Ilha do Bananal, Rio Araguaia. Dali em diante, o laço entre ela e os povos indígenas jamais se desfez — em especial com os Yanomami.

Nascida Claudine Haas, em Neuchâtel, Suíça, em 12 de junho de 1931, ela perdeu praticamente a família paterna inteira na Segunda Guerra Mundial. O pai, um engenheiro húngaro de origem judaica, e diversos parentes, foram mortos no campo de concentração de Dachau, na Alemanha. Claudia e a mãe fugiram do nazismo para os EUA, porto seguro de onde partiram para o destino final das duas: o Brasil. Fluente até então em húngaro, alemão, francês e inglês, Claudia começou ainda jovem a usar uma máquina Rolleiflex para se comunicar com os novos compatriotas. A ferramenta ganhou potência, transformou sua vida e deu visibilidade à luta Yanomami, que segue firme contra antigas e novas ameaças.

“Constato que me sinto à vontade neste mundo Yanomami. Não me sinto mais uma estranha. Este mundo ajuda a me compreender e a aceitar o outro mundo em que me criei. Os dois mundos estão se juntando, num grande abraço. É, para mim, um mundo só”, disse em 1975, em registro do catálogo da exposição de 2018 em São Paulo.

Claudia Andujar, a luta Yanomami

Quando: De 30 de janeiro a 10 de maio de 2020
Horário: terça-feira, das 11h às 22h,
Quarta-feira - domingo, das 11h às 20h
Onde: Fundação Cartier 261, Boulevard Raspail, Paris.

Marina Terra
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