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Maurício Ye'kwana assume campanha: pressão só acaba quando garimpeiros forem retirados

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Novo porta-voz da #ForaGarimpoForaCovid é injeção de ânimo na reta final da mobilização, que pede a desintrusão de 20 mil garimpeiros da Terra Indígena Yanomami
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Em sua reta final, a campanha #ForaGarimpoForaCovid ganhou um novo porta-voz: a liderança Maurício Ye’kwana. Maurício assume o trabalho iniciado por Dário Kopenawa, que volta para sua aldeia na Terra Indígena Yanomami depois de seis meses longe de sua terra.
Maurício chegou essa semana a Boa Vista (RR), depois de passar os últimos meses lutando contra a Covid-19 em sua aldeia na região de Auaris, para continuar lutando pela desintrusão dos 20 mil garimpeiros ilegais que estão dentro da Terra Indígena Yanomami, e que são o principal vetor da Covid-19 para os indígenas.

Nesses quase dois meses, a campanha já teve muitas conquistas. As reivindicações dos Yanomami e Ye’kwana chegaram ao vice-presidente Mourão, e até mesmo na Organização dos Estados Americanos (OEA). Nesta semana, Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) demandou que o governo brasileiro tomasse ações efetivas para conter a pandemia entre os Yanomami e Ye’kwana. Dário relatou tudo isso em suas redes sociais, que você pode ver aqui. O problema é que, efetivamente, nada foi feito e a invasão persiste. A meta da campanha, no momento, é atingir 500 mil assinaturas (veja aqui).

Em entrevista ao Instituto Socioambiental (ISA), Maurício trouxe informações direto da Terra Indígena Yanomami. Ele conta que os garimpeiros continuam subindo os rios, de barco, e levando o coronavírus para dentro das comunidades. “Os garimpeiros passam perto das comunidades de barco. A entrada deles é via fluvial. Só grandes empresários fretam avião. Os garimpeiros passam de barco em três comunidades, os indígenas às vezes ficam curiosos, se aproximam”, conta Maurício.

Outro foco de contaminação são os polos base, o equivalente aos postos de saúde. “Os garimpeiros vão em busca de atendimento de saúde no polo base do [Distrito sanitário especial indígena] Dsei e onde os indígenas frequentam todo dia para se medicar. Isso não parou com a pandemia”, diz.

Em Waikás, a região com a maior zona garimpeira de toda a TI, já são 44 casos confirmados da Covid-19. A doença chegou por meio de um indígena que teve contato com garimpeiros.

Mesmo com a invasão ilegal, os Yanomami e Ye’kwana têm tentado como podem se proteger da Covid-19 dentro do seu território. Em sua região, Auaris, Maurício conta que organizou os atendimentos para que os indígenas só fossem recebidos 15 dias após a chegada dos agentes de saúde, para que eles pudessem cumprir a quarentena. Além disso, muitos indígenas, sobretudo os mais velhos, deixaram suas aldeias e foram buscar isolamento em acampamentos na floresta.

Maurício começou a atuar no movimento indígena em 2008, tendo feito uma formação para jovens lideranças proposta pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). Já foi vice-presidente da Hutukara e hoje é um dos seus diretores. Também participou de eventos internacionais, como as Conferências das Partes (COP) 21, 22 e 23 e a 12ª sessão do Mecanismo de Peritos da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre os direitos dos povos indígenas, representando a Hutukara.

“Fui chamado para poder somar na luta dessa campanha e dar continuidade, tentar chamar a atenção do mundo, das pessoas que abraçam a luta dos povos Yanomami e Ye’kwana e que não é diferente da luta de todos os povos indígenas”, diz ele.

Desde que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) assumiu, a invasão explodiu no território, conta Maurício. Estima-se que 20 mil garimpeiros atuem ilegalmente dentro da TIY. “Eles sempre falaram: se Bolsonaro ganhar nós vamos ter forças para trabalhar mais ainda aqui, vocês não vão poder nos impedir”, afirma Maurício. A atividade de garimpo em Terra Indígena é ilegal.

A Covid-19 agrava o problema, mas a questão do garimpo já provoca sofrimento no povo Yanomami e Ye’kwana há muito tempo. A violência, o abuso sexual das mulheres indígenas e a contaminação dos rios e da terra são as piores consequências, aponta a liderança.

“Os garimpeiros estão se matando entre eles. Aí o corpo é jogado na água, enterrado lá. Em alguns lugares, têm o abuso sexual das mulheres Yanomami, além da contaminação do rio onde a gente consome os peixes, contaminação por mercúrio (usado na atividade garimpeira)”, conta. “Os garimpeiros estão mais armados que os Yanomami”.

Outra preocupação é com os Moxihatëtëma, os indígenas isolados que vivem na TIY. Com o aumento da invasão, os garimpeiros se aproximaram da região onde eles vivem. O risco, tanto de violência quanto de transmissão de doenças, é ainda maior para esses indígenas.

“Como o Davi (Kopenawa, grande xamã Yanomami) fala, tem que sacudir, tem que falar, tem que balançar, tem que cutucar, se não eles não vão fazer nada. Vamos continuar cutucando, pressionando, até que eles fiquem cansados e façam a operação. A gente espera isso, por isso está nesta luta”, conclui.

Acompanhe o Maurício e a sua luta pelo povo Yanomami e Ye’kwana em suas redes sociais aqui.

Clara Roman
ISA
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