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Gilmar Kiripuku Galache, cineasta Terena e integrante da equipe do ISA em Brasília
Há pouco mais de um mês, começava a vacinação contra o novo coronavírus entre os povos indígenas do Pantanal sul-mato-grossense, região de onde venho. Apesar da enorme indiferença do governo federal, as populações nativas teriam, então, prioridade na campanha de imunização, devido a sua dificuldade em acessar leitos hospitalares em seus municípios, racismo da sociedade envolvente e pelo modo de convívio tradicional, que não permite a prática do isolamento social.
Ainda assim, houve quem não quis se vacinar, principalmente membros de algumas igrejas neopentecostais, que acreditam que a vacina traz a marca da Besta ou que faz parte de uma conspiração para efetivar uma “nova ordem mundial”. Essas desinformações são disseminadas por pastores em redes sociais e grupos de Whatsapp. Acontece mesmo em uma comunidade distante 45 km da cidade e com acesso limitado à telefonia móvel.
Um dos vacinados foi Evaristo Borges, 75 anos, indígena Terena, nativo da aldeia Lalima, município de Miranda (MS), pertencente ao grupo de risco por comorbidades como diabetes e hipertensão, além de já ter sofrido um derrame cerebral (AVC). Sua filha, a enfermeira Meire Borges, com quem fui criado, defensora da vacina na região, tratou de imunizar o pai.
A maioria dos parentes também aceitou a vacina como uma forma de proteção da pandemia. Foram vacinados com a primeira dose da Coronavac e, a partir daí, seguiram as orientações dos agentes da saúde indígena de continuar com os cuidados e aguardar a segunda dose, quinze dias após a primeira. Porém alguns membros da família, por motivos religiosos, fizeram opção diferente.
Evaristo convive com pessoas que não tomaram a vacina. Quinze dias após a primeira dose, recebeu a segunda, junto com as orientações de continuar se cuidando. Quase um mês após a segunda aplicação, apresentou os primeiros sintomas de uma gripe forte. Logo foi hospitalizado, confirmado o resultado positivo para o teste de Covid-19.
Seu quadro evoluiu rapidamente, precisando ser entubado no hospital municipal de Miranda, com o pulmão já bastante comprometido. Após 15 dias internado, Evaristo apresentou melhora e, atualmente, está em casa com a família mais uma vez.
Outros parentes da aldeia também apresentaram sintomas, mas não fizeram teste, seguindo a vida normalmente.
"Já temos tantas doenças erradicadas pelas vacinas, como o sarampo. A ciência tem avançado muito. Precisamos confiar nela", me diz a enfermeira Terena Zuleica Tiago, da aldeia Água Branca, município de Aquidauana (MS). Mesmo com o grande número de negacionistas, ela reforça, principalmente para os parentes já imunizados, a importância dos cuidados pós-vacina, que podem variar de acordo com o laboratório que produziu a medicação. Assim, seguindo essas orientações, logo menos poderemos viver como vivíamos ou, quem sabe, próximo disso.
A reflexão que fica é que apenas a conscientização de tomar a vacina não é suficiente. Mesmo vacinados, temos que continuar com todos os cuidados, pois ainda podemos carregar o vírus. Nexipá Koranavirú! Cuidado com o coronavírus!
Diante do agravamento da crise de saúde, a vacina é o principal instrumento para proteger as pessoas, reduzir o número de casos e mortos pela Covid-19. Os especialistas alertam, porém, que, após receber o imunizante, é preciso esperar o período necessário para que o nosso sistema imunológico reaja e possa proteger efetivamente contra o novo coronavírus.
No caso da Coronavac, deve-se aguardar entre 14 e 28 dias para se tomar a segunda dose, após a primeira. A pessoa estará plenamente imunizada após, pelo menos, 14 dias dessa segunda aplicação. Para a vacina da Oxford/AstraZeneca, deve-se aguardar, pelo menos, 12 semanas entre uma dose e outra e mais seis semanas após a segunda aplicação.
Mesmo depois de ser vacinado, no entanto, ainda é possível pegar a doença, embora os sintomas sejam muito leves e as chances de a pessoa precisar de cuidado médico sejam muito pequenas. Portanto, é necessário continuar usando máscara, limpando as mãos constantemente e praticando o isolamento social até que a maioria da população esteja imunizada.