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Lira promete ouvir indígenas e diz que não haverá ‘pauta surpresa’ na Câmara

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ISA

O deputado Arthur Lira (PP-AL) é filho do ex-senador Benedito de Lira e um político tradicional nordestino. Começou na vida pública, em 1993, como vereador em Maceió. Depois, foi deputado estadual e está no terceiro mandato na Câmara federal. Já passou pelo DEM, PSDB, PTB e PMN, antes de chegar ao PP. Tem sido apontado como uma espécie de herdeiro do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha como líder do Centrão, aglomerado de partidos predominantemente de direita mas capazes de aderir a qualquer governo em troca de emendas parlamentares, cargos e influência.

Foi Lira quem primeiro percebeu a oportunidade para chegar à Presidência da Câmara e estendeu a mão a Jair Bolsonaro quando as pressões pelo impeachment aumentaram, no primeiro semestre do ano passado, na esteira da radicalização do discurso golpista do Planalto contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). De lá para cá, empenhou-se em construir uma base parlamentar para um governo que até então se recusava a negociar com o Legislativo.

A eleição do deputado à Presidência da Câmara, por 302 votos contra 145 do segundo lugar, Baleia Rossi (MDB-SP), na segunda (1), pode ser um marco para a gestão Bolsonaro. Uma base aparentemente estável e coesa, liderada por um presidente da Câmara aliado, é o que Bolsonaro precisava para aumentar as chances de evitar o impeachment. Além disso, o apoio legislativo pode ser decisivo para fazer tramitar bandeiras bolsonaristas, como aquelas contrárias ao meio ambiente e aos direitos indígenas. A bancada ruralista comemorou a eleição Lira.

Pouco depois dela, o Planalto enviou uma lista com 35 projetos prioritários para aprovação no Congresso. Entre eles, foram incluídas verdadeiras bombas contra a legislação socioambiental que aguardam apreciação na Câmara: o Projeto de Lei (PL) 3.729/2004, que pode enfraquecer o licenciamento ambiental; o chamado “PL da grilagem” (2.633/2020), que flexibiliza as regras da regularização fundiária; e o PL 191/2020, que abre as Terras Indígenas a atividades de grande impacto socioambiental, como mineração, garimpo e hidrelétricas. Com Lira na chefia da Câmara, o governo espera conseguir aprovar essas propostas.

Duas semanas antes das eleições no Congresso, o ISA entrou em contato com os principais candidatos às presidências do Senado e da Câmara para conhecer suas posições sobre temas e projetos relacionados aos direitos socioambientais. A reportagem aguardou até a véspera das eleições para publicar as respostas, mas apenas a assessoria de Lira respondeu, por escrito. A decisão do ISA foi de não publicar exclusivamente as respostas do candidato do PP para não favorecê-lo, em prejuízo dos outros candidatos. Após o pleito, em virtude da importância do conteúdo e do cargo envolvido, o ISA publica a entrevista.

O parlamentar adotou o discurso cauteloso de candidato e político experiente e evitou posicionar-se sobre projetos específicos, mas deixou claro que líderes partidários e bancadas estaduais terão maior influência para definir prioridades em seu mandato. Nesse ponto, ainda com discurso de candidato, Lira criticou seu antecessor, Rodrigo Maia, acusando-o de definir a pauta de votação de forma autoritária. A informação deixa em alerta ambientalistas e indígenas, pois pode significar a inclusão em pauta de retrocessos na legislação socioambiental.

Leia abaixo as respostas do Arthur Lira ainda como candidato à Presidência da Câmara.

ISA - Qual sua avaliação da política para povos e terras indígenas do governo Bolsonaro?

Arthur Lira - O que nós queremos para a Câmara é dar mais espaço para que todos os parlamentares tragam pautas importantes para o debate, como é o caso dos povos indígenas. Temos que fazer da Casa um ambiente que represente, de fato, os brasileiros, em toda a sua complexidade. Os direitos dos povos indígenas são garantidos pela Constituição, que reconhece seus costumes, suas crenças, suas tradições e o direito às terras que ocupam. E qualquer mudança relacionada a povos e terras indígenas terá que passar pelo Congresso Nacional. Não cabe a um discurso isolado, mas ao conjunto de 513 deputados, que são os representantes do povo, aqueles que mais conhecem as necessidades da população, chegar a propostas comuns, que sejam aprovadas pela maioria da Casa.

ISA - Qual sua opinião sobre o PL 191/2020, que pretende regulamentar a mineração, o garimpo, as hidrelétricas, a exploração de petróleo e gás e os transgênicos em Terras Indígenas? Avalia que ele deve ser aprovado, total ou parcialmente?

Arthur Lira - Não é questão de ser a favor ou contra um projeto ou outro. Quando eleito, o presidente da Câmara perde seu poder de voto. Isso é muito simbólico. Ele tem que ir pelo desejo do colégio de líderes. Vamos reunir esse grupo todas as quintas-feiras para saber o que será votado na semana seguinte, pela decisão da maioria das lideranças. Não haverá pauta surpresa. Então, qualquer tema de interesse, os deputados e a sociedade terão tempo para se organizar, reunir suas bases e discutir o que é mais importante. Esse ambiente democrático será a base para construirmos melhores projetos, ouvindo as partes interessadas. O papel da Câmara dos Deputados é trazer opiniões diversas para propor um debate amplo e chegar a uma proposta comum do que queremos para o país. O atual presidente da Casa [Rodrigo Maia] não tem feito isso. Se limita a emitir a opinião dele e calar as vozes dos demais deputados. Precisamos de tranquilidade para ouvir as comunidades indígenas que serão afetadas e saber o que elas pensam, o que elas querem, e avaliar de forma conjunta. O tema tem que avançar dentro de um espaço democrático.

ISA - O que a Câmara pode fazer para defender e promover os direitos dos povos indígenas neste momento?

AL - Completei uma viagem por todo o Brasil, escutando e conversando com as bancadas estaduais. Temos muito a propor e debater, o que inclui os direitos dos povos indígenas. Combinamos que as bancadas estaduais trarão as prioridades de cada região e esse assunto deve ser incluído. De qualquer forma, queremos um espaço plural na Câmara, que dê voz a todos. O Brasil precisa avançar nesse e em vários temas importantes. A Câmara tem muito a contribuir e, em conjunto, podemos dar condições para o diálogo, com absoluta independência. Nos últimos anos, a Câmara ficou paralisada, por conta do modelo de gestão que foi adotado, muito centralizado na figura do presidente. A falta de debate deixou muita coisa acumulada. Queremos mudar. A pauta precisa ser dividida com os deputados, discutida, debatida. O nosso papel é ajudar o Brasil.

ISA - Qual sua avaliação sobre a política ambiental do governo Bolsonaro?

AL - A agenda ambiental é muito importante para o país. O Brasil é reconhecido pela diversidade de fauna e flora e pela extensão de suas áreas de floresta e proteção. Na região Norte, por exemplo, visitei todos os estados, onde esse tema é de fundamental importância. Nenhuma das bancadas sente-se ouvida no modelo atual de gestão da Câmara. Pela sua relevância, é um tema que levanta discussão. Então, não é apenas uma avaliação da política ambiental do governo, mas o que a Câmara pode fazer por essa agenda. Quando deixamos esse questionamento em segundo plano e não cobramos um papel efetivo do Legislativo, com sua independência, estamos perdendo a capacidade de reação e debate da sociedade. Cuidar da agenda ambiental e da preservação de nossos espaços de floresta é estar atento ao nosso patrimônio, mostra cuidado com a população e preocupação com a herança para as gerações futuras dos brasileiros. O restante do mundo também olha para nós e precisamos tratar do tema com muita tranquilidade e com a relevância que ele requer.

ISA - Qual sua avaliação sobre o relatório do deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) do Projeto de Lei (PL) 3.279/2004, que prevê uma Lei Geral do Licenciamento Ambiental? Defende sua aprovação, total ou parcial? Qual sua posição sobre o tema licenciamento ambiental?

AL - Eu quero deixar bem claro que não cabe a mim, se for eleito, fazer a pauta do Brasil ao meu gosto, como fez o presidente atual. Muito embora, por tradição, seja o presidente que leve as pautas ao plenário, ela deve passar antes pela aprovação do colégio de líderes para ser construída com democracia, com soberania, com diálogo. Há muitos autores e projetos sobre o tema licenciamento ambiental e devo respeitar todos. Qualquer projeto, seja de direita, de centro, de esquerda, seja econômico, social ou ambiental que estiver amadurecido na sociedade brasileira e que contar com a maioria da aprovação no colégio de líderes, será pautado e o resultado será democraticamente resolvido no plenário da Casa. Isso requer um amadurecimento dos temas pela sociedade, pois os parlamentares são os representantes de suas localidades e dos seus grupos temáticos e sociais. O papel do presidente é estar ao centro do plenário, olhando para os lados e conduzindo com absoluta isenção os trabalhos legislativos.

ISA - Qual sua avaliação sobre o PL 2633/2020, que muda a legislação sobre a regularização de terras? Considera que deve ser aprovado, total ou parcialmente?

AL - Sem debate, não avançamos em nada, nem para um lado, nem para o outro. Minha visão é de que o presidente da Câmara deve ser um guardião da soberania do Plenário. Sua função é fazer a discussão e o debate acontecer. É acompanhar a democracia ser exercida na vontade de cada um dos colegas de mandato. Qualquer assunto que chegue deve ser tratado com respeito, independência e isenção e todos os parlamentares devem ter espaço para se pronunciarem, para serem ouvidos.

ISA - O que a Câmara deve fazer neste momento para defender e promover o meio ambiente?

A Amazônia, assim como o Pantanal, a Mata Atlântica e os outros biomas, são patrimônio da população brasileira e orgulho nacional. A preservação desses biomas tem impacto direto no desenvolvimento de uma economia sustentável para o país. Certamente é possível promover um ambiente de preservação e promoção social, que alie a confiança para os negócios e investimentos, a punição aos infratores e deixe um legado para as próximas gerações. Temos que encontrar um caminho possível para conciliar a agenda ambiental com a de desenvolvimento econômico e social. Existem boas iniciativas de colegas sobre o assunto em tramitação na Câmara.

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