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A equipe da expedição realizada no final de 2012, fruto da parceria da Hutukara, Funai e ISA, que constatou aumento nas pressões na fronteira da TI Yanomami, voltou agora em abril. Desde 2010, as três instituições tem dado atenção especial ao limite leste da Terra Indígena com o objetivo de realizar atividades de fortalecimento cultural, proteção territorial e geração de renda, buscando reverter o quadro de pressões que ameaça o território Yanomami.
Em 2012, a equipe percorreu de 200 km de fronteira da TI, registrando pontos de invasão e o crescimento ilegal das estradas de terra na região. Agora, a equipe voltou e a Funai instalou placas e sinalizou os limites da TI, onde em 2012 foram encontrados focos de invasão. Além disso, a expedição seguiu por estradas recém-abertas, verificando até onde vai o desmatamento e a ocupação ilegal no entorno da TI. (Veja mapa).
No entorno do limite leste da TI, entre os rios Ajarani e Apiau, existem cinco projetos de assentamento (PAs) do Incra: Sumaúma, Vila Nova, Apiau, Paredão, Massaranduba e Ajarani. A dinâmica de ocupação ilegal no entorno desses assentamentos, descrita ainda no início dos anos 2000 continua até os dias de hoje: pequenos agricultores ou especuladores imobiliários, que não foram assentados utilizam-se da estrutura viária criada para atender aos assentados, prolongando ilegalmente as estradas de terra, e loteando de forma arbitrária lotes em terras de domínio público. (Veja quadro no final do texto).
Invasores se escudam nos assentamentos do Incra
A partir da ocupação ilegal eles esperam a legalização de seus lotes. Essa legalização viria com a criação de novos projetos de assentamentos, e é incentivada por atores políticos regionais, que esperam ganhar votos em troca. Assim, a estrada de terra que está sendo aberta desde 2009, e atualmente (veja no mapa) muito próxima aos limites da TI Yanomami, é conhecida pelo nome de uma vereadora da região que teria incentivado a ocupação.
Além dessa, mais uma estrada começou a ser aberta recentemente no entorno da TI. O fato preocupa, pois o empobrecimento dos recursos florestais das regiões ocupadas pelos novos habitantes é um efeito previsto das ocupações recentes na Amazônia, e que deve acontecer na região, principalmente em relação aos recursos madeireiros. Aumenta, dessa forma, o risco de a TI ser invadida para a retirada ilegal de madeira. O mesmo pode ocorrer com as atividades de caça, pesca e coleta.
O Ajarani foi o lugar onde os Yanomami tiveram o primeiro contato sistemático com a sociedade nacional, com grande impacto nas comunidades da região. A estrada trouxe epidemias que resultaram na morte de centenas de Yanomami. Antropólogos que trabalharam na região na década de 1970 estimam um índice de mortalidade de 80%. Isso causou profunda desestruturação social na região e, ainda hoje, 20 anos depois da homologação da TI, há fazendeiros que não foram retirados pela Funai. (Saiba mais).
[...]A Constituição de 1988 termina com o controle direto do governo federal sobre os Territórios Federais ainda existentes (Amapá e Roraima), então transformados plenamente em Estados da Federação. Dentre várias mudanças, notamos a eleição em Roraima de um número excessivo de políticos em relação à população do estado: oito deputados, três senadores e 24 deputados estaduais para apenas 250.000 habitantes. Desde então, a vontade dessa classe política de constituir eleitorados cativos por meio de relações paternalistas e de sua intermediação no acesso à terra passou a ser um novo e forte incentivo ao desenvolvimento de projetos de colonização na região.
[...]O processo de colonização - e este é sem dúvida um de seus piores defeitos - não é conduzido unicamente pelas administrações encarregadas de promovê-lo. Os últimos migrantes, a chegarem ao longo das estradas vicinais, não encontrando terra disponível, prolongam-nas com picadas improvisadas, o que lhes permite penetrar mais fundo na floresta. Essas picadas são geralmente abertas com o apoio de madeireiros, que remuneram o camponês pelas árvores retiradas do seu futuro lote.
Quando uma administração (o município ou o INCRA) decide abrir uma nova vicinal, esta segue, em realidade, o traçado ou a direção das picadas mais povoadas ou mais freqüentadas de um loteamento. Desta forma, a ocupação e as atividades irregulares guiam em parte a conquista legal do espaço nos programas de colonização [...]
[...] O papel dos políticos locais deve ser particularmente destacado, pois a atribuição de lotes nas zonas de colonização é um meio eficaz de constituir uma base eleitoral. [...] A migração é, assim, muitas vezes incentivada ou facilitada pelos políticos locais. Porém, o setor econômico regional é também favorável à conquista das zonas florestais. Os empresários de obras públicas são os beneficiários dos canteiros de obras na abertura de estradas, enquanto os madeireiros precisam, para alcançar sua matéria-prima, de picadas que entram sempre mais profundamente na floresta. Mas o papel mais importante no processo continua sendo, obviamente, o do colono ou do migrante que se instala na floresta.
[…]As estratégias dos pequenos agricultores em Roraima assemelham-se àquelas que foram descritas para as demais regiões amazônicas. Raciocinando a curto prazo, eles podem contentar-se em concluir o desmatamento de sua parcela e cedê-la, uma vez convertida em pastagem, a um proprietário mais afortunado (fazendeiro ou empresário), obtendo com isso um capital que lhes permitirá instalar-se em outro lugar com melhores chances de sucesso. Alguns empreendedores dispondo de capitais importantes intervêm junto aos colonos a fim de acumular lotes, tornando-se grandes proprietários fundiários. Finalmente, essas fazendas serão ou não regularizadas em função dos apoios políticos desses proprietários.
(*)Trechos retirados do Artigo “Colonização agrícola e áreas protegidas no Oeste de Roraima” do geógrafo François-Michel le Tourneau, de 2003, publicado pela CCPY