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Por Carolina Fasolo
Há 18 anos, o Acampamento Terra Livre (ATL) ocupa a capital do país para lembrar que o Brasil é Terra Indígena. Em 2022, o acampamento acontece de 4 a 14 de abril no Complexo Cultural Funarte, e já reúne mais de sete mil indígenas, de 176 povos de todas as regiões do país. A mobilização é realizada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e suas organizações de base*.
Com o tema ‘Retomando o Brasil: Demarcar Territórios e Aldear a Política’, a maior mobilização indígena do Brasil ocorre em um momento de extrema ameaça aos direitos indígenas e ao meio ambiente. Está na agenda prioritária do Congresso Nacional o “Pacote da Destruição”, um conjunto de projetos de lei que ameaçam o meio ambiente e os territórios indígenas.
Entre os projetos, estão:
- PL do Veneno (6.299/2002), que facilita a venda e o uso de agrotóxicos.
- PL da Grilagem (2.633/2020 e o 510/2021), que possibilita o roubo de terras públicas.
- PL 490/200, que permite que o governo retire da posse dos povos indígenas áreas oficializadas há décadas e escancara as terras indígenas a empreendimentos predatórios.
- PL do Licenciamento Ambiental (3.729/2004), que pode ampliar os riscos de proliferação de novos crimes socioambientais, como as tragédias ocorridas em Mariana e Brumadinho (MG).
Estamos na metade da nossa Marcha pela ‘Demarcação Já’ aproximando da esplanada dos ministérios, centro da política brasileira. Lugares onde muitas das vezes autorizam e buscam exterminar nossas vidas e territórios.
SAIBA MAIS: https://t.co/QTD1lPoyAn
#ATL2022 pic.twitter.com/NfiIQ3pK55— Apib Oficial (@ApibOficial) April 6, 2022
Na tarde desta quarta-feira (6/4), a marcha ‘Demarcação Já’ ocupou o Eixo Monumental em direção ao Congresso Nacional. Nos quase oito quilômetros de caminhada, ida e volta, guerreiros e guerreiras, jovens, anciãos e crianças entoaram cantos de luta e carregaram faixas, cartazes e até mesmo o ‘mundo nas costas’ contra a agenda anti-indígena do governo federal e do legislativo, e pela demarcação das terras indígenas.
“Nós temos vários projetos de lei no Congresso Nacional que vão prejudicar e impactar diretamente a população indígena, com o fim da demarcação de terras indígenas e a liberação da mineração em terras indígenas”, explicou Oreme Ikpeng, ativista ambiental e técnico em Agroecologia Indígena do povo Ikpeng do Território Indígena do Xingu (TIX).
Agnaldo Francisco, liderança Pataxó Hã-Hã-Hãe e coordenador geral do Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas da Bahia (Mupoiba), disse que sem as terras indígenas não haverá continuidade da vida no planeta.
“Se o território não for demarcado, um projeto de morte será implementado. Morte não só para nós [povos indígenas], mas para todos os brasileiros, para todo o planeta. A demarcação do nosso território significa a preservação do meio ambiente, significa preservar e diminuir o desgaste da camada de ozônio”, afirmou.
Enquanto marchavam, seguia no Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento do Pacote Verde, referente às sete ações relacionadas à proteção do meio ambiente e ao enfrentamento das mudanças climáticas.
Em pauta, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 760, que exige a retomada do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAM) e a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 54, que acusa o Governo Federal de omissão no combate ao desmatamento na Amazônia.
A ministra Cármen Lúcia concluiu seu voto determinando que o governo federal elabore, num prazo de 60 dias, um plano de retomada do efetivo combate ao desmatamento na Amazônia, garantindo a máxima proteção do meio ambiente e a execução de políticas públicas.
Na sequência, o ministro André Mendonça pediu vista do processo, o que suspende o julgamento até que o magistrado devolva o caso ao plenário.
Na quarta-feira, uma plenária virtual reuniu o Parlamento Europeu, representantes da Organização das Nações Unidas (ONU) e lideranças indígenas para discutir as urgências dos povos para preservação da vida e do planeta.
Na terça-feira (5/4), a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas lançou, em plenária, a Carta Aberta contra o Projeto de Lei (PL) 191/2020, que recolhe assinaturas de parlamentares, personalidades, instituições, organizações e movimentos sociais do Brasil e do exterior.
“É um projeto que atropela a Constituição Federal e ataca, mais uma vez, os direitos dos povos originários do Brasil. O PL 191/2020 apresenta evidentes problemas jurídicos e de inconstitucionalidade, desconsidera tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, e afronta o próprio Regimento Interno da Câmara dos Deputados”, diz a carta.
O PL 191/20, apelidado de “Projeto X-Tudo”, abre as Terras Indígenas à exploração de petróleo, gás e minérios, permite a instalação de hidrelétricas e grandes projetos de infraestrutura, além do cultivo de transgênicos dentro dos territórios.
Com dez dias de programação e mais de 40 atividades, o ATL inclui em sua programação, além do enfrentamento da agenda anti-indígena, debates sobre educação e saúde indígena, povos isolados, protagonismo das juventudes, mulheres indígenas na política, indígenas LGBTQIA+, além de plenárias sobre impactos no judiciário, demarcação de terras indígenas e políticas públicas.
“Depois de dois anos de Acampamento Terra Livre online, pelas telas, voltamos a ocupar Brasília, a Esplanada dos Ministérios, e voltamos presencialmente a pintar Brasília de urucum e jenipapo. Trazemos a forma da diversidade dos povos indígenas do Brasil, essa resistência, que é secular da luta indígena, que traz ainda como principal bandeira a demarcação das terras indígenas”, afirmou Sônia Guajajara, da coordenação executiva da Apib.
* O Acampamento Terra Livre é realizado pela Apib e suas organizações de base – Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme); Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab); Conselho Terena; Comissão Guarani Yvyrupa (CGY); Aty Guasu – a Grande Assembleia dos Povos Guarani e Kaiowá; Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul); e Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (Arpinsudeste) -, e organizações que apoiam o movimento indígena.