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A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, hoje (2/9), a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 71/2011, que prevê a indenização pela terra nua de produtores rurais com áreas incidentes em Terras Indígenas (TIs). Atualmente, a Constituição determina apenas compensação por benfeitorias. Agora, o projeto segue ao plenário do Senado e, se aprovado, vai à Câmara.
De acordo com o texto da CCJ, a indenização será concedida somente em dinheiro, antes que o produtor saia da TI e para áreas homologadas após 5 de outubro de 2013 pela Presidência da República. Produtores rurais com áreas em territórios homologados antes disso não teriam direito à indenização (veja o parecer). O relator da matéria foi o senador Blairo Maggi (PR-MT).
A votação foi viabilizada por acordo entre o governo e ruralistas do Senado, em especial os parlamentares do Mato Grosso do Sul, e ocorreu depois que Semião Vilhalva Guarani Kaiowá foi assassinado por fazendeiros, no sábado (29/8), em Antônio João (MS), fronteira com o Paraguai (saiba mais).
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, participou do acordo. Ele viajou hoje para o Mato Grosso do Sul para conversar com autoridades, fazendeiros e líderes indígenas sobre os conflitos fundiários no Estado (leia aqui).
“Se é essa não é a melhor proposta, é a mais alinhada com a realidade. O ótimo é o inimigo do bom”, afirmou o senador Delcídio Amaral (PT-MS).
“A partir do momento que temos uma PEC dizendo que temos de indenizar, isso distensiona o campo. Todo mundo terá paciência de esperar seis meses a um ano”, argumentou a senadora Simone Tebet (PMDB-MS), que deve ser a relatora na votação em plenário.
A viabilidade da proposta, no entanto, é questionável em virtude das dificuldades do caixa federal. Por causa disso, a obrigatoriedade do pagamento em dinheiro pode emperrar a regularização das TIs. Em geral, o governo desapropria ou paga por terras, como no caso da reforma agrária, por meio de títulos ou precatórios, e não em dinheiro vivo, como determina a PEC.
As Unidades de Conservação – parques e reservas ambientais – são uma exceção, com previsão legal para pagamento em dinheiro. Nesse caso, há um passivo enorme para indenizações que o Estado não consegue resolver.
Apesar da base aliada no Senado ter defendido a PEC 71, a área econômica do governo segue pressionando para que matérias que impliquem novos custos não sejam aprovadas no Congresso. O Planalto acaba de enviar ao parlamento um orçamento que prevê déficit fiscal em 2016.
“Se não for com pagamento prévio, o produtor não vai sair”, defende Simone Tebet. Ela diz que a conta das indenizações não precisa ser paga de uma vez, mas ao longo de vários anos, o que convenceria o governo em sua opinião. Segundo a senadora, já haveria acordo para aprovar a PEC na Câmara.
Na sessão da CCJ, os senadores repetiram que haveria 17 TIs aguardando o decreto de homologação na mesa da presidente Dilma Rousseff. Tebet acredita que, se for necessário lançar mão das indenizações, o número de duas homologações realizadas por ano seria um número razoável para enfrentar esse passivo.
O sócio fundador do ISA Márcio Santilli adverte que a redação aprovada na CCJ pode gerar uma expectativa que poderá resultar em maior frustração se não houver dinheiro disponível para as indenizações. “A opção pelo pagamento em dinheiro poderá provocar uma dinâmica sinistra, em que será preciso agravar conflitos e vitimar pessoas para conseguir a liberação efetiva de dinheiro para cobrir indenizações e concluir demarcações”, alerta.
PEC 215
Também hoje, o novo relatório da PEC 215 foi apresentado na Comissão Especial da Câmara que analisa a proposta. Por um acordo fechado entre ruralistas e a Procuradoria Geral da República (PGR), o projeto não foi votado e será realizada uma reunião, nos próximos dias, para discutir alternativas a ele. Além de ruralistas e procuradores, participarão parlamentares ambientalistas, representantes do governo e do Supremo Tribunal Federal (STF).
O presidente da comissão, Nílson Leitão (PSDB-MT), voltou a dizer que os ruralistas insistem na aprovação da PEC 215 porque o governo não apresenta uma alternativa. Ele admitiu que marcou a votação do projeto para esta quarta, de forma imprevista, para pressionar o Planalto a apresentar essa alternativa diante do acirramento dos conflitos entre fazendeiros e indígenas no Mato Grosso do Sul.
Leitão garantiu que irá aguardar o resultado da reunião com a PGR. Além disso, assegurou que vai acatar um pedido de “vistas” ao parecer, o que deve adiar por mais alguns dias a votação da PEC 215. De acordo com o deputado, no entanto, o projeto seguirá como uma carta na manga dos ruralistas.
O novo parecer apresentado pelo deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) é ainda pior para populações indígenas e tradicionais do que o apresentado no ano passado. A nova versão impõe aos quilombolas o chamado “marco temporal”, pelo qual eles só teriam direito à terra se estivessem a ocupando em outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. O problema é que muitas populações foram expulsas de suas áreas tradicionais e perdem o direito ao seu território por causa disso.
Serraglio também pretende driblar acusações de inconstitucionalidade contra a PEC 215 ao manter a prerrogativa do governo federal de “delimitar” as Terras Indígenas – mas por meio de projeto de lei que terá de tramitar obrigatoriamente pelo Congresso. Na prática, as demarcações terão de passar pelo crivo político dos parlamentares, o que deverá paralisá-las definitivamente. O novo relatório também pretende trazer para a Comissão Especial a discussão sobre as indenizações pela terra nua para propriedades incidentes sobre Terras Indígenas.
Em seu texto, Serraglio manteve o “marco temporal” para as demarcações de Terras Indígenas, independente da fase administrativa da demarcação ou se o processo estiver na Justiça. Também assegura que as TIs possam abrigar atividades agropecuárias, hidrelétricas e estradas, entre outros grandes empreendimentos com grandes impactos socioambientais negativos. Também impede a ampliação de áreas já demarcadas.
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