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O ISA condenou, ontem (10), numa audiência no Senado, a possibilidade de revisão do Código Florestal por meio de emendas à Medida Provisória (MP) 867/2018, que trata exclusivamente da prorrogação, até 31 de dezembro de 2019, do prazo para adesão aos Programas de Regularização Ambiental (PRAs).
Das 35 emendas apresentadas, ao menos 30 tratam de questões não relacionadas diretamente ao assunto - os chamados “jabutis” ou “contrabandos legislativos”. Há propostas até de redução drástica da Reserva Legal (RL) em quatro biomas, concessão de novas anistias a multas ambientais e permissão para implantação de aterros sanitários em Áreas de Preservação Permanente (APPs).
O PRA foi criado pelo novo Código Florestal (Lei 12.651/2012) e prevê um conjunto de ações que todo produtor rural deve realizar para regularizar ambientalmente sua propriedade, como a recuperação de áreas desmatadas ilegalmente. Os programas devem ser regulados e administrados pelos Estados.
Para entrar no PRA, o proprietário deve fazer seu Cadastro Ambiental Rural (CAR), também previsto na nova lei. O CAR é um registro eletrônico autodeclaratório que reúne dados da situação ambiental de cada propriedade para permitir o monitoramento e combate ao desmatamento. De acordo com a lei, o ingresso no CAR e no PRA dá ao produtor rural uma série de benefícios, como a suspensão de multas ambientais.
Demanda da bancada ruralista, o prazo para ingressar no CAR (e no PRA) já foi postergado cinco vezes. O primeiro prazo era de um ano após a promulgação do novo código.
“Não é porque uma emenda trate do Código Florestal que ela pode versar sobre qualquer tema da lei. A emenda deve guardar pertinência temática com o objeto central e original da MP”, afirmou o advogado do ISA Maurício Guetta, na audiência pública na comissão mista que analisa a MP. “Num rito de tramitação tão rápido como o das MPs, é impossível discutir mudanças tão profundas como algumas que sendo propostas”, ressaltou. Guetta sugeriu a rejeição das 30 emendas.
Ele lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) já proibiu os “jabutis” e que os presidentes da Câmara e do Senado têm usado de sua prerrogativa de rejeitá-los unilateralmente. Guetta mencionou que a tentativa de incluir temas estranhos nas MPs têm inviabilizado sua aprovação, como no caso da medida editada pelo governo Temer que visava alterar regras do setor elétrico (veja vídeo abaixo).
O relator da MP 867, o deputado ruralista Sérgio Sousa (MDB-PR), informou que pretende apresentar seu parecer no dia 23/4. Ele tende a manter a prorrogação do prazo para ingresso no PRA.
O parlamentar não quis comentar sua posição sobre os “jabutis”, mas sinalizou que pode incorporar alterações de outros pontos da lei. “A gente está estudando uma forma em que não se privilegie aqueles que fazem suas ações à margem da lei em detrimento de uma sanção tácita para aqueles que agiram de forma legal”, disse. Sousa mencionou, genericamente, que o CAR vem causando dificuldades aos produtores rurais e afirmou que a maioria dos problemas envolvendo o cadastro, como o registro de vegetação inexistente, não é causada por má-fé.
Em fevereiro de 2018, o STF julgou as quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) apresentadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o Código Florestal. A corte referendou a maioria dos pontos questionados.
Pesquisadores e representantes de outras organizações da sociedade civil, como o Observatório do Código Florestal, também participaram da audiência. Entre eles, foi consenso a necessidade de rejeição dos “jabutis”, assim como que uma nova prorrogação atrasa a regularização ambiental no país, cria insegurança jurídica e passa a mensagem de que cumprir a lei não compensa. O conjunto de anistias concedidas pela nova lei é considerado um dos motivos para a retomada do desmatamento na Amazônia, a partir de 2012.
“Tem se utilizado a prorrogação e o atraso no cadastro como uma tática para que a agricultura continue tendo os benefícios que tem, como financiamentos e subsídios, sem que a função social da terra seja atendida”, avaliou o deputado Nilto Tatto (PT-SP). Ele aposta que uma nova prorrogação pode abrir caminho a outras.
A RL é o percentual de vegetação natural que cada propriedade rural deve conservar. As APPs correspondem à parcela da vegetação nativa que também deve ser preservada em encostas, às margens de nascentes e corpos de água,entre outros espaços ambientalmente sensíveis.