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Reportagem: Isadora Costa
Edição: Oswaldo Braga de Souza
Lideranças indígenas de Roraima condenaram, na quarta (7), o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 28/2019. A proposta prevê a exclusão da sede do município de Pacaraima (RR), na fronteira com a Venezuela, da Terra Indígena São Marcos e abre caminho para a fragmentação de territórios indígenas em todo o país.
Representantes da Associação dos Povos Indígenas da Terra de São Marcos (APITSM) e do Conselho Indígena de Roraima (CIR) manifestaram-se contra o projeto numa audiência da Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e Amazônia (Cindra) da Câmara (assista abaixo). O Ministério Público Federal (MPF) em Roraima posicionou-se no mesmo sentido. A Fundação Nacional do Índio (Funai) foi convidada a participar do evento, mas não enviou representantes.
O projeto passou pelo Senado em 2019, está na pauta do plenário da Câmara e pode ser votado na semana que vem. Ele seria apreciado na semana passada, mas uma articulação de deputados da oposição, como Joenia Wapichana (Rede-RR), permitiu o adiamento da sua análise até a realização da audiência na Cindra.
“Uma das nossas exigências é que seja feita uma consulta. Mas que seja feita uma consulta livre, que não seja pressionada pelos parlamentares, que não seja em período eleitoral e que não tenha influência [indevida] dentro das comunidades. Nosso posicionamento é contrário ao PDL 28”, disse Marcello Pereira, coordenador-geral da APITSM. Ele reforçou que a proposta causa insegurança jurídica para todos os povos indígenas do país.
Na audiência, Pereira falou dos impactos socioambientais de Pacaraima sobre as comunidades indígenas. De acordo com ele, a sede do município é um foco de ocupação desordenada e desmatamento. O lixão da cidade também estaria poluindo as nascentes dos rios que abastecem a população com água potável. O líder indígena encaminhou um ofício com as informações e a posição de 334 comunidades indígenas de Roraima contra o PDL ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e ao relator da matéria, Marcelo Ramos (PL-AM)
“Queremos pedir que seja retirada de pauta essa votação porque, se isso for votado e aprovado, será uma tragédia anunciada para os povos indígenas. Isso busca realmente retaliar os direitos constitucionais dos territórios indígenas. O que nós queremos é que se instale um procedimento de consulta, livre e prévia e informada”, reforçou Edinho Batista, coordenador-geral do CIR.
A consulta às comunidades indígenas está prevista na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e deve ser feita sobre qualquer empreendimento, obra, atividade, medida administrativa ou legislativa que afete seus territórios. A norma foi referendada pelo Brasil e incorporada à legislação nacional.
Joenia Wapichana lembrou que o município de Pacaraima foi criado em 1995, após a conclusão da demarcação da TI São Marcos, em 1991. Para ela e o movimento indígena, a medida foi uma forma de políticos locais tentarem deslegitimar a demarcação da área.
“O decreto [legislativo] não é apropriado para fazer modificações em demarcações de Terras Indígenas. É totalmente inconstitucional. A demarcação é um ato administrativo, e isso pode criar um precedente muito grande no Congresso Nacional, uma vez que tenta modificar um decreto de homologação de uma Terra Indígena já consolidada há quase 30 anos”, frisou Joenia.
O procurador do MPF em Roraima Alisson Marugal também julga que o PDL é inconstitucional. Para ele, não cabe ao Congresso, por meio de um projeto desse tipo, suspender uma demarcação de TI, considerando que ela é um ato administrativo concreto de responsabilidade do Poder Executivo. “Do ponto de vista político, é um precedente perigoso. Pode ser que outros atos de demarcação sejam revistos”, ressaltou.
Marugal comentou que a aprovação do PDL não vai encerrar a discussão sobre o assunto e que, pela proposta ser inconstitucional, deverá avaliar a proposição de uma ação judicial em defesa do procedimento demarcatório da TI São Marcos.
O autor do PDL, o senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR), e o relator do projeto no Senado, Telmário Mota (Pros-RR), argumentam que o decreto de homologação da TI dificulta investimentos e obras de infraestrutura porque impediria a regularização de moradias, a emissão de licenças para a construção de postos de saúde, escolas e outros estabelecimentos.
Em entrevista ao ISA em 2019, o então coordenador-geral da APITSM, Paulo Pereira da Silva, afirmou que as comunidades indígenas aceitam discutir a situação para tentar resolver os problemas apontados pelos parlamentares, mas não concordam com a mudança na demarcação (saiba mais).
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