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Por Giovanna Costanti
Os Piripkura correm o risco de serem exterminados. A Terra Indígena (TI) Piripkura, onde vivem Baita e Tamandua, sobreviventes de massacres de invasores, apresentou em agosto uma área incendiada de 3,4 mil hectares, o equivalente a 4,2 mil campos de futebol, de acordo com o painel Alertas+ e o Global Fire Emissions Database.
O boletim Sirad Isolados, monitoramento independente do Instituto Socioambiental (ISA), detectou que a TI Piripkura, no noroeste do Mato Grosso, acumulou um total de 2.320 hectares desmatados entre agosto 2020 e julho de 2021, o maior já registrado. Mais de 1,7 milhão de árvores maduras foram derrubadas. Agora, a área sofre com a temporada de incêndios, que acontece após as primeiras chuvas na região
Neste estágio, invasores aproveitam o clima seco para “limpar” a área e transformá-la em pasto. Segundo Ricardo Pael, procurador do Ministério Público do Mato Grosso, como o território Piripkura ainda não é demarcado, “está exposto a todo tipo de riscos e de degradação”. Ele acionou a Justiça Federal para exigir ações de proteção da Fundação Nacional do Índio (Funai).
De acordo com Pael, o caso preocupa por se tratar de um território de indígenas em isolamento voluntário. “Essa população tem menos contato com a sociedade no entorno e, com isso, menos recursos para noticiar às autoridades competentes violações aos seus direitos”, explicou.
A TI Piripkura é protegida desde 2008 por um dispositivo chamado Portaria de Restrição de Uso, que resguarda territórios que ainda não foram reconhecidos e demarcados, restringindo a entrada e o uso em razão da presença de indígenas em isolamento.
A portaria tem um período de validade que, normalmente, vai de dois a três anos. Entretanto, a última da Piripkura foi renovada por apenas um semestre. “No período de seis meses você não consegue implementar medidas de fiscalização e uma operação da polícia para a retirada desses invasores. Conhecendo a morosidade dos órgãos federais de fiscalização, eles não conseguirão efetuar a retirada desses invasores", pontuou Antonio Oviedo, coordenador do Programa de Monitoramento de Áreas Protegidas do ISA.
Segundo Oviedo, em julho, a pedido da Justiça Federal, a Funai fez uma operação de retirada dos invasores, mas que durou apenas três dias. Na época, o monitoramento detectou o início de um desmatamento de 500 hectares às margens da terra indígena. Ao fim da ação, madeireiros e grileiros voltaram ao interior da TI e seguiram com suas atividades criminosas.
“Existe uma grande área que está sendo destruída bem no coração da terra indígena, onde a cada mês o sistema independente de monitoramento do ISA detecta entre 300 a 500 hectares sendo degradados. Essa é uma taxa extremamente alta, que a gente não verifica em nenhuma outra TI na região”, explica Oviedo.
Segundo Elias Bigio, ex-coordenador-geral de Índios Isolados e de Recente Contato da Funai (2006-2011), os Piripkura demonstram estar fugindo das ameaças recentes. “Foi constatado que esses grileiros chegaram até a área onde os Piripkura estão refugiados, fugindo dos invasores, que são muito violentos”, revelou.
Para ele, os indígenas estão sendo colocados em uma situação de vulnerabilidade pela própria Funai. “Os direitos indígenas, em particular do povo Piripkura, não são a razão para a publicação de uma portaria com prazo tão pequeno. Os invasores podem estar acreditando que a TI Piripkura não será demarcada na sua integralidade”, afirmou.
Alerta: isolados de quatro terras indígenas sofrem grave risco de extermínio
A expectativa de que a portaria não será renovada alimentou um “boom” de degradação do território e de pedidos de lavra minerária — que ainda não podem ser executados, mas ficam registrados na Agência Nacional de Mineração, gerando ainda mais especulações.
De acordo com os dados dos sistemas estadual e federal de Cadastros Ambientais Rurais (CARs), o território Piripkura possui 131.870 hectares de imóveis ilegais cadastrados em sobreposição, o que corresponde a 54% de seu território. Isso significa que a ocupação irregular acontece de forma deliberada e sem nenhuma fiscalização do Estado.
Além da situação crítica da TI Piripkura, o monitoramento mensal do ISA também identificou degradação em outras TIs com presença de isolados.
Na TI Araribóia, localizada no Maranhão, foi detectado um aumento de 78% no desmatamento (84,3 hectares) em relação ao mesmo período do ano passado. Os invasores abriram ramais, que escoam a madeira retirada ilegalmente para fora do território. Além disso, de acordo com os dados do sensor MODIS, enquanto em agosto de 2020 a TI praticamente não apresentou queimadas, com apenas dois focos de queimadas, em 2021 a realidade mudou bruscamente, com um aumento de quase 100%.
Foram identificados 24,5 hectares desmatados no interior da TI Vale do Javari, no Amazonas. O desmatamento fica ao sul da TI, na fronteira com a cidade de Ipixuna, por onde entram madeireiros ilegais.
A TI Uru-Eu-Wau-Wau, em Rondônia, tem liderado o ranking de invasões nos últimos meses, com 212,4 hectares desmatados até agosto, sendo que os últimos dois meses concentram 76% desse total. O fogo também destrói outras partes do território.
Anexo | Tamanho |
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isa_si_ago_e03_mobile.pdf | 8.58 MB |
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