Essa é a versão antiga do site do ISA que ficou no ar até março de 2022. As informações institucionais aqui contidas podem estar desatualizadas. Acesse https://www.socioambiental.org para a versão atual.
Imagens de satélite indicam um cenário sem precedentes de invasões e roubo de madeira na Terra Indígena Araribóia, território onde o guardião da floresta Paulo Paulino Guajajara foi assassinado brutalmente na última sexta-feira (1/11).
Análise do Instituto Socioambiental (ISA) encontrou ao menos 105 km de estradas clandestinas abertas só em outubro de 2019, os chamados de ramais madeireiros. Além dos ramais, foram detectados 258 alertas de exploração ilegal de madeira. O ISA realiza um monitoramento mensal das ameaças no território. Esse material tem subsidiado ações de campo dos guardiões da floresta, grupo de proteção territorial indígena do qual Paulo Guajajara fazia parte.
Desde que esse monitoramento começou, em setembro de 2018, foram detectados 4.863 alertas e 1.248,5 quilômetros de ramais.
Na sexta-feira, Paulo Paulino Guajajara e Laércio Guajajara foram surpreendidos por uma emboscada enquanto caçavam dentro da TI, na região da Lagoa Comprida. Laércio ficou ferido, mas conseguiu escapar. Paulo foi atingido no rosto e morreu na hora. Depois de se esconder na mata, Laércio correu por 10 km até encontrar ajuda, segundo informações da Agência Pública. Os dois faziam parte dos guardiões da floresta.
O fato do crime ter ocorrido dentro da Terra Indígena é ainda mais grave porque viola o direito dos indígenas ao usufruto exclusivo de seu território, previsto no inciso 2º do Artigo 231 da Constituição.
O crime teve grande repercussão no Brasil e no exterior, com matérias nos principais veículos internacionais, como The Guardian, New York Times e muitos outros. A Coordenação Regional da Fundação Nacional do Índio (Funai) do Maranhão se manifestou pedindo apoio da Força Nacional na região. Por sua vez, o governo do Maranhão editou um decreto prevendo a atuação emergencial do estado em caso de ameaça de violação de direitos em terras indígenas, quando solicitado pela Fundação Nacional do Índio (Funai), Ibama, Defensoria Pública da União (DPU), Polícia Federal, Ministério Público Federal (MPF) ou a Comissão Estadual de Políticas Públicas para os Povos Indígenas do Maranhão (Coepi/MA).
Enquanto isso, os guardiões continuam ameaçados. Cerca de 26,4% dos ramais encontrados na análise do ISA se encontram na Lagoa Comprida, região onde o crime aconteceu.
A situação de invasão, roubo de madeira e violência na Araribóia é antiga e denunciada exaustivamente pelos indígenas há anos. Mas, desde a eleição do presidente Jair Bolsonaro (PSL), ocorreu uma explosão no número de alertas, de ramais e de denúncias in loco feitas pelos próprios guardiões.
Nesse cenário, além da ameaça concreta aos guardiões e aos indígenas guajajara, a vida dos grupos de isolados Awá Guajá também está em jogo. São grupos que tiveram pouco ou nenhum contato com outros povos indígenas e não indígenas, e tiram da floresta tudo que precisam para sobreviver: caça, água, frutos, mel etc. Conforme a mata escasseia, seu modo de vida fica cada vez mais ameaçado.
Em setembro de 2018, cineastas guajajara captaram cenas exclusivas de seus parentes isolados na mata. A partir delas, realizaram o filme “Ka’a azar Ukize Wà: Os Donos da Floresta em Perigo”. Respeitando a vontade dos Awá Guajá de não serem contatados, o filme é um alerta para a frágil situação desses indígenas na Terra Indígena Araribóia. Relatos dos guardiões afirmam que na região onde as cenas foram gravadas e que era uma zona de acampamento dos isolados foram identificados ramais madeireiros, o que torna mais urgente a proteção desse território e dos povos que vivem ali.