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As comunidades quilombolas do Vale do Ribeira (SP) assistiram, em setembro de 2018, ao reconhecimento do Sistema Agrícola Tradicional Quilombola como patrimônio do Brasil pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
Agora, seis delas têm um motivo extra para celebrar: a produção de suas roças, fruto do sistema agrícola tradicional, foi reconhecida pelo Ministério da Agricultura como orgânica.
Ao todo, 46 agricultoras e agricultores dos quilombos André Lopes, Nhunguara, Piririca, Porto Velho, São Pedro e Sapatu já têm o certificado de Organização de Controle Social (OCS), e podem comercializar como orgânicos uma extensa lista de mais de 100 produtos de suas roças, de feijão a taioba.
Para baixar o livro Inventário Cultural de Quilombos do Vale do Ribeira, clique aqui.
O reconhecimento dá fôlego aos esforços de jovens quilombolas em transmitir o conhecimento tradicional para as próximas gerações e, ao mesmo tempo, comercializar a produção por meio a cooperativa local, a Cooperquivale (Cooperativa dos Agricultores Quilombolas do Vale do Ribeira).
"Com esse produto bom, a gente conseguiu acesso ao mercado pela cooperativa", disse o jovem agricultor, produtor familiar e quilombola Adan Rodrigo Trolesi Pereira, 30 anos, do quilombo Sapatu.
"Eu defendo a roça tradicional e o sistema agrícola quilombola porque é uma agricultura de qualidade. Meu filho de 3 anos anda comigo pelas roças e come o que quiser, porque a gente tem certeza que ele não vai se intoxicar com nada", afirmou.
Saiba mais sobre as roças de coivara no vídeo abaixo:
Além das seis comunidades já certificadas, outras cinco estão em processo de reconhecimento, o que deve beneficiar outras 70 agricultoras e agricultores.
As roças tradicionais dos quilombolas poderão, por exemplo, alimentar alunos da educação básica por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), em que 30% do valor repassado pelo governo federal deve ser investido na compra direta de produtos da agricultura familiar, e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que prevê a compra da produção de comunidades tradicionais.
"Com o reconhecimento da qualidade orgânica, são criadas novas oportunidade de comercialização para as comunidades", afirmou Mauricio Biesek, técnico do Instituto Socioambiental. "Isso agrega valor e dá mais visibilidade aos produtos da sociobiodiversidade."
Para Heloísa França, 28 anos, do quilombo São Pedro, a comercialização da produção é uma maneira de partilhar a riqueza das roças quilombolas. Ela, que faz parte da OCS Sementes do Campo, celebra a força do território e a oportunidade de levar os filhos às roças.
"Com base no território, a gente tem nossa produção, que é onde fazemos nossas roças de coivara, e dessa roça a gente gera nossa cultura. Tira o arroz, o feijão, a mandioca, a batata para a mesa da nossa casa e tira a semente para plantar, dá um pouquinho pro vizinho quando falta", disse a jovem agricultora.
"Sempre procuro levar meus filhos – um de 7 anos, outra de 3 – a me ajudar nas atividades. Tem um pezinho de couve que eles plantam, tem a hortelã que eles plantam, tem a cebola que eles plantam. Eles vão crescer, ver e se alimentar daquele produto. Vão ver como é lindo, como é interessante esse processo", afirmou.
O esforço das comunidades pela valorização de suas roças, no entanto, tem esbarrado na burocracia do governo de São Paulo, que precisa emitir autorizações de plantio no tempo correto e respeitar o modo de vida tradicional dos quilombolas – o que não tem acontecido.
O atraso na emissão das licenças gerou a campanha #TáNaHoradaRoça, com uma petição que já passa das 7 mil assinaturas. Faça a sua parte e assine a petição!