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Operação resgata 13 trabalhadores em condições análogas à escravidão em Barcelos (AM)

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Segundo estimativas do Ministério Público, cerca de mil trabalhadores estariam submetidos às mesmas condições na região. Fiscalização deve continuar
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Uma operação do Ministério Público Federal no Amazonas (MPF-AM) e do Ministério Público do Trabalho (MPT) resgatou, nesta semana, 13 pessoas em condições análogas à da escravidão em Barcelos (AM), cerca de 400 quilômetros a noroeste de Manaus. Elas estavam trabalhando na extração da piaçava, fibra utilizada na produção de vassouras. A operação envolveu também o Ministério do Trabalho (MTE) e o apoio do Exército e da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

Segundo os procuradores responsáveis, os trabalhadores estavam submetidos a um ciclo de servidão por endividamento, com jornadas de trabalho excessivas e alojados em acampamentos improvisados no meio da floresta sem qualquer segurança ou condições de higiene.

A estimativa feita com base em depoimentos colhidos na operação, iniciada em abril, indica que cerca de mil trabalhadores estariam submetidos às mesmas condições na região. As apurações e fiscalizações na cadeia produtiva da piaçava em Barcelos irão continuar, informaram o MPF e MPT, na busca de mais trabalhadores.

Antes mesmo de começar a atividade, eles eram impelidos a contrair dívidas com o empregador, por meio de intermediários, com adiantamentos em dinheiro, mercadorias e insumos, como combustível e alimentos, com valores superfaturados em até 140%, informou o procurador do Trabalho Renan Bernardi Kalil.

“Com uma dívida a pagar antes mesmo da prestação do trabalho, os 'piaçabeiros', como se autodenominam os trabalhadores do ramo, precisam passar longos meses nos locais de extração da fibra para conseguir pagar a dívida e tentar obter algum saldo, que girava em torno de R$ 200 por mês”, explicou Kalil. De acordo com ele, nenhum dos 13 trabalhadores resgatados conseguiu obter saldo correspondente ao valor de um salário mínimo mensal.

Em função de descontos de até 20% aplicados sobre o peso da piaçava extraída, tanto no ato da entrega feita pelos trabalhadores como no repasse dos intermediários ao empregador, muitas vezes sequer as dívidas eram quitadas e o piaçabeiro era obrigado a retornar para os locais de extração sem receber nada pelo trabalho.

“Em vez disso, contraía nova dívida, criando assim um círculo vicioso que mantém o trabalhador submetido à servidão por dívida, o que também configura trabalho em condições análogas às de escravo segundo a legislação”, acrescentou Kalil. Um dos relatos ouvidos confirma que também os intermediários mantêm-se vinculados ao empregador por meio de dívidas que chegam a R$ 30 mil.

As irregularidades já vinham sendo investigadas em inquéritos civis conduzidos pelo MPF e pelo MPT desde dezembro, com base em denúncias e depoimentos. O MPF aguarda o recebimento do relatório do MTE para analisar as informações e adotar as medidas judiciais cabíveis na esfera criminal.

Péssimas condições de trabalho

Lázaro da Silva Barbosa, de 61 anos, foi resgatado. Ele relatou que trabalha há 45 anos na extração da piaçava e estava instalado, desde novembro, em uma das duas localidades que receberam a fiscalização, distantes mais de 12 horas de barco da sede de Barcelos.

Barbosa contou detalhes das péssimas condições a que são submetidos os trabalhadores do ramo. Ele revelou que já teve de extrair piaçava após ser picado por um escorpião, sem nenhuma medicação. “Quando sou picado trabalho do mesmo jeito. A gente trabalha doído mas faz esforço para terminar o trabalho, para pagar o que a gente deve. Se eu for embora no dia que eu fui picado, é um dia de trabalho perdido, por isso que a gente faz esse esforço”, contou.

Durante entrevista concedida à imprensa na quarta, os procuradores destacaram que não há objeção à extração da piaçava, que hoje sustenta a economia de Barcelos, e sim à forma ilegal das relações de trabalho na cadeia produtiva. “O que sustentamos é a necessidade de as relações e as discussões em torno da regularização da cadeia passarem pela obediência à legislação trabalhista e criminal”, explicou o procurador da República Júlio Araújo.

Ele informa que uma reunião deverá ser realizada, ainda em maio, sobre a regularização da cadeia da piaçava para promover o diálogo entre o governo do Estado e os órgãos e instituições interessados.

“Consideramos muito importante que as políticas públicas sejam promovidas, mas constatamos que esse processo tem sido muito lento, pois envolve muitos órgãos e se adia a mudança dessa realidade em função das discussões e dos interesses envolvidos. A partir da operação e das medidas cíveis, criminais e trabalhistas que adotaremos, nosso papel é cobrar que as políticas sejam efetivamente desenvolvidas e coloquem os trabalhadores piaçabeiros como protagonistas, promovendo também a conscientização da população local sobre a ilegalidade desse tipo de prática”, finalizou Araújo.

Conjunto de medidas

"A chamada ‘escravização por dívida’ é um tipo de imobilização de mão de obra tradicional na Amazônia, desde o boom da borracha no início do século XX. A situação de Barcelos tem semelhança com outros casos espalhados pelo país, inclusive nas grandes cidades”, lembra Beto Ricardo, coordenador do Programa Rio Negro do ISA. “Para superar o problema e produzir resultados positivos duradouros, não bastam ações pontuais de fiscalização, mas um conjunto de medidas de inclusão e reparação que beneficiem os trabalhadores, quitando as dívidas com os patrões e dando condições para que eles não precisem renová-las e possam sobreviver com dignidade", analisa Ricardo.

Ele afirma que é fundamental que sejam tomadas medidas efetivas pelo Poder Público para regularizar as relações de trabalho e viabilizar a atividade extrativista. Ricardo acrescenta que as áreas extrativistas são de uso e ocupação tradicional dessa população e que a falta de regularização fundiária no Médio Rio Negro, especialmente o reconhecimento dos direitos territoriais indígenas e das populações tradicionais, colabora para situações de exploração como essa.

Com informações da assessoria do MPF-AM
ISA
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