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Os produtos das roças tradicionais do Quilombo Porto Velho, no Vale do Ribeira (SP), foram reconhecidos pelo Ministério da Agricultura como orgânicos. A comunidade cadastrou-se como Organização de Controle Social (OCS), recebeu seus certificados e pode acessar programas governamentais de aquisição de alimentos – além de dizer com orgulho, em feiras locais, que tudo o que produz é definitivamente livre de agrotóxicos.
“A gente sempre ouviu falar dos alimentos orgânicos e pensava: a gente faz orgânico há muito tempo! Mas não tínhamos nossos produtos reconhecidos. Agora, vou poder colocar o documento dizendo que meus produtos são orgânicos na barraquinha da feira”, frisou Horacina Rosa de Oliveira.
As roças quilombolas fazem parte do Sistema Agrícola Tradicional Quilombola, em processo de tombamento como patrimônio imaterial brasileiro no Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). Com o reconhecimento de produção orgânica, cerca de 50 tipos de frutas, legumes e verduras do quilombo Porto Velho receberam seu devido valor.
Para baixar o livro Inventário Cultural de Quilombos do Vale do Ribeira, clique aqui.
De cará a gengibre, de graviola a berinjela, sem esquecer do milho, do feijão e do arroz, as roças tradicionais poderão alimentar alunos da educação básica por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), em que 30% do valor repassado pelo governo federal deve ser investido na compra direta de produtos da agricultura familiar, e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que prevê a compra da produção de comunidades tradicionais.
"O reconhecimento do jeito que produzimos valoriza nosso conhecimento e cria oportunidade de renda. Aprendi com o meu pai o que faço hoje. Teve épocas que usei agrotóxicos, mas percebi que estava me envenenando, envenenando minha família, o ambiente e as pessoas que consumiam os alimentos manejados por nós”, disse Vandir dos Santos, coordenador da Associação de Remanescentes de Quilombo do bairro Porto Velho.
Além do Quilombo Porto Velho, outras nove comunidades quilombolas estão se mobilizando para o reconhecimento orgânico dos alimentos do Sistema Agrícola Tradicional Quilombola.
Até o momento, a rapadura, a taiada e a farinha de mandioca, produtos artesanais processados do Quilombo Porto Velho, assim como o mel de abelhas, não foram reconhecidos por sua qualidade orgânica.
O entrave é o conjunto de leis federais e estaduais que não contemplam o modo de vida das comunidades tradicionais do Vale do Ribeira. As estruturas utilizadas para manipular os alimentos são mais rudimentares e há grande dificuldade em obter licenças sanitárias.
“A farinha de mandioca, a rapadura e a taiada são produzidos com alimentos orgânicos, mas nossas estruturas de processamento são simples e não aceitas pela vigilância sanitária”, lamenta Osvaldo dos Santos, do Quilombo Porto Velho.
O mel de abelhas é o principal produto de origem animal do quilombo. Com grande potencial produtivo, sempre em equilíbrio com o maior remanescente de Mata Atlântica do Estado de São Paulo, ele depende de uma penosa adequação da estrutura de processamento existente na comunidade para obter as licenças sanitárias necessárias e o reconhecimento como produto orgânico.
“As legislações sanitárias compartilhadas entres as diferentes esferas governamentais na maioria das vezes não dialoga com a realidade local vivida pelos agricultores. Especialmente se considerarmos a estrutura física de processamento, pois requer alto investimento financeiro, situação que afasta a regularização dos produtos artesanais das comunidades, deixando-os na informalidade”, afirmou Mauricio Fabiano Biesek, assessor técnico do ISA.
A agora Organização de Controle Social Quilombo Porto Velho tem potencial para comercializar mais de 50 produtos orgânicos (grãos, frutos, frutas, raízes, tubérculos, folhosas, medicinais) das mais diversas espécies. Para saber mais a respeito dos alimentos produzidos pela OCS, entre em contato por e-mail: isaribeira@socioambiental.org ou pelos telefones (13) 3871 1545 e (13) 3871 1697.
O Sistema Agrícola Tradicional Quilombola, desenvolvido no Vale do Ribeira há mais de 300 anos, preconiza o cultivo de alimentos na Mata Atlântica dispensando o uso de adubos sintéticos e agrotóxicos. O sistema fortalece o conhecimento dos quilombolas, passados de geração a geração, e mantém o bioma preservado. Saiba mais no documentário abaixo:
O processo de reconhecimento da qualidade orgânica dos alimentos do Sistema Agrícola Tradicional Quilombola é apoiado pelo Instituto Socioambiental e pela União Europeia.