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Levantamento da Associação das Comunidades Quilombolas do Rio de Janeiro (Acquilerj) com a Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro mostra que 36 quilombolas morreram em decorrência da Covid-19 no Estado.
A nova contagem, realizada na última sexta-feira (26/06), coloca o Rio de Janeiro como o Estado em que mais quilombolas morreram por causa da pandemia.
O quilombo mais atingido, segundo o levantamento, é o Dona Bilina, localizado na capital fluminense, onde houve 26 mortes em decorrência da doença, 72% do total de óbitos no Estado. Para piorar a situação, lideranças estaduais denunciam a falta de assistência às comunidades atingidas, além da ausência de testes e de atendimento médico.
Na região Sudeste, o Espírito Santo teve cinco óbitos de quilombolas, enquanto Minas Gerais e São Paulo ainda não tiveram nenhum registro.
Acesse o portal Quilombo sem Covid-19 para acompanhar o monitoramento atualizado dos casos e óbitos: quilombosemcovid19.org
Em Armação dos Búzios, só o Quilombo da Rasa teve quatro mortes, entre elas o da liderança histórica Carivaldina Oliveira da Costa, a Tia Úia, uma das principais referências quilombolas do país e matriarca da comunidade.
Ao longo de toda a vida, ela lutou pela preservação da cultura quilombola, pela regularização dos territórios tradicionais e pelo acesso das comunidades a direitos sociais. Tia Úia tinha 78 anos. Leia a nota de pesar da Associação das Comunidades Quilombolas do Rio de Janeiro (Acquilerj).
“A gente está largados, aguardando o que podemos fazer. Os municípios estão dizendo que receberam poucos testes. As pessoas estão com sintomas em casa. A gente está no meio da confusão toda e sem assistência”, ressaltou Rejane Oliveira, liderança do quilombo Maria Joaquina, em Cabo Frio.
Oliveira, que também é sobrinha de Tia Úia, sente na pele as dificuldades enfrentadas pelos quilombolas locais frente à pandemia: ela está com suspeita de Covid-19. Depois de dias de espera e procura por atendimento nos postos médicos e unidades de saúde mais próximos de seu quilombo, só conseguiu fazer o teste na sede do município vizinho de Armação dos Búzios, onde tem parentes. Nem todos os quilombolas, no entanto, têm essa opção.
“Não existe um desenho de política pública para assistência aos quilombos do Rio em função da Covid”, confirmou Ronaldo dos Santos, liderança do Quilombo Campinho da Independência, no município de Paraty. A Acquilerj, junto com a Secretaria de Saúde estadual, montou um grupo de trabalho para monitoramento dos casos entre quilombolas, mas esta, segundo Santos, é a única iniciativa do governo estadual junto aos quilombolas na pandemia. Foi este grupo o responsável pelo levantamento divulgado no fim da semana passada.
“As próprias comunidades têm tomado as medidas de se isolar, de fazer suas próprias campanhas internas de convencimento de que é preciso tomar cuidado com o vírus”, completou.
Santos mostrou-se especialmente preocupado com a segurança alimentar. Muita gente está sem renda e, segundo o quilombola, há uma quantidade significativa de pessoas que não conseguiram acessar o auxílio emergencial de R$ 600 criado pelo governo federal. A maioria dos governos municipais, dizem os entrevistados, não têm prestado apoio para lidar com essa dificuldade. Há poucas exceções, como Cabo Frio, que entregou cestas para algumas famílias no início da pandemia.
Desde o dia 18 de junho, está na mesa do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), aguardando a apreciação presidencial, o Projeto de Lei 1142/2020. O PL, de autoria da deputada federal Professora Rosa Neide (PT/MT), visa estabelecer medidas de apoio às comunidades quilombolas e outros povos tradicionais em virtude da pandemia, além da criação de medidas de vigilância sanitária e epidemiológica para enfrentamento da Covid-19 nos territórios indígenas. O projeto já foi aprovado na Câmara e no Senado.
“As comunidades e a Acquilerj têm se mobilizado com ONGs e instituições da sociedade civil, na medida do possível, para fornecer alimentos e materiais de higiene para as comunidades”, explicou Ivone Mattos, presidente da Acquilerj e moradora do quilombo Maria Conga, no município de Magé.
Rejane Oliveira também fala da experiência da ação integrada “Resgatando a Cidadania”, que conta com a participação de comunidades quilombolas, do Ministério Público do Trabalho, da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Rio de Janeiro, da Cáritas Arquidiocesana do estado e do Sistema Nacional de Aprendizagem Rural. Uma das iniciativas atuais, no âmbito do projeto, é a confecção por costureiras de três comunidades de oito mil máscaras para serem distribuídas entre os quilombos do estado.
O ISA entrou em contato com a Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro, mas não obteve resposta até o fechamento desta reportagem.