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O intercâmbio teve como proposta aproximar a Rede com o universo da ciência para fortalecer a relação entre a teoria e a prática sobre sementes florestais. As atividades nas duas universidades abrangeram seminários e visitas em laboratórios de pesquisa, áreas experimentais de restauração ecológica e viveiros de produção de mudas florestais. A articuladora e diretora da Associação, Bruna Ferreira avalia os intercâmbios como essenciais. “A partir dessas atividades podemos entender melhor os futuros desafios, abrindo novas possibilidades de parcerias para essas caminhadas.”
O evento foi organizado pelo ISA, pela Articulação Xingu Araguaia (AXA) e pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Ecologia e Manejo de Florestas Tropicais (Gepem) da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq/USP), que se situa na cidade de Piracicaba.
Durante as visitas aos laboratórios de sementes e genética da Esalq/USP, os coletores e técnicos conversaram com pesquisadores sobre técnicas e tecnologias de análise de sementes florestais. Com a orientação dos professores, Ana Novembre e Silvio Cícero, o grupo foi apresentado à infraestrutura e rotina de um laboratório de sementes credenciado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).
De acordo com a professora e parceira da Rede, Mariney de Menezes, essa experiência vem apoiar suas atividades como coordenadora do Laboratório Qualidade de Sementes na Universidade Estadual de Mato Grosso (Unemat). “Adquiri mais conhecimento sobre a germinação, dormência e ecologia das espécies florestais que ajudará nosso trabalho de análise da qualidade das sementes da Rede”. Vale lembrar que em maio deste ano, a Unemat inaugurou, em parceria com a Rede, o Laboratório de Qualidade de Sementes, para analisar a qualidade física e fisiológica das semestes florestais comercializadas pela Rede (Saiba mais).
Nas sementes, a valorização da floresta
O seminário “Diálogos e trocas de saberes entre Rede de Sementes do Xingu e Ciências Florestais” foi uma das atividades realizadas na Esalq. Mais de 100 participantes, entre alunos, professores e técnicos da universidade discutiram os desafios da produção comunitária e familiar de sementes florestais para a restauração ecológica frente ao Novo Código Florestal Brasileiro. Os debates ainda trataram de novos caminhos para fortalecer o mercado florestal de base comunitária. Ana Patrícia, do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), por exemplo, apresentou o selo “Origens Brasil”, mecanismo de reconhecimento do valor socioambiental e cultural dos produtos florestais não madeireiros do Xingu.
Participar da experiência foi excelente para a formação da aluna de Gestão Ambiental, Julia Martins. “Tive contato com a realidade do trabalho de coleta de sementes, que me proporcionou muito aprendizado, valorizando a floresta e incentivando o meu interesse na área ambiental”.
No campus de Sorocaba na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) os coletores vivenciaram a rotina do laboratório de análise de qualidade de sementes produzidas pela Rede e visitaram o Banco Genético de Espécies Arbóreas, auxiliados por alunos da universidade.
As atividades organizadas pela Profa. Dra. Fatima Piña-Rodrigues destacaram tanto técnicas para a melhoria do controle de qualidade de sementes quanto a importância da formação de pomares de sementes para a conservação genética. “O intercâmbio permitiu que os alunos vivenciassem uma relação única de aprendizagem com a Rede, reconhecendo como o trabalho de pesquisa pode apoiá-los no cotidiano”, avaliou a professora.
Intercâmbio enriquece academia e coletores
Ao longo da semana de atividades, os coletores e técnicos assistiram a defesa de mestrado do engenheiro florestal, Danilo Urzedo, que estudou a organização e funcionamento da Rede de Sementes do Xingu. “Esse momento de intercâmbio traz uma reflexão essencial para a ciência no reconhecimento da importância da aplicabilidade dos conhecimentos”. A pesquisa de Urzedo, realizada em parceria com a Rede, avaliou os pontos fortes e os desafios da iniciativa, colaborando na elaboração de materiais didáticos para a formação técnica dos coletores.
O intercâmbio trouxe novas contribuições para sensibilizar e dar novo significado às propostas de pesquisa da comunidade acadêmica no trato da temática socioambiental nas ciências florestais. De acordo com a profa. Fátima Pinã-Rodrigues a experiência deve ser reproduzida por outras iniciativas, já que se trata de uma proposta diferenciada de reprodução de conhecimentos para as atividades educacionais, tanto da academia quanto das comunidades. Para os coletores e técnicos os ganhos estão no fortalecimento das atividades da Rede.
Cláudia Araújo, da Comissão Pastoral da Terra, CPT, que integrou o grupo, avalia que o intercâmbio de saberes entre a academia e os coletores enriquece ambos os lados, e ajuda a divulgar a necessidade de preservação das sementes, e a corajosa atuação desses guardiões da floresta. “Estar aqui representando uma iniciativa social ambiental, de diversidade cultural e econômica, que agrega agricultores, agricultoras, indígenas, pessoas urbanas, várias e diferentes instituições, a partir de um instrumento que é a semente, é uma experiência inédita no Brasil”. Claudia lembra ainda os gargalos que tem a legislação florestal para a comercialização de sementes. “Levar essa experiência para uma universidade, para professores e estudantes é muito gratificante e merece ser divulgada, multiplicada em outros locais”.
A jovem coletora de sementes, Milene Alves, que atualmente cursa o ensino médio, viu no intercâmbio uma oportunidade única de aperfeiçoar seus conhecimentos sobre sementes, e a ajudou em sua escolha profissional. “Me ajudou a escolher a Agronomia como a minha futura profissão”.
A coletora Remiru Ikpeng e o coletor Korotowi Taffarel, que integraram a comitiva do intercâmbio no interior de São Paulo, voltaram para o Parque Indígena do Xingu (PIX), onde organizaram uma reunião com as demais coletoras do Movimento das Mulheres Yarang para compartilhar a experiência. Mais de 30 coletoras da etnia Ikpeng participaram da conversa. A experiência também foi relatada na VI Reunião dos coletores da Rede de Sementes do Xingu no PIX, que promoveu o encontro de aproximadamente 70 coletores de quatro etnias das oito aldeias com grupos de coleta no Parque.
O intercâmbio foi avaliado pelos indígenas como fundamental para a compreensão dos processos da Rede de Sementes do Xingu para além da etapa de produção, como as análises laboratoriais. "Nessa viagem eu entendi o que quer dizer a qualidade da semente que nós coletores produzimos", afirmou o professor e coletor indígena Korotowi Taffarel. "Eu vi que a Rede vai poder realizar as próprias análises de qualidade no laboratório que foi inaugurado neste ano [o laboratório da Unemat], e não vai precisar mandar sementes para longe da nossa região para isto”.