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O plenário do Senado votou, no início da tarde ontem, quarta (8/4), o texto principal do Projeto de Lei da Câmara (PLC) nº 2/2015, sobre recursos genéticos e conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade e agrobiodiversidade. Foram aprovadas 12 alterações no texto vindo da Câmara, incluídas pelo relator Jorge Viana (PT-AC). Na avaliação de organizações e movimentos sociais dos povos indígenas e comunidades tradicionais, as modificações representam avanços, apesar do PL seguir com várias retrocessos para os direitos dessas populações.
Outras três emendas sobre as quais ainda não há consenso deverão ser apreciadas na semana que vem, provavelmente na terça (14/4). Depois disso, o projeto retorna à Câmara.
O novo texto exclui a possibilidade de empresas estrangeiras sem associação com instituição nacional acessarem e explorarem o patrimônio genético brasileiro ou receber amostra desse patrimônio. Além disso, órgãos públicos de defesa de povos indígenas e comunidades tradicionais deverão ser consultados, necessariamente, sobre acordos setoriais que pretendam reduzir, entre 1% e 0,1%, o percentual do lucro sobre um produto destinado à repartição de benefícios em casos de acesso a conhecimentos tradicionais não identificáveis.
Segundo a redação aprovada, no caso de produtos desenvolvidos no Brasil com base em recursos e conhecimentos de outros países, só haverá isenção de repartição de benefícios, após a vigência da lei, para produtos de alimentação e agricultura. De acordo com o texto anterior, a isenção era geral, o que feria a Convenção da Diversidade Biológica (veja entrevista com secretário executivo da CDB) (veja outras alterações incluídas no texto no box abaixo).
Uma das emendas a ser analisada na semana que vem pretende substituir o termo “populações indígenas” por “povos indígenas” no projeto; outra retira da nova lei a possibilidade de conceder isenção de repartição de benefícios para produtos desenvolvidos a partir de acesso a recurso ou conhecimento feito antes de 2000; uma terceira emenda restringe a isenção da repartição de benefícios ao modificar a redação do conceito de “produto acabado” sobre o qual deverá incidir essa repartição.
“Apesar dos avanços, fruto da busca de consenso por parte de alguns Senadores, como o relator Jorge Viana, o Projeto de Lei continua contendo violações aos direitos dos povos indígenas, comunidades tradicionais e agricultores familiares, contrariando a Constituição e Tratados Internacionais ratificados pelo Brasil”, analisa Maurício Guetta, advogado do ISA. “Como o texto inicial foi proposto para atender apenas os interesses empresarias, sem ter contado com a participação dos detentores de conhecimento tradicional, os avanços obtidos no Senado não são suficientes.”
• A inclusão do termo “agricultor familiar” na definição de “agricultor tradicional”. Melhora o texto, mas o principal problema da definição persiste, pois ela permite que qualquer pessoa que utiliza variedades ou raças tradicionais crioulas ou localmente adaptadas, inclusive grandes produtores rurais, seja passível de receber repartição de benefícios.
• O estabelecimento de um centro de assistência para os povos indígenas, comunidades tradicionais e agricultores familiares. Esse item cria uma instância de assessoramento para os detentores de conhecimento tradicional.
• A retirada da menção à Lei de Proteção de Cultivares (Lei nº 9.456/1997) e ao Sistema Nacional de Sementes e Mudas (Lei nº 10.711/2003). Essa vinculação limitaria os direitos das comunidades porque o Ministério da Agricultura definiria as variedades crioulas, sem a participação do Ministério do Desenvolvimento Agrário.
• A repartição de benefícios em caso de acesso a patrimônio genético ou a conhecimento tradicional de origem não identificável na modalidade não monetária será destinada a terras indígenas, territórios quilombolas, unidades de conservação e áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade.
• A confirmação de que a possibilidade de celebração de acordo setorial ficará restrita a casos de acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional associado de origem não identificável, excluindo a possibilidade de tal acordo para os casos de acesso a conhecimento tradicional de origem identificável.