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Reportagem: Oswaldo Braga de Souza, Letícia Leite, Victor Pires, Maria Fernanda Ribeiro, Ester Cezar e Bryan Araújo (Especial para o ISA)
Edição: Oswaldo Braga de Souza
Texto atualizado em 9/12/2020
“Mudanças na situação de candidato que alterem o resultado da votação exigem nova totalização de acordo com o art. 216 da Res. TSE 23.611/22019. Dessa forma, no momento do processamento das alterações, o sistema exclui a totalização final do município que só é efetivada novamente após o comando de uma nova totalização final feita pelo juiz eleitoral. Então, por exemplo, se em algum cargo do município o candidato estava sub judice e o processo teve algum andamento, todos os candidatos do município entram no processo de totalização novamente. Pode acontecer – e neste caso, aconteceu com alguns candidatos indígenas que foram eleitos, mas estão em municípios que estão sendo totalizados. Por isso é importante ressaltar que os dados estão em constante alteração e que é necessário informar as datas de extração para cada levantamento considerado. Sempre [deve-se] consultar o sítio do TSE, que é a fonte oficial dos resultados, e citar a data da consulta. As informações têm valor no tempo. Dúvidas específicas sobre determinado município podem ser sanadas com o TRE ou o próprio cartório eleitoral. Todos os dados das fontes oficiais do site do TSE são fidedignos. Contudo, como mencionado anteriormente, os dados são dinâmicos e dependem de decisões judiciais que podem ser determinadas a qualquer tempo.”
As eleições de 2020 foram um marco para os povos indígenas e os quilombolas do país.
No total, foram eleitos 234 indígenas: 10 prefeitos, 11 vice-prefeitos e 213 vereadores. Nesse universo, 31 eleitas são mulheres, isto é, 13% do total. As informações sobre eleitos que se autodeclararam indígenas à justiça eleitoral são do portal do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Eles somam 215 pessoas. Além disso, 19 candidatos eleitos optaram por não se autodeclarar indígenas no site do tribunal mas foram mapeados e contabilizados por organizações vinculadas à Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) por serem lideranças publicamente reconhecidas como indígenas (veja tabela).
Além disso, os quilombolas contam agora com dois prefeitos, nove vice-prefeitos e 68 vereadores. Os dados são da Coordenação Nacional de Articulação de Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq). A Justiça eleitoral permite a autoidentificação segundo a "cor/raça" branca, parda, negra, amarela e indígena, mas não faz nenhum registro ou contabilização sobre quilombolas.
Considerando apenas os números oficiais do TSE de 215 indígenas eleitos neste ano, houve um aumento de quase 17% na comparação com o pleito anterior, quando foram eleitos 184 indígenas. Os Estados com maior quantidade de eleitos, em 2020, são Amazonas (45), Paraíba (19), Pernambuco (17), Roraima (16) e Bahia (15). Os Estados com menos eleitos, apenas um cada, são: Rio Grande do Norte, Goiás, Espírito Santo e Piauí. Sergipe e Rio de Janeiro não elegeram indígenas (veja tabela abaixo).
Vale destacar que, entre esses números, houve aumento também na eleição de candidatas mulheres. Em 2020, foram eleitas 31 mulheres indígenas, um aumento de 29% em relação às eleições de 2016, quando foram eleitas 24, ainda conforme o TSE.
Das indígenas eleitas, duas assumiram a vice-prefeitura: Eliane Falcão (PT), em São Gabriel da Cachoeira (AM), e Margarida Maxacali (Avante), em Santa Elena de Minas (MG). Em Marcação (PB), a candidata Lili (DEM) foi eleita prefeita.
Chamam a atenção ainda a grande quantidade de eleitos em alguns Estados do Nordeste, como Pernambuco, Paraíba e Bahia, e o contingente menor no Mato Grosso do Sul, que abriga a segunda maior população indígena do país (veja tabela abaixo). O Amazonas, que elegeu o maior número de indígenas, é também o Estado com a maior população indígena, abrigando 20% dos 896,9 mil indígenas que viviam no país em 2010, conforme o último Censo do IBGE. Segundo a Apib, os eleitos indígenas pertencem a 73 povos e 127 municípios de todas as regiões do país.
O Brasil registrou 2.216 candidatos indígenas nas eleições de 2020, um aumento de 26% em relação ao pleito de 2016, que contou com um total de 1.715 candidaturas desse tipo. A Região Norte, que também abriga 4 em cada 10 indígenas brasileiros, foi a campeã em representatividade, com 930 candidaturas. O Nordeste veio em segundo lugar, com 512, seguido do Centro-oeste, com 366. O Sul teve 241 e o Sudeste, 167.
O grande avanço em relação às últimas eleições ocorreu nas candidaturas majoritárias, para prefeitos e vice. Nas eleições deste ano, foram 38 candidatos indígenas a prefeito e 72 candidatos a vice-prefeito. Além disso, 23 dos 26 estados brasileiros tiveram candidaturas desse tipo ao Executivo municipal. Em 2016, foram 16 Estados. Os dados também são do TSE e já haviam sido divulgados pelo Copiô, Parente, o podcast para povos indígenas e povos da floresta do ISA.
Kléber Karipuna, da coordenação da Apib, acompanhou vários candidatos indígenas durante todo o processo eleitoral. Ele considera as eleições de 2020 uma grande vitória para o movimento indígena.
“Mesmo nessa situação de pandemia, que atrapalhou bastante essas candidaturas, é um número considerado satisfatório e significante de crescimento de representatividade nos poderes, tanto legislativo como executivo e no Brasil inteiro”, avalia. De acordo com ele, a Apib pretende seguir em articulação com os candidatos eleitos e não eleitos para ampliar ainda mais a representatividade em 2022. “Agora é continuar como movimento indígena nessa luta de articulação dos povos indígenas na ocupação dos espaços e na defesa dos nossos direitos”, conclui.
“É preciso mostrar a que viemos”, disse Marcos Xucuru, eleito prefeito de Pesqueiras, a 215 km de Recife, no sertão pernambucano. Ele acompanhou o resultado em casa, com a mãe, esposa e filhos. Ao saber do resultado, foi ao encontro de lideranças que o aguardavam dançando e fazendo um ritual de agradecimento à Nossa Senhora das Montanhas na aldeia de Cimbres, na Reserva Indígena Xucuru de Cimbres.
“Meu desafio será antes de mais nada colocar a casa em ordem. Uma prefeitura que vem nas mãos de um grupo político há mais de 30 anos no nosso município. Preciso ter uma equipe muito forte para poder garantir que temos condição de implementar um modelo de governança participativa, com orçamento participativo e trazer o povo para esse novo contexto”, afirma.
A candidatura de Xucuru foi questionada judicialmente por seus adversários, mas enquanto o processo não for concluído ele tomará posse e exercerá o mandato.
Em Roraima, 11 indígenas foram eleitos vereadores em quatro municípios. O número corresponde a 7% dos 157 parlamentares eleitos nos 15 municípios do Estado.
Uiramutã, no norte do Estado, lidera o ranking, com seis vereadores indígenas eleitos, o que corresponde a maioria das vagas na Câmara de Vereadores. Normandia aparece em seguida, com dois parlamentares indígenas eleitos. Bonfim e Amajari elegeram um vereador indígena cada.
As eleições municipais de 2020 também marcaram a presença de candidatos indígenas no Poder Executivo. Tuxaua Benísio (Rede) recebeu 42,4% dos votos válidos, o equivalente a 2.066 votos no total, para a prefeitura de Uiramutã. Ele tem 52 anos, é da etnia Macuxi e agricultor. É uma importante liderança da comunidade indígena Pedra Branca, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol.
Outro candidato autodeclarado indígena eleito prefeito em Roraima, Dr. Raposo (PSD), recebeu 1.463 votos válidos, 24,3% do total, para administrar Normandia. Ele é da etnia Macuxi, tem 42 anos e é formado em Direito.
Em Bomfim, Mário Nicácio foi eleito para vice-prefeito. Ele é uma experiente liderança com trajetória destacada no movimento indígena nacional e regional, já tendo sido dirigente do Conselho Indígena de Roraima (CIR) e da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).
As candidaturas indígenas de Roraima contaram com o apoio da deputada federal Joênia Wapichana (Rede-RR), a primeira indígena eleita para o Congresso Nacional, em 2018.
O Território Indígena do Xingu (TIX), que agrega quatro Terras Indígenas no nordeste do Mato Grosso, conseguiu eleger o professor Atayawana Kanato (MDB), da etnia Yawalapit, como vereador de Gaúcha do Norte, com 135 votos, o correspondente a 3,82% dos votos válidos. Outros cinco indígenas disputaram uma vaga pelo mesmo município, mas ficaram como suplentes. Foi a segunda vez que Kanato, 41 anos, participou de uma eleição. A primeira foi em 2008, quando ficou como suplente.
No Pará, foram eleitos nove candidatos indígenas. No município de Ourilândia do Norte, Bep Korotiri Kayapó (PSC) garantiu uma vaga após receber 420 votos, o correspondente a 2,85% dos votos válidos. Foi a primeira vez que ele, aos 36 anos, disputou uma eleição. Outros três indígenas da mesma etnia também concorreram, mas não foram eleitos.
A Conaq disponibilizou as informações de eleitos em cada Estado. A organização tentou suprir a lacuna sobre esses dados por meio de monitoramento próprio feito por suas coordenações estaduais. No total, 13 Estados elegeram candidatos quilombolas. Os com a maior quantidade de eleitos foram, respectivamente, Maranhão (14), Minas Gerais (13) e Tocantins (8) (veja tabela abaixo).
O levantamento da Conaq indica um total de mais de 500 candidaturas quilombolas em 2020, sendo 350 ligadas diretamente à pauta política do movimento em todos os Estados. Portanto, o número de 79 eleitos representa cerca de 15% do total de candidaturas. Aqueles com maior participação quilombola nessas eleições em termos de candidaturas foram Pernambuco, Bahia, Maranhão e Minas Gerais, todos com mais de 40 cada. A Conaq estima um aumento no volume de candidaturas de 45% em relação às eleições de 2016 (saiba mais).
Em Cavalcante (GO), foi eleito um dos dois únicos prefeitos quilombolas do país, Vilmar Kalunga (PSB). No estado, também venceram nove vereadores. Já no Maranhão, onde as comunidades lutam há anos contra o projeto de expansão do Centro de Lançamentos de Alcântara, base de foguetes localizada no município de mesmo nome, foram eleitos 14 vereadores quilombolas, sendo 11 em Alcântara. Além disso, o vice-prefeito Nivaldo Araújo (PROS), que venceu na chapa com Padre William (PL), é quilombola.
“Essa campanha foi muito simbólica para as comunidades quilombolas. Alcântara é um dos municípios em que territórios quilombolas têm sofrido mais ataques do neoliberalismo incentivado pelo presidente. É um marco de resistência”, avalia Antônio João Mendes, do quilombo de Conceição das Crioulas, em Pernambuco, coordenador do monitoramento independente das candidaturas da Conaq.
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