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Yanomami discutem ecoturismo ao Pico da Neblina e apresentam a recém criada associação das mulheres

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A XIV Assembleia da Associação Yanomami do Rio Cauaburis e Afluentes (Ayrca), realizada em Maturacá (AM), entre 25 e 27 de julho, debateu ainda saúde, educação nas aldeias e garimpo ilegal
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Yaripo é como os Yanomami denominam o ponto mais alto do Brasil, o Pico da Neblina, termo que pode ser traduzido como 'montanha do vento e da tempestade'. Localizado na fronteira com a Venezuela, Yaripo é considerado um lugar sagrado pelos Yanomami, assim como os demais picos e montanhas da região: Kurarana (Pico 31 de março, o segundo ponto mais alto do Brasil); Opota (Serra do Tatu, também conhecida como Serra do Padre); e Peripona (Serra Baruri). As serras e montanhas são moradas dos espíritos e cada uma delas possui seus espíritos guardiães, com os quais os pajés se comunicam para proteger a comunidade e garantir o bem viver de seus moradores.

Conscientes do grande interesse dos napëpë (não índios) pelo turismo ao Pico da Neblina,localizado no município de Santa Isabel do Rio Negro (AM), os Yanomami vêm se organizando nos últimos anos para promovê-lo de maneira controlada e sustentável, com o apoio do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). São vários os benefícios esperados com o ecoturismo como a geração de renda, a vigilância do território, a valorização cultural, a sensibilização dos não índios para a defesa da floresta e dos direitos indígenas e o fortalecimento da Ayrca.

Durante a Assembleia, que contou com mais de 600 participantes, as lideranças aprovaram a continuidade da elaboração do plano de visitação para o ecoturismo. Também decidiram que querem o fim dos vários pontos de garimpo ilegal instalados no Pico da Neblina. Para isso solicitaram ao Exército que retire os garimpeiros da região. Os Yanomami informaram que os principais promotores da atividade são os garimpeiros conhecidos como Carioca, Adriano, Traíra e Brizola. O tenente Júlio César de Souza Nunes, responsável pelo 5˚ PEF (Pelotão Especial de Fronteira), localizado em Maturacá, disse que levaria o caso aos seus superiores e que o Exército deverá agir energicamente para retirar todos os garimpeiros. As lideranças Yanomami esperam que o ecoturismo sirva como alternativa de renda para os jovens Yanomami que se envolvem com o garimpo na busca de algum dinheiro.

O prazo para o início das atividades de ecoturismo não está definido, mas as lideranças frisaram que, embora não queiram fazer nada de maneira apressada, esperam concluir o plano de visitação o quanto antes. O ISA foi convidado para ser parceiro na iniciativa, junto com ICMBio e Funai.

A atividade de visitação em Terras Indígenas foi regulamentada pela Funai por meio da Instrução Normativa nº3, publicada no Diário Oficial da União em 12 de junho de2015. Ela "estabelece normas e diretrizes relativas às atividades de visitação para fins turísticos em terras indígenas" (saiba mais).

O debate em torno das questões da saúde se concentrou principalmente na reivindicação dos Yanomami de desmembrar o Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (DSEI-Yanomami) em dois: DSEI-Yanomami Roraima e DSEI-Yanomami Amazonas. Desta forma os Yanomami de Maturacá seriam atendidos em São Gabriel da Cachoeira e, quando necessário, seriam removidos para a Casai de Manaus, onde o transporte poderia ser feito de barco.

Atualmente o DSEI-Yanomami é responsável por todo o atendimento na Terra Indígena Yanomami, tendo como centro de gerência e ponto de apoio para atendimentos de maior complexidade a cidade de Boa Vista (RR). É na capital de Roraima que se encontra a sede do DSEI-Yanomami e é para a Casa do Índio de Boa Vista (Casai-BV) que os Yanomami são removidos de avião. A principal queixa é que Boa Vista é longe, distante quatro horas de voo, e que muitos têm medo de avião.

Em relação à Educação, a discussão foi centrada no baixo rendimento dos alunos, apontado por avaliação recente do MEC. De acordo com os Yanomami, este resultado se deve a falta de cursos de formação e reciclagem dos professores por parte das secretarias de educação do Estado do Amazonas e do município de São Gabriel da Cachoeira. Em Maturacá existe uma escola municipal de educação infantil e uma escola estadual de ensino fundamental.

Também há ensino médio tecnológico à distância, com quatro salas e um total aproximado de 80 alunos. Mas este modelo de ensino foi bastante criticado pelos Yanomami por ser considerado 'muito difícil'. As aulas online são ministradas por professores que estão em Brasília, através da internet instalada por meio de antenas do programa Gesac, do Ministério das Comunicações. Foi consenso entre os Yanomami que este modelo não serve para eles e que é preciso criar o ensino médio presencial nas aldeias.

Outra reivindicação é com relação a melhora na infraestrutura das escolas. O professor Anderson Brazão Goes apresentou os vários documentos enviados pela comunidade para a Secretaria de Educação de São Gabriel da Cachoeira, que até o momento não tomou nenhuma providência.

Nas discussões sobre o tema Educação, o ISA apresentou e distribuiu exemplares das publicações "Xapiri thëã oni - Palavras Escritas sobre os xamãs" e "Hwërimamotima thëpë ã oni - Manual dos remédios tradicionais yanomami" , produzidas por pesquisadores yanomami da região do Demini com o apoio do ISA e da Hutukara Associação Yanomami. O mapa binacional yanomami lançado no início deste ano também foi apresentado aos participantes da assembleia.

No último dia, foi apresentada a diretoria da recém criada Associação das Mulheres Yanomami, batizada com o nome de Kumirayoma - Mulher Perfumada. Kumi na língua yanomami é o nome da árvore também conhecida como 'preciosa' (aniba canelilla), muito encontrada na região e com a qual as mulheres fazem tintura para pintar o corpo, utilizando-se de sua casca. A 'preciosa' é uma árvore muito cheirosa tanto por suas flores como pelos frutos e casca. A Kumirayoma foi criada em 19 de junho de 2015 e tem como objetivo principal apoiar as mulheres na comercialização de seu artesanato. Sua diretoria é composta por: Floriza da Cruz Pinto (presidente), Margarida Goes (vice-presidente), Lidia dos Santos (secretária), Maria Cléia (tesoureira), Maria Ilda (conselheira), Luiza Goes (conselheira), Maria de Jesus (conselheira), Bernadete Lacerda (conselheira), Maria Gama(conselheira).

Por fim, houve a eleição da nova diretoria da Ayrca que conduzirá a associação pelos próximos dois anos. Três chapas concorreram e 410 pessoas votaram (208 mulheres e 202 homens). A diretoria eleita para um mandato de dois anos é composta por: Francisco Xavier (presidente), Marcos Figueiredo (vice-presidente), Anderson Brazão Goes (secretário), Calixto Alves (secretário adjunto), Severo Braulino (tesoureiro), Salomão (conselho fiscal), Roberval (conselho fiscal).

Também participaram da Assembleia representantes do ICMBio, Funai, Exército, Sesai, Foirn, Kurikama, Secretaria de Turismo de São Gabriel da Cachoeira, Congregação Salesiana e Rios Profundos.

Marcos Wesley
ISA
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