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Cerca de 60 pessoas participaram da oficina “Propostas de incentivos à regularização e conservação ambiental na agricultura familiar”, promovida, entre anteontem e ontem (15 e 16/5), em Brasília, pelo ISA e o ISPN (Instituto Sociedade, População e Natureza).
Estiveram presentes produtores rurais, representantes de organizações da sociedade civil e movimentos sociais de 15 estados, além de técnicos e gestores de prefeituras e órgãos federais, como os ministérios de Desenvolvimento Agrário e Desenvolvimento Social, Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente).
No evento, foram discutidas propostas para incluir prêmios por desempenho ambiental nas políticas voltadas à agricultura familiar.
Uma delas, elaborada pelo ISA a partir de conversas com gestores públicos, prevê que os agricultores que estiverem no CAR (Cadastro Ambiental Rural) e comprovem estar conservando suas APPs (áreas de preservação permanente) e RLs (reservas legais) possam vender seus produtos ao PAA (Programa de Aquisição de Alimentos) por um preço até 20% superior ao recebido pelos demais agricultores. Para sair do papel, o plano precisa ser aprovado pelo grupo gestor do PAA. Ele já foi apresentado ao colegiado e deve ser analisado por ele nos próximos meses (saiba mais).
As ideias levantadas no evento serão sistematizadas e servirão de subsídio para propostas que serão apresentadas ao governo.
"Os objetivos da oficina de discutir incentivos à regularização e conservação ambiental foram plenamente alcançados", avaliou Rodrigo Noleto, assessor do ISPN. "Acreditamos que este primeiro diálogo nessa direção, entre gestores públicos e uma importante parcela da sociedade civil que lida com empreendimentos da agricultura de base familiar em todas as regiões brasileiras, será importante para a incorporação de critérios ambientais nessas políticas, fundamentais para a organização e desenvolvimento destes empreendimentos", conclui.
“A oficina foi importante para divulgar a ideia, principalmente para as pessoas que estão na ponta, como os agricultores. Também foi fundamental a participação de pessoas de diferentes localidades e setores, para que possamos seguir nesse processo de construção das propostas de esverdeamento das políticas agrícolas”, destaca Flávia Camargo, assessora do ISA.
Flávia enfatiza que o debate deixou claro que a implantação do CAR é um dos maiores desafios para a viabilização dos incentivos econômicos à regularização e conservação ambientais. “Sem um bom monitoramento, não será possível fazer uma premiação como a que estamos propondo. A questão é saber se o CAR terá uma qualidade suficiente, com o nível de detalhamento adequado.”
Pagamento por serviços ambientais
Eliziário Toledo, assessor de Meio Ambiente da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), apontou que as políticas de crédito para a agricultura familiar não consideram a conservação uma prioridade, apesar de possuírem algumas linhas de financiamento para produção sustentável. Ele defende que o pagamento por serviços seja incorporado a essas políticas.
“Outra contribuição que esse tipo de discussão traz, além de fugir do viés produtivista da agricultura, é mostrar que o meio ambiente pode ser uma fonte de renda para os agricultores. Por que não imaginar a dimensão ambiental como um elemento para compor um conjunto de rendas para o agricultor?”, questiona Toledo. “Já existe hoje dentro do movimento sindical uma percepção de que temos de enveredar por esse caminho”, conclui.
Daltro Paiva, do (IEB) Instituto de Educação do Brasil em São Félix do Xingu (PA), afirma que a proposta de incorporar incentivos à regularização e conservação nas políticas voltadas à agricultura familiar é vantajosa em relação a outras ideias, como a da Bolsa Verde, do governo federal, por associar conservação e produção.
Ele acredita ainda que as sugestões discutidas na oficina seriam capazes de estimular a diversificação da produção agrícola. “Imagine pensar em alternativas, como essa, de pagamento por serviços ambientais, em que apareça não apenas como oportunidade de renda o gado, mas a própria floresta em pé, junto com o uso de sistemas agroflorestais, em que o agricultor possa ter tanto as frutíferas quanto as essências florestais, leguminosas que possa comercializar”, conclui.
A oficina foi apoiada pelo Tropical Forest Conservation Act (TFCA), acordo entre Brasil e Estados Unidos, e a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID, na sigla em inglês), no âmbito do consórcio Preparando o Brasil para o REDD, liderado pela The Nature Conservancy (TNC) e integrado pelo ISA, Instituto Centro de Vida (ICV), Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio) e Environmental Defense Fund (EDF).
“Espero apoio dos órgãos governamentais. Acho que eles deveriam reconhecer que somos merecedores desse apoio”, afirma o agricultor Acrísio Luís dos Reis, dono de 45 hectares em Canabrava do Norte (MT), 1,1 mil quilômetros a nordeste de Cuiabá. Ele viajou mais de 17 horas de ônibus para participar da oficina promovida pelo ISA e o ISPN.
Cerca de 80% de sua propriedade está conservada e ele está recuperando parte de sua APP com apoio da CPT (Comissão Pastoral da Terra), parceira da campanha Y Ikatu Xingu. Em seu lote, cria 30 cabeças de gado leiteiro e começou, há pouco tempo, uma experiência para cultivar mais de 40 espécies de frutas. Reis pretende adquirir uma despolpadeira e vender para o PAA. O agricultor considera fundamental uma boa assistência técnicas para os agricultores que pretendem gerar renda com a floresta em pé ou recuperar aquilo que desmataram (veja fotos abaixo).