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Associação Terra Indígena do Xingu celebra 20 anos de história

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Povo Ikpeng recebeu 500 convidados para celebrar a história da mais representativa organização política dos povos do Xingu. Veja a galeria de fotos do evento no final da reportagem
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“Palmas para o drone Indígena!”: as palavras carismáticas do presidente da Associação Terra Indígena do Xingu (Atix), Yakari Kuikuro, ecoavam pela aldeia Moygu, ao centro do Parque Indígena do Xingu (PIX), provocando risos e, de fato, muitas palmas, cada vez que a câmera acoplada ao pequeno “avião” sobrevoava os mais de 500 convidados na celebração de 20 anos da Atix.

A celebração dos 20 anos da Atix cravou o mês de setembro, entre os dias 16 e 18, na história dos povos que vivem no PIX, hoje, cerca de sete mil índios que preservam uma imponente e exuberante floresta ilhada pelo desmatamento no nordeste do Mato Grosso.

(Confira abaixo o vídeo do evento com imagens do cineasta indígena Kamikiá Kisêdje)

O drone da Associação Indígena Kisêdje (AIK) que sobrevoou a aldeia Moygu registrando corpos pintados, dançando e cantando, tem registrado também muitas queimadas e pontos de desmatamentos.

Para chegar a aldeia Moygu, saindo da cidade de Canarana, centro urbano mais próximo, são quase 15 horas de viagem, sete somente de barco. No trajeto, a reportagem do ISA passou por dois pontos intensos de fogo, o mais grave localizado próximo a aldeia Samaúma. Foram quase 20 minutos de viagem acompanhados de muita fumaça e cheiro forte de queimado. O avanço do desmatamento por causa da produção de soja no entorno do parque dificulta a cada dia o manejo e controle do fogo, pauta central dos índios xinguanos. O ISA monitora os pontos de queimada e desenvolve alternativas de manejo adaptadas às mudanças climáticas há mais de 10 anos no PIX.

“O Mato Grosso hoje é um mato careca”, diz Kumaré Txicão, coordenador regional da Funai, na abertura do evento. Foram três dias de assembleias tendo o abraço do desmatamento no entorno do parque, incêndios florestais e as mudanças climáticas como temas centrais das rodas de conversa que aconteciam durante todo o dia na casa de reuniões no centro da aldeia Moygu.

Boas novas

As preocupações com o futuro do parque são inúmeras, mas o encontro foi tempo também para celebrar. A Atix tornou-se no último mês a primeira autocertificadora indígena de produtos orgânicos do mundo. A produção e comercialização do mel dos índios do Xingu é também um dos caminhos encontrados pela associação no desafio de satisfazer as novas expectativas materiais e sociais das comunidades, envolvendo os índios em projetos que mantenham a floresta em pé. “O mel é nosso exemplo de futuro para o mundo”, diz Wareaiup Kaiabi, coordenador de alternativas econômicas da ATIX.

As novas necessidades vêm, principalmente, do crescimento populacional. “Muitos dizem que os índios estão acabando, mas eles estão aumentando”, disse a liderança Kamani Kisêdje. As aldeias da região do polo Diauarum cravaram a marca de 1.566 índios em 2015, de acordo com o Censo da Saúde Indígena. Em 2009, eram 1.180 e a expectativa é de crescimento.

As roças de mandioca, batata, amendoim, abóbora e produção de farinhas e pimentas estão em todas as 87 aldeias do Parque, mas os povos começam a ter sérias dificuldades nessas roças. Novas pragas, mudanças no clima e dificuldade de acesso a terras férteis são relatos comuns entre as antigas e novas lideranças. A casa está ficando pequena.

Presidente da Funai garante que vai brigar pela retomada de Terras Xinguanas

“Nós temos que cuidar do entorno do parque. Foram muitas as reivindicações da retomada das áreas Jatobá. Eu vou pautar e retomar a reivindicação da Terra Jatobá, é justa”, garantiu o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), que participou da celebração. A área que fica fora do PIX é reivindicada pelos Ikpeng e é parte do território original daquele povo. O presidente ouviu também críticas dos indígenas que pediam por mais servidores e auxílio na proteção do território.

Atix

Para colocar em pé uma organização com representantes de todas as 16 etnias foi preciso enfrentar burocracias do “mundo não indígena”, como estatuto, conta bancária, prestações de contas e captação de recursos para garantir assembleias, encontros e manutenção das duas sedes da organização, uma dentro do parque e outra em Canarana.

A associação é hoje liderada pela geração que desfrutou da escola nas aldeias. O PIX tem uma geração inteira formada por professores indígenas, bilíngues, com domínio da língua portuguesa, dos números e contas para assumir cada vez mais funções que o Estado deixou de desempenhar diretamente.

Inspiradas pela Constituição de 88, as associações indígenas na Amazônia deram um salto na década de 1990. No fim dos anos 2000, batiam a marca de 180 em seis estados, buscando trazer para o cotidiano os direitos que as novas letras da Carta Magna garante e o Congresso Nacional, hoje, tenta reverter.

“Nós temos que buscar ajuda lá no gelo para brigar por nosso direitos”, diz o presidente Atix, fazendo referência a Fundação Rainforest da Noruega. A organização investe há 20 anos em projetos que mantêm em pé florestas tropicais, garantindo a regulação do clima, e por sua vez, contribui para frear o derretimento das geleiras do polo norte e avanço do mar sobre as terras, inclusive a Noruega.

“A capacidade dessas organizações de continuar a mobilizar todas as aldeias do parque, as redes de apoio e a mídia permitem ao PIX manter um nível razoável de pressão sobre o governo federal, garantindo as conquistas territoriais desde a criação, em 1961”, diz André Villas-Bôas, secretário executivo do ISA.

Leia também a reportagem especial do Ministério Público Federal sobre o evento.

O evento de 20 anos da Atix foi palco de denúncias e testemunhos de culturas vivas e cheias de vigor. Confira abaixo a galeria de fotos do evento. Clique para ver legendas

Letícia Leite
ISA
Imagens: 

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