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O coordenador do Grupo de Trabalho (GT) sobre licenciamento ambiental da Câmara, deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), sinalizou que pode comprometer-se com algumas bandeiras ambientais, durante as oito audiências públicas realizadas, nas últimas duas semanas pelo colegiado. Pontos polêmicos importantes sobre o tema, no entanto, continuam sem consenso. Para organizações ligadas à defesa do meio ambiente, o novo texto-base das discussões, apresentado ontem por Kataguiri, ainda está distante do equilíbrio.
O GT foi criado, no início de junho, pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Na sequência, aprovou a série de audiências e Kataguiri fez circular um texto preliminar da proposta de Lei Geral do Licenciamento, com uma série de dispositivos, enfraquecendo controles e parâmetros de proteção ambiental ainda mais que propostas anteriores.
O colegiado tem 60 dias, prorrogáveis por mais 60 dias, para apresentar um relatório. Logo em seguida, o projeto de lei (PL) sobre o assunto já poderá ser votado no plenário.
A redação apresentada por Kim deverá sofrer alterações, mas indica as principais balizas do debate. A figura do GT visa buscar um consenso político sobre determinado tema, mas não implica obrigatoriedade no que toca ao texto final que deverá ser votado no plenário da Câmara, na forma de um PL.
Os ambientalistas reclamam dos prazos apertados e temem que suas propostas não sejam discutidas adequadamente. A figura do GT não permite debates parlamentares antes do projeto chegar ao plenário. A composição do colegiado também é bastante desfavorável aos defensores do meio ambiente: apenas dois parlamentares - Nilto Tatto (PT-SP) e Rodrigo Agostinho (PSB-SP) - militam tradicionalmente em favor da causa na Câmara.
"O texto-base inicial refletia as posições apenas de setores econômicos e desconsiderava o que defendem a sociedade civil organizada, o Ministério Público, cientistas e especialistas dos órgãos ambientais. Também desconsiderava a experiência de mais de 40 anos do Brasil no tema. O novo texto corrige alguns pontos importantes. Temos evoluído nos entendimentos, mas ainda há muito a avançar para que se tenha equilíbrio. Uma lei desequilibrada será prejudicial a todas as partes, inclusive pela judicialização que o tema do licenciamento gera historicamente”, defende Mauricio Guetta, consultor jurídico do ISA.
Kataguiri já admitiu excluir do relatório do GT a dispensa de licenças ambientais para atividades agropecuárias e obras de ampliação e melhorias de projetos de infraestrutura, dois dos pontos mais polêmicos no debate. Ambientalistas, pesquisadores e Ministério Público apontam que a isenção de licenças para atividades agrícolas ou o asfaltamento de estradas, em especial da Amazônia, pode ampliar os índices de desmatamento na região. Esse tipo de isenção é uma das principais bandeiras ruralistas na discussão.
“Para dispensa [de licença] de ampliação [de obras de infraestrutura], acho que ficou descartado”, afirmou o deputado, em entrevista ao ISA, após uma das audiências na semana passada. Ele acrescentou que o próprio Ministério da Infraestrutura “não achou razoável” manter essa isenção como estava no relatório preliminar que está elaborando. O parlamentar admitiu que ainda tem dúvidas sobre o tratamento de que ser dado, nesse caso, a obras como o recapeamento de estradas. “Esta é a única hipótese que, para mim, ficou uma ponta solta ainda, em aberto, se a gente precisaria pedir um licenciamento simplificado ou não”, completou.
Seis audiências já ocorreram na Câmara, além de oitivas na Assembleia Legislativa do Mato Grosso, em Cuiabá, e em Campinas (SP). Participaram pesquisadores, procuradores, juízes, representantes de movimentos sociais, organizações da sociedade civil, indústria e produtores rurais, entre outros. Os eventos continuam na Câmara, entre esta terça e quinta (2 a 4/7) e na terça da semana que vem (9/7) (veja calendário).
Outra boa notícia é que Kataguiri confirmou que deverá defender, em seu relatório, que todas as Terras Indígenas (TIs) e territórios quilombolas sejam considerados nos processos de licenciamento. Propostas em tramitação no Legislativo preveem que apenas TIs homologadas e quilombos titulados, ou seja, nas últimas fases dos respectivos processos de formalização sejam considerados para efeito de identificação, prevenção e controle de impactos socioambientais. Assim, centenas desses territórios poderiam simplesmente ser ignorados para a concessão das licenças.
“Não vi nenhum óbice, pelo menos da representante da CNI [Confederação Nacional da Indústria] em relação a isso: você ampliar o âmbito para aqueles [territórios] que ainda estão em processo de reconhecimento. Acho que não teremos problemas em relação a isso”, disse o deputado, na audiência da quarta (26/06).
Ele afirmou ainda que, de acordo com seu relatório, órgãos como a Fundação Nacional do Índio (Funai) e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) deverão participar dos processos de licenciamento desde sua primeira etapa, ou seja, na elaboração do termo de referência.
O deputado não se comprometeu, no entanto, com a possibilidade dessas instituições terem poder de veto sobre as licenças, outro ponto defendido por ambientalistas, movimentos sociais e Ministério Público. Tampouco descartou retirar de seu parecer a previsão da Licença por Adesão e Compromisso (LAC), pela qual é possível conseguir a autorização do empreendimento automaticamente, via internet.
Kataguiri também não se comprometeu a excluir de seu relatório o dispositivo que atenua a possibilidade de responsabilização dos bancos por danos socioambientais causados por obras ou atividades por eles financiadas. O artigo 48 de seu texto afirma que as instituições financeiras “somente responderão por dano ambiental, se comprovado dolo ou culpa, bem como a relação de causalidade entre sua conduta e o dano causado”.
Maia assumiu o assunto como parte de sua agenda de desburocratização e estímulo à economia. Sua principal bandeira é a redução e fixação de prazos, para dar maior velocidade à concessão das licenças. Ele tende a pressionar pela aceleração da tramitação. O presidente da Câmara criou uma Comissão Especial (CE) sobre o tema, mas voltou atrás, optando pela alternativa do GT. A comissão permitiria mais tempo de debates.
Cientistas, ambientalistas e Ministério Público argumentam que o enfraquecimento das regras do licenciamento vai ampliar o desmatamento e o risco de desastres socioambientais, como os de Mariana e Brumadinho (MG), além de prejudicar a segurança jurídica das próprias atividades econômicas.
- Licença para agricultura, pecuária e silvicultura
- Licença para ampliação e melhoria de obras de infraestrutura
- Todas as Terras Indígenas e territórios quilombolas serão considerados