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Medida Provisória acaba com exigências ambientais para regularização fundiária

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Texto aprovado na Câmara e que segue para o Senado retira exigência de recuperação de áreas desmatadas
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O plenário da Câmara aprovou, na quarta (24/5), a Medida Provisória (MP) 759/2016, que prevê a regularização fundiária de áreas rurais e urbanas em todo país e também altera a legislação da reforma agrária (saiba mais).

A norma abre caminho para a legalização massiva de áreas griladas, o agravamento da concentração fundiária e dos conflitos de terra. Por causa disso, foi apelidada de “MP da grilagem”. Estima-se que, só na Amazônia, poderá disponibilizar à iniciativa privada, por valores bem abaixo do mercado, em torno de 40 milhões de hectares de terras públicas – o equivalente à duas vezes o território do Paraná.

A MP segue agora ao plenário do Senado. Ela perde validade no dia 1/6. Se for referendada até lá pelos senadores, segue à sanção presidencial.

O que passou despercebido para muitos é que a MP irá estimular o desmatamento não apenas pelo fato dele já estar associado à grilagem há décadas na Amazônia. A norma também retira exigências ambientais que existiam para a regularização fundiária.

A legislação anterior determinava que o posseiro poderia perder o título se a Área de Preservação Permanente (APP) ou a Reserva Legal fosse desmatada num prazo de dez anos. O texto original da MP, saído da mesa de Michel Temer, já flexibilizava essa restrição, ao permitir que o ocupante pudesse assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). O parecer da Comissão Mista que analisou a matéria, do senador Romero Jucá (PMDB-RR), simplesmente aboliu todas essas condicionantes ambientais. A proposta do parlamentar obriga apenas o Cadastramento Ambiental Rural (CAR) da posse. Na prática, a nova redação possibilita a transferência de terras públicas sem que o posseiro se comprometa a recuperar seu passivo ambiental.

Previsto pelo Código Florestal de 2012, o CAR pretende viabilizar a regularização ambiental por meio do registro das áreas desmatadas e das que devem ser reflorestadas numa propriedade. O cadastro é autodeclaratório, feito pela internet e, até agora, não tinha valor para fins de regularização fundiária. O problema é que os Programas de Regularização Ambiental (PRAs) - que devem ser implantados pelos governos estaduais e são o próximo passo fixado na lei para viabilizar a recuperação florestal - ainda não saíram do papel em grande parte do País. E muitos ruralistas lutam para mudar a legislação e conceder uma nova anistia às derrubadas irregulares antes que esses programas comecem a funcionar.

"A revogação dessas cláusulas de natureza ambiental é inconstitucional e deve ser questionada no Supremo Tribunal Federal (STF). A revogação exime o Poder Público da incumbência de preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais", alerta Juliana de Paula Batista, advogada do ISA. Ela explica ainda que outra consequência da transformação da MP 759 em lei será o aumento da pressão sobre as terras de comunidades indígenas e tradicionais ainda não definitivamente oficializadas.

A possível aprovação da MP 759 pelo Congresso acontece em meio a um novo salto da taxa de desmatamento na Amazônia. Entre 2013 e 2016, o desflorestamento aumentou 60% (veja aqui).

A MP é uma das moedas de troca oferecida por Michel Temer para conseguir o apoio da poderosa bancada ruralista diante da mais grave crise política de seu governo. Ela faz parte do pacote de projetos que os ruralistas pretendem aprovar no Congresso antes da possível queda de Temer, a exemplo das MPs 756 e 758, que reduzem Unidades de Conservação no Pará e em Santa Catarina (leia mais).

A MP 759 foi apreciada na Câmara numa votação rápida, sem a presença da oposição, que se retirara do plenário em protesto contra a repressão às manifestações pela saída de Temer da presidência, do lado de fora do Congresso.

Grilagem

Jucá acrescentou vários outros pontos que viabilizam a legalização da grilagem. A redação original da MP fixava um limite de até 1,5 mil hectares para a regularização de áreas rurais. O texto do senador permite oficializar a posse de terras públicas ou em disputa de até 2,5 mil hectares.

"Não há qualquer justificativa para a regularização de áreas de até 2.500 hectares com dispensa do processo de licitação. A medida atenta contra o princípio da impessoalidade e autoriza o poder público a repassar terras ao domínio particular a preço de banana", reforça Batista.

O relator aumentou também o público-alvo da regularização: ocupantes anteriores a julho de 2008 serão beneficiados e aqueles que pagarem o valor total da área ocupada até cinco anos antes da entrada em vigor da MP também poderão ser regularizados. Na prática, isso permitirá que toda e qualquer terra grilada até dezembro de 2011 se torne passível de regularização. Na Lei 11.952/2009, a data-limite era 1º de dezembro de 2004.

Oswaldo Braga de Souza
ISA
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