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Projeto de Lei Geral do Licenciamento fará desmatamento explodir, diz análise do ISA e UFMG

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Levantamento reforça que metas climáticas não seriam cumpridas pelo Brasil, se PL for aprovado no Senado. Risco de desastres, como os de Brumadinho e Mariana (MG), também aumentaria
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Se aprovado como está no Senado, o Projeto de Lei (PL) nº 2.159/2021, que cria uma Lei Geral do Licenciamento Ambiental, pode fazer o desmatamento na Amazônia, já fora de controle, explodir de vez, e jogar na lata do lixo as promessas que o Brasil fez no Acordo de Paris, o tratado internacional sobre a crise climática. Além disso, aumentaria o risco de novos desastres socioambientais, como o de Brumadinho e Mariana (MG).

A conclusão é de duas notas técnicas feitas pelo ISA e a UFMG que analisam os impactos do PL sobre o desmatamento decorrente de grandes obras, na região amazônica, e sobre empreendimentos de mineração e suas barragens de rejeitos, em Minas Gerais.

Na prática, o PL acaba com a maioria dos licenciamentos ambientais do país. Se aprovado, a maior parte dos empreendimentos e atividades econômicas precisaria apenas realizar um procedimento autodeclaratório na internet, sem nenhum tipo de análise prévia dos órgãos ambientais, e sua licença seria emitida automaticamente - a chamada Licença por Adesão e Compromisso (LAC). Vários dos controles e das condicionantes dos impactos socioambientais das obras seriam simplesmente abolidos, inclusive os de prevenção ao desmatamento.

A relatora do projeto, senadora Kátia Abreu (PP-TO), informou ao jornal Folha de São Paulo que a proposta pode ir à votação no plenário do Senado nesta semana, mas ressalvou que ainda está fechando sua redação final.

Conforme acordo estabelecido entre ela, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e outros parlamentares que acompanham o tema, seriam realizadas três audiências públicas sobre o PL nas comissões de Agricultura e Meio Ambiente. Depois disso, ele seria votado conjuntamente nos dois colegiados e, na sequência, no plenário. A última audiência ocorreu na sexta (19). Se a redação aprovada for diferente daquela chancelada, em maio, pela Câmara, o projeto será novamente analisado pelos deputados.

"PL da Boiada"

Por seus possíveis impactos socioambientais, o PL 2.159 já vem sendo chamado de "pai de todas as boiadas" ou "PL da Boiada". Trata-se de um referência à reunião ministerial de abril de 2020 em que o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse que o governo Bolsonaro deveria aproveitar que a atenção da imprensa estava sobre a pandemia de Covid-19 para "ir passando a boiada", ou seja, para aprovar medidas contra o meio ambiente.

Na última quinta (18), sem nenhum tipo de divulgação, o governo publicou a nota técnica do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) com a taxa oficial preliminar do desmatamento na Amazônia, entre agosto de 2020 e julho de 2021: foram destruídos 13,2 mil km² de florestas. Trata-se de um aumento de 22% em relação ao período anterior, o maior número desde 2006 e o terceiro recorde, acima de 10 mil km², sob o governo Bolsonaro. Como acontece normalmente, o número será revisto e consolidado no início do ano que vem.

O documento divulgado na semana passada está com a data de 27/10, portanto, quatro dias antes do início da 26ª Conferência das Partes (COP-26) das Nações Unidades sobre Mudanças Climáticas, realizada em Glasgow, na Escócia, onde o Brasil foi cobrado pela comunidade internacional sobre seus esforços para conter a destruição da floresta. A informação fez o Sindicato Nacional dos Servidores Públicos Federais na Área de Ciência e Tecnologia do Setor Aeroespacial, que representa os servidores do Inpe, acusar a administração federal de censurar os dados (saiba mais).

Impactos no desmatamento

De acordo com as análises do ISA e da UFMG, se for realizada sem as condicionantes ambientais previstas na legislação atual, uma única obra sozinha, a ferrovia “Ferrogrão”, entre Sinop (MT) e Miritituba (PA), pode provocar a destruição de 53 mil km² de florestas até 2030, uma área do tamanho do Rio Grande do Norte ou nove vezes o território do DF.

Já o asfaltamento da rodovia da BR-319, entre Manaus (AM) e Porto Velho (RO), pode fazer o desflorestamento apenas no Amazonas alcançar 9,4 mil km² anuais em 2050, mais de oito vezes a média registrada entre 2015 e 2020, de 1,1 mil km². O desmatamento acumulado no estado em 30 anos poderia chegar a 170 mil km², extensão próxima à do território do Paraná.

A estrada facilitaria o acesso a uma das regiões mais preservadas e de maior biodiversidade da Amazônia, com muitas espécies endêmicas, que só ocorrem localmente, e fragmentaria definitivamente a maior floresta tropical do mundo no sentido sudoeste-nordeste. Cerca de 95% do desmatamento e 85% das queimadas na Amazônia concentram-se em uma distância de até 5 km de estradas, informa o levantamento do ISA e da UFMG.

“Com o asfaltamento e sem medidas de controle do desmatamento, as emissões acumuladas de carbono também mais que quadruplicariam em relação ao cenário previsto sem a pavimentação, alcançando 8 bilhões de toneladas – equivalente à emissão de 22 anos de desmatamento na Amazônia Legal com base na taxa de 2019”, diz a análise.

“Ao tornar o licenciamento ambiental exceção e inviabilizar a adoção de condicionantes ambientais para prevenir a supressão ilegal de vegetação, o projeto de lei resultará no aumento do desmatamento da Amazônia Legal em níveis que impedirão o Brasil de cumprir suas metas assumidas no Acordo de Paris”, reforça o documento.

Conforme o texto atual do PL 2.159, obras de melhoramento e manutenção em "infraestruturas pré-existentes”, como o asfaltamento de estradas, seriam dispensadas do licenciamento. Outros 12 tipos de atividades e empreendimentos, inclusive agricultura e pecuária, teriam o mesmo tratamento.

Além disso, o artigo 13 do projeto exclui a previsão de condicionantes ambientais sobre impactos causados por terceiros e sobre os quais o poder público detenha o poder de fiscalização.

“Como o combate ao desmatamento e demais atividades ilegais na Amazônia consistem em competência – e dever constitucional – inserida no âmbito do poder de polícia estatal, além de ser atividade realizada por ‘terceiros’, decorre que não mais poderão ser objeto de condicionantes ambientais quaisquer medidas para conter o desmatamento decorrente da instalação de empreendimentos de impacto, como estradas, ferrovias, hidrelétricas e outros”, afirma a nota técnica.

Mineração

Apenas as atividades econômicas e os empreendimentos classificados como de “significativo potencial degradador”, que são a imensa minoria, seriam obrigados a se submeter a uma avaliação prévia de órgão ambiental, conforme os trâmites em vigor hoje, se o PL 2.159 for aprovado como está.

Dessa forma, 85,6% dos projetos de atividades minerárias e suas barragens em Minas Gerais passariam a obter licença automática, de acordo com a segunda nota técnica, produzida pelo ISA. “[O projeto de lei] ampliará sobremaneira os riscos de proliferação de novos desastres socioambientais, como as tragédias ocorridas em Mariana (MG) e Brumadinho (MG)”, aponta o documento.

Em dezembro de 2018, a Câmara de Atividades Minerárias do Conselho Estadual de Política Ambiental de Minas Gerais (Copam) reduziu a classificação de alto para médio potencial de impacto ambiental de todo o complexo de mineração Paraopeba, da Vale, inclusive o reservatório de rejeitos da mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG).

Realizada com base em uma mudança da legislação estadual efetivada pouco antes, a medida permitiu a simplificação do licenciamento do empreendimento - que tinha três fases e passou a ter apenas uma - e é apontada como uma das razões do rompimento da barragem, que matou 270 pessoas, destruiu comunidades e rios inteiros, em janeiro de 2019 (saiba mais).

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