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Pela 1ª vez, livro escrito e ilustrado por quilombolas inspira atividades em escolas do Vale do Ribeira (SP)

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‘Roça é Vida’ apresenta com força e poesia o trabalho coletivo do Sistema Agrícola Tradicional Quilombola, patrimônio imaterial do Brasil
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Escrito e ilustrado por quilombolas e aquilombados do Vale do Ribeira, no sudoeste de São Paulo, o livro ‘Roça é Vida’ inspirou atividades escolares de alunos do ensino fundamental e médio em Eldorado (SP).


Clique aqui para baixar o livro!

É a primeira vez que um livro concebido e publicado por quilombolas da região é utilizado como recurso didático nas escolas locais, resultado de uma aliança que uniu diretoria de ensino, coordenação pedagógica, professoras, professores, alunos e famílias quilombolas.

Adoção do livro atende legislação

A sequência didática elaborada pelos professores quilombolas atende a Resolução CNE/CEB nº 8, de 20 de novembro de 2012, que define Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Quilombola na Educação Básica. E também atende a lei 10.639/2003, que obriga o ensino em escolas públicas e particulares da história e cultura afro-brasileira e africana.

As atividades foram desenvolvidas a partir das habilidades essenciais previstas no Currículo Paulista, da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, e na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), do Ministério da Educação.

‘Roça é Vida’ tem como tema principal a importância do Sistema Agrícola Tradicional Quilombola, reconhecido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) como patrimônio imaterial do Brasil.

Em 48 páginas, a narrativa é guiada por personagens como a Tradição, a Fartura, a Experiência, o Êxodo, a Continuação, o Território, a Luta, a Resistência e a Esperança - elementos presentes no dia a dia das comunidades quilombolas do Vale do Ribeira.

Luiz Marcos de França Dias, professor e um dos autores do livro, contribuiu para a elaboração da primeira sequência didática (clique para baixar), ou conjunto de atividades sobre a obra, para os alunos do ensino fundamental e médio da Escola Estadual Maria Antonia Chules Princesa.

A escola atende sete comunidades quilombolas: Nhunguara, São Pedro, Galvão, Ivaporunduva, André Lopes, Sapatu e Ostra. As atividades foram oferecidas aos alunos em fevereiro como principal proposta didática do primeiro bimestre. Eles levaram o material impresso para casa, e trabalharam os temas em família.

Segundo Carina Gonçalves Jacob Rodrigues, coordenadora pedagógica da escola, mais de 90% dos 169 alunos da escola fizeram as atividades.

“A família tem muitos saberes a serem compartilhados e precisam ser valorizados. É todo o conhecimento de uma comunidade, da história de uma sociedade”, afirmou Rodrigues. “Às vezes, os pais se veem em uma situação de não conseguir ajudar os filhos. Mas, ao contar como funciona o Sistema Agrícola Quilombola, transmitiram os saberes de várias gerações.”

Para o livro ir mais longe

Inspirados pela ação, professoras da rede municipal de Eldorado decidiram elaborar mais duas sequências didáticas (clique para baixar) com atividades a serem realizadas pelos alunos do ensino fundamental, tanto na primeira etapa de alfabetização, do primeiro ao terceiro ano, quanto alunos do quarto e quinto anos.

“A devolutiva das crianças é uma boniteza”, afirmou Viviane Marinho Luiz, uma das autoras do livro e professora da rede municipal de Eldorado. “Teve criança desenhando a roça de coivara, teve criança desenhando o aceiro. Isso mostra o pertencimento delas com as personagens do livro, com o contexto histórico e geográfico do livro.”


Segundo Luiz, os alunos ainda apresentaram um resultado acima da média em atividades de leitura e escrita. Para isso, a participação das famílias foi essencial.

“Ouvi alguns pais falando ‘que bacana nossa história estar no livro e eles estarem estudando sobre nós’. É valorização do território, do trabalho e pensando a soberania alimentar”, afirmou Márcia Cristina Américo, também autora e professora quilombola da rede municipal (clique para baixar a sequência didática que ela ajudou a elaborar).

Segundo a coordenadora pedagógica das escolas quilombolas da rede municipal de Eldorado, Aline Augusta da Silva Andrade, o livro deve ser usado na formação de novos professores.

“A ideia é fazer uma apresentação do material para os professores de forma aprofundada, para que eles realmente saibam o que é o ‘Roça é Vida’”, afirmou. “Estamos bastante animados em dar continuidade a esse trabalho.”

Outro objetivo é expandir o uso do livro para as escolas urbanas do município. “Queremos mostrar quanta riqueza tem a cultura quilombola, queremos levar esse conhecimento para outras crianças”, afirmou Andrade.

Ensino e pandemia nos quilombos

As atividades sobre livro vieram em momento crítico nas escolas das comunidades quilombolas do município de Eldorado. O ensino remoto é inviável, o que desestimulou alunos.

“Não há sinal de celular em nenhuma das comunidades e a internet rural particular é muito cara, de péssima qualidade e não disponível a todas as famílias", afirmou Luiz Marcos de França Dias. “Criamos a sequência didática exatamente para manter o vínculo entre os alunos e a escola.”




O livro ‘Roça é Vida’ já estava na casa das famílias - 1.100 exemplares foram distribuídos no ano passado. Imprimir e entregar a sequência didática aos alunos foi a saída encontrada para manter este elo.

“O ato de ofertar a possibilidade é muito mágico. A gente tem o território, o material e o dispositivo legal que nos ampara”, disse Dias. “Você poder elaborar o exercício e atividade para o aluno executar dentro desse contexto é muito positivo.”

As roças dos quilombolas do Vale do Ribeira ajudam a manter a Mata Atlântica conservada (assista aqui ao documentário). Não por acaso, a região abriga o maior trecho desse tipo de floresta em todo o país.

O livro ‘Roça é Vida’ é uma ação de salvaguarda do Sistema Agrícola Tradicional Quilombola, registrado pelo Iphan em 2018. Ou seja, a publicação tem como objetivo manter o sistema vivo.

Ficha técnica:
Roça é Vida
Autores: Viviane Marinho Luiz, Laudessandro Marinho da Silva, Márcia Cristina Américo, Luiz Marcos de França Dias, Amanda Nainá e Vanderlei Ribeiro.
Ano: 2020
Páginas: 48
Realização: Grupo de Trabalho da Roça, Instituto Socioambiental e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)
Apoio: União Europeia

Assista à live de lançamento do livro, realizada em agosto de 2020.

Roberto Almeida
ISA
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